Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

"Devolver a esperança aos portugueses, é isso que o governo tem de concretizar"

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Debate quinzenal com o Primeiro-Ministro (António Costa), que respondeu às perguntas formuladas pelos Deputados

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Antes de mais, permita-me que exprima a nossa indignação em relação às inqualificáveis pressões e chantagens sobre o País e sobre as instituições que, legitimamente, representam os interesses dos portugueses e a que temos vindo a assistir também a pretexto da elaboração do Orçamento, por parte da União Europeia.
A vida tem dado razão ao PCP quanto à natureza da União Europeia e das suas instituições e à necessidade de romper com as suas imposições e com os constrangimentos externos que o País enfrenta. Sem rutura com essas imposições da União Europeia e sem enfrentar os constrangimentos externos resultantes da dívida pública ou da submissão ao euro, não é possível dar resposta aos graves problemas estruturais que enfrentamos no plano económico e social.
Mas o que é mais indigno em todo este processo é a atitude do PSD e do CDS, que acompanham a chantagem e as pressões e delas fazem eco, quando não são eles próprios a exigirem a inflexibilidade de Bruxelas contra os interesses do nosso País e do nosso povo.
Aplausos do PCP e do Deputado do BE José Manuel Pureza.
Não o fazem por sadismo, mas porque têm um objetivo: impedir qualquer sinal de inversão das políticas de exploração e de empobrecimento que protagonizaram nestes últimos quatro anos e inviabilizar todas e quaisquer medidas positivas para os trabalhadores e para as populações, independentemente do seu alcance.
Tinham assentido e acordado que os cortes de salários e o aumento dos impostos que promoveram não eram temporários, mas definitivos, e por isso reagem como reagem.
Não se conformam que possam ser concretizadas, no Orçamento, medidas de inteira justiça, como a reposição dos salários da Administração Pública, a redução e eliminação da sobretaxa do IRS, a reposição dos complementos de reforma dos trabalhadores do SEE (setor empresarial do Estado), o aumento ou a majoração das prestações sociais do abono de família, do rendimento social de inserção, do complemento solidário para idosos ou do subsidio para assistência a terceira pessoa.
Não se conformam que o Orçamento para 2016 contemple medidas de combate à precariedade laboral no setor público, de introdução da cláusula de salvaguarda do IMI, da contratação de médicos de família ou de alterações de sentido positivo relativamente às taxas moderadoras. Não se conformam com o fim da isenção de fundos imobiliários em sede do IMI, com o aumento da contribuição do setor bancário ou com medidas para uma mais justa tributação dos lucros, nomeadamente com alguma limitação de isenções fiscais.
Nestes quatro anos fizeram o mal e agora querem fazer a caramunha, colocando-se do lado da União Europeia contra o País e o povo, dando ares de quem diz o contrário
Queriam cortes definitivos nos salários. Queriam-nos particularmente nas reformas acima de 1000 €, mas agora falam em nome da classe média, seja lá o que isso for, colocando-se na pele de defensores daqueles a quem esbulharam salários, rendimentos, direitos e dignidade das condições de vida.
Por muito que o PSD e o CDS estiquem a sua demagogia, nós não deixaremos que sejam esquecidos os planos que tinham para perpetuar a exploração e o empobrecimento dos portugueses e não deixaremos de nos bater por todas as medidas que possam contribuir para a inversão dessa política.
Estamos perante um Orçamento de Estado com medidas limitadas, a saber a pouco, mas, mais e para além da devolução de salários, rendimentos e direitos, este Governo assume uma responsabilidade maior: estamos a devolver a esperança aos portugueses. É isso que este Governo tem de tentar defender e concretizar.
(…)
Sr. Presidente.
Sr. Primeiro-Ministro,
Naturalmente faremos uma maior e mais precisa avaliação do conteúdo global da proposta de lei de Orçamento do Estado, mas, neste quadro, gostaria de colocar uma outra questão concreta.
Nós já identificámos um conjunto de medidas positivas, que estão contidas na proposta de lei de Orçamento do Estado, mas também não deixámos de sinalizar insuficiências e limitações que nos preocupam, particularmente a questão do aumento dos impostos sobre os combustíveis, que tem sido muito referida e criticada de forma generalizada.
Entretanto, Sr. Primeiro-Ministro, a Galp fez esta semana a divulgação pública dos seus resultados financeiros, tendo revelado um lucro líquido de 639 milhões de euros, aumentando 71,5% os 373 milhões de euros alcançados no período homólogo em 2014.
Sr. Ministro, não seria mais adequado, em vez de aumentar o esforço sobre os consumidores e sobre as pequenas e médias empresas que referiu, confrontar diretamente a Galp, a Repsol, a BP e outras grandes empresas, tributando de forma adequada o seu lucro e a sua atividade? Não seria esta uma solução mais amiga do desenvolvimento e do crescimento económico? Não seria mais adequado encontrar uma solução para a fixação do preço dos combustíveis que aproveitasse a baixa do preço do petróleo a favor da nossa economia, dos nossos setores produtivos e do desenvolvimento do nosso País?
Com a tolerância do Sr. Presidente, coloco-lhe, Sr. Ministro, uma última questão, que tem a ver com o seguinte: o senhor já foi, com certeza, informado de que a Junta da Galiza está a fiscalizar todo o leite português que atravessa a fronteira com destino a fábricas, em Espanha, propriedade da Agros. Já foram feitas 95 fiscalizações em janeiro, tantas como em todo o ano de 2015, servindo esta operação de base à atribuição de um selo que diz «Produzido em Espanha» e que é, efetivamente, uma barreira ao leite português.
O Sr. Primeiro-Ministro sabe, com certeza, que, a não serem tomadas medidas como as que foram tomadas em Espanha e outras, a produção de leite nacional vai desaparecer. Não é possível produzir leite a preços pagos aos nossos agricultores.
O leite de França, de Espanha, da Polónia, da Alemanha, da Holanda continua a encharcar o mercado nacional e a afogar os nossos produtores e, assim, acabará a produção de um dos únicos bens agroalimentares estratégicos, em que o País é autossuficiente, vítima de políticas de governos anteriores, em particular do último, do PSD e do CDS. Vai deixar que isto aconteça, Sr. Primeiro-Ministro?

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