«À escola pública exige-se que seja democrática, pois é nessa cultura que se desenvolve a inclusão»

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados

A educação é um direito. Direito que não pode ser desligado da democracia nas suas múltiplas vertentes e dos avanços constitucionalmente consagrados que decorreram da Revolução de Abril, designadamente, o reconhecimento do direito à participação democrática na gestão das escolas.

Princípio que se encontra desenvolvido na Lei de Bases do Sistema Educativo que determina que em cada estabelecimento ou grupo de estabelecimentos de educação e ensino, a direcção e gestão se orientam por princípios de democraticidade e de participação de todos os implicados no processo educativo; que na direcção e gestão dos estabelecimentos de educação e ensino devem prevalecer critérios de natureza pedagógica e científica sobre critérios de natureza administrativa; e que a direcção de cada estabelecimento ou grupo de estabelecimentos do básico e secundário é assegurada por órgãos próprios, para os quais são democraticamente eleitos os representantes de professores, alunos e pessoal não docente.

A verdade é que desde 1991 as opções políticas de sucessivos governos muito se têm afastado desta perspectiva, traduzindo ataques aos princípios da colegialidade e da eleição dos órgãos de gestão dos estabelecimentos de ensino e da sua autonomia, em completo desrespeito pela Lei de Bases do Sistema Educativo.

Os partidos que têm defendido o actual modelo de gestão, argumentam sobretudo em torno de propaladas e supostas vantagens como o reforço da autonomia das escolas ou a criação de lideranças fortes. Nada mais falso!

Como é que a existência de um Director, cargo unipessoal não eleito colegialmente, no qual recai toda a responsabilidade da direcção da escola, controlado directamente pelo Ministério, promovendo a governamentalização das escolas reforça a autonomia?

Como podem sequer alegar a existência de lideranças fortes sem a existência de um verdadeiro governo democrático das escolas? Lideranças fortes alimentadas à força do esvaziamento da participação e da gestão democrática tendem sobretudo a constituir-se como lideranças autoritárias. E isso tem-se comprovado no dia-a-dia das escolas.

O que é facto, Senhoras e Senhores Deputados, é que a iniciativa que PSD aqui nos traz hoje apenas é para afinar a gestão NÃO democrática das escolas. É um projecto que não ataca o essencial que é, precisamente, o afastamento da comunidade escolar dos níveis de decisão e o fim da promoção da desconfiança para com a comunidade escolar no governo das escolas. Não permite a eleição em votação universal do órgão de gestão. Não permite sequer a eleição de coordenadores de departamento ou estabelecimento, que são, num caso, escolhidos de um grupo de três indicados pelo director e, no segundo caso, são nomeados. Hierarquiza valorativamente a participação de alguns corpos da comunidade escolar em detrimento de outros. Só que a escola deve ser um local de conjugação de esforços e não um palco de conflitos, que estas opções promovem.

Não, não é com cosmética que as coisas se resolvem, mas antes com um novo regime de gestão para as escolas, assente nos princípios da elegibilidade, e da colegialidade e que favoreça a participação de todos nos níveis adequados de intervenção. Se a escola é um espaço de aprendizagem, é também um espaço de participação cívica e democrática.

Há muito que o PCP defende a aprovação de uma lei de gestão democrática dos estabelecimentos escolares que respeite os princípios, objectivos e valores consagrados na Constituição e na Lei de Bases do Sistema Educativo. Apresentámos o nosso próprio Projecto de Lei sobre direcção e gestão democrática em Dezembro, promovendo desde então um amplo debate e auscultação sobre a nossa proposta. Contamos já com a opinião e sensibilidade de muitos: professores, trabalhadores não docentes, pais e até directores de escolas, que têm manifestado a importância de intervenção nesta matéria.

O nosso Projecto de Lei contém algumas opções fundamentais e traços distintivos que destacamos:
- Prevê a eleição de todos os membros dos órgãos de direcção e gestão das escolas.
- Concilia a necessária intervenção da comunidade, designadamente pais e autarquias, com a indispensável autonomia da escola.
- Respeita a importância da participação dos estudantes e dos pais na vida da escola, prevendo-a num órgão de direcção estratégica e criando mecanismos para a auscultação permanente das suas opiniões.
- Reforça a importância do conselho pedagógico, tornando-o um órgão com poderes decisórios, atribuindo-lhe verdadeiramente a direcção pedagógica e educativa.
- Assegura a necessária separação e complementaridade entre a direcção e a gestão.
- Dando cumprimento à Lei de Bases do Sistema Educativo, cria novos meios de participação na definição da política educativa a nível regional através de conselhos regionais de educação.
- Institui formas de compensação para os detentores dos principais cargos em órgãos de direcção e gestão democráticas e em estruturas de orientação educativa.

Trata-se acima de tudo de um projecto de lei que visa valorizar a escola pública, promover o sucesso escolar e tornar os órgãos de direcção e gestão verdadeiros elementos de modernização pedagógica e de autonomia da escola para a realização de um projecto educativo próprio.

Termino, Senhoras e Senhores Deputados, deixando uma pergunta: à escola pública exige-se que seja democrática, pois é nessa cultura que se desenvolve a inclusão. Como pode uma escola que não é democrática na sua organização e no funcionamento educar para a democracia?

Disse.

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