Intervenção de Inês Zuber, Deputada ao Parlamento Europeu e membro do Comité Central, Sessão «A situação em Portugal e na Europa pós-eleições para o Parlamento Europeu. A luta em defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do País»

Os deputados do PCP no PE assumem o combate as desigualdades sociais, a luta pelos serviços públicos, pelo trabalho digno e com direitos, pela protecção social

Não se cansam os representantes das instituições europeias de proclamar, no plano discursivo, os altos valores da UE. "Todos os trabalhadores têm direito a condições de trabalho saudáveis, seguras e dignas","todas as pessoas têm direito à educação", o "reconhecimento do direito a uma assistência social e a uma ajuda à habitação destinadas a assegurar uma existência condigna a todos aqueles que não disponham de recursos suficientes" ... são alguns dos exemplos dos princípios plasmados na Carta dos Direitos Fundamentais da UE. São, curiosamente, princípios evocados pela mesma UE e seus responsáveis que condenaram tantos países da UE à destruição de centenas de milhares de empregos, ao aumento da precariedade no emprego, a mais desemprego, a reduções nos salários e pensões, a um enorme aumento de impostos sobre os trabalhadores, reformados e suas famílias, aos cortes nas prestações sociais, na saúde e na educação.

Sem ser muito extensa permitam-me relembrar alguns dados.

Portugal é hoje o exemplo do retrocesso social e da desumanização impostas pelas directrizes da UE e dos seus governos seguidistas que, escondendo-se por detrás de expressões de intenções, impõem diariamente o retrocesso social, negando o direito a uma vida digna. Portugal tem hoje 876 mil desempregados em sentido restrito, mais de 1 milhão e quatrocentos mil em sentido lato. Perto de 3 milhões de portugueses encontram-se na pobreza, centenas de milhares de portugueses são forçados a emigrar. Em Portugal, o retrocesso social mede-se pelo regresso aos níveis de vida do passado - o rendimento disponível das famílias recuou para o nível observado em meados da década passada, o nível de consumo recuou para o nível observado no início da última década.

Em 2012, o risco de pobreza atingiu o valor mais elevado desde 2005.

De acordo com o INE, a taxa de risco de pobreza em 2013, tendo por base os rendimentos de 2012 foi de 18,7%, quando no ano anterior tinha sido de 17,9%. Com esta percentagem de risco de pobreza cerca de 2 milhões de portugueses eram pobres em 2012. O Inquérito às Condições de Vida e Rendimento realizado pelo INE com dados de 2012 revela que 40,2% dos desempregados são pobres; que 10,5% das pessoas empregadas são pobres; que a taxa de pobreza nos casais com dois adultos e três ou mais crianças é de 40,4%; que a taxa de pobreza antes de qualquer transferência social é de 46,9%; que a taxa de risco de pobreza ou exclusão social é hoje de 27,4%.

24,2% da população da população da UE encontrava-se em 2012 em risco de pobreza e de exclusão, sendo que o risco de pobreza para as mulheres era de 26%, contra 23,9% para os homens. As mulheres enfrentam um risco de pobreza mais importante do que os homens-, em média, 3 em cada 10 agregados familiares da UE são unipessoais, na sua maioria mulheres que vivem sós, em especial idosas, sendo que esse grupo está a crescer e a ser alvo dos cortes nas pensões e pensões de viuvez. As mulheres são, assim, afectadas são afectadas directamente - através da perda do seu emprego, de cortes salariais, das pensões e pensões de sobrevivência ou da perda de segurança do emprego - e, indirectamente, através de cortes orçamentais nos serviços públicos e nas ajudas sociais, pois sabemos que muitas têm crianças a seu cargo.

Hipocritamente, é esta a UE que se considera a si mesmo como um exemplo para todo o mundo do exercício dos mais altos valores da democracia e da justiça social. Mas esta e não só uma UE que promove as desigualdades dentro dos países, como a desigualdade entre os países - o SMN português representa apenas 37,7% do valor do SMN na Bélgica ou 30,2% dos valor do SMN no Luxemburgo. Em Portugal, entre 2011 e 2014, o corte total real no ensino básico e secundário foi de 25,7% e no Ensino Superior foi de 16,1%. Mais chocantes são estes dados se soubermos que, já em 2010, a media de gastos da UE era mais 40% no ensino básico e mais 22% no ensino superior do que o investimento feito em Portugal.

Se, como sabemos, os cortes no sistema publico de saúde têm levado ao colapso das respostas medicas, é ainda mais chocante se tivermos em conta que já em 2010, os países da UE, despendiam em saúde, 168% do valor destinado, em Portugal, ao sistema de saúde. Tal como despendiam, em pensões e prestações sociais 169% do valor gasto em Portugal.

Os deputados do PCP no PE assumem o combate às desigualdades sociais, a luta pelos serviços públicos, pelo trabalho digno e com direitos, pela protecção social, como prioridades inquestionáveis na luta pela defesa destes princípios em Portugal e em vários países da UE.

Defenderemos o combate efectivo ao desemprego; a criação e promoção de emprego com direitos, com uma política de primeiro emprego dirigida aos jovens, assente no desenvolvimento da actividade económica, na dinamização do emprego público, na erradicação da precariedade e na redução do horário de trabalho, sem diminuição de salário. Estaremos atentos e vigilantes em relação às formas que tomará a implementação da Garantia Europeia de Juventude, para que não seja simplesmente mais um programa de estágios ou ocupacional que apenas ofereça exploração e ausência de segurança aos jovens trabalhadores. Insistiremos, como ainda esta semana fizemos mediante a apresentação de uma proposta de alteração ao Orçamento da UE para 2015, em aumentar os valores destinados a este programa, tal como preconizado pela OIT.

Defenderemos a convergência no progresso das normas e das legislações laborais e sociais, com a institucionalização do princípio de não-regressão, revertendo o nivelamento por baixo das condições de vida e de trabalho na Europa, actualmente em curso, mobilizando forcas sociais e políticas em torno da defesa deste princípio, aplicado aos vários mecanismos de protecção laboral, do qual é exemplo a contratação colectiva, hoje tão atacada pelo governo PSD-CDS.

Defenderemos a valorização dos salários, nomeadamente dos salários mínimos nacionais, e da protecção social, dos subsídios de desemprego, reformas e pensões, lutando contra as linhas politicas consubstanciadas, por exemplo, nas recomendações do Semestre Europeu, que advogam a flexibilização dos salários e a possibilidade de derrogação dos contratos colectivos de trabalho.

Defenderemos o fim das políticas de intensificação da exploração, de desvalorização dos salários, pensões e reformas, de liberalização das relações laborais, de precariedade, de desregulamentação e aumento do horário de trabalho, de aumento da idade da reforma, de privatização da protecção social, promovidas pela UE.

Defenderemos a rejeição dos acórdãos do Tribunal de Justiça Europeu que põem em causa as legislações laborais nacionais e os contractos colectivos, procurando aplicar o denominado "princípio do país de origem", isto é, a aplicação da legislação laborai do país de origem da empresa, em vez da legislação laborai do país onde o trabalhador trabalha.

Apoiaremos a adopção de medidas de combate à pobreza e à exclusão social, incluindo a instituição de um rendimento mínimo, compromisso já assumido pela Comissão Europeia e nunca posto em prática. Como ainda esta semana fizemos, defenderemos o aumento substancial do Programa de Ajuda aos Mais Carenciados, que Comissão Europeia e Parlamento Europeu acordaram em não aumentar face ao quadro comunitário anterior.

Apoiaremos o direito de controlo por parte dos trabalhadores e suas estruturas e organizações representativas sobre a utilização dos fundos da UE e sobre a gestão dos grandes grupos económicos, nomeadamente das multinacionais.

Lutaremos pela salvaguarda da possibilidade de intervenção do Estado em situações de grave situação social e económica devido a dificuldades ou encerramento de empresas, ou a calamidades, promovendo medidas concretas de apoio aos trabalhadores e à recuperação económica dos sectores e regiões atingidos. Esta possibilidade de intervenção deve prevalecer face às regras da dita livre concorrência - é em nome deste princípio que encerram grandes empresas, inclusive empresas estratégicas como os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, com a inoperância dos apoios estatais.

Rejeitaremos as normas e políticas que firam o direito e o dever dos Estados de promoverem o desenvolvimento socioeconómico, intervindo decididamente em defesa e pela promoção dos sectores produtivos nacionais e do emprego com direitos. Para nós, políticas e medidas como o Semestre Europeu, o Tratado Orçamental e os programas da troika, são para revogar.

Defenderemos a salvaguarda, reforço e diversificação dos serviços públicos, o fim da sujeição ao mercado das áreas nas quais os Estados devem exercer as suas funções sociais, com a existência de um conjunto de serviços públicos universais, modernos e eficientes de saúde, educação, segurança social, transportes, telecomunicações, energia, correios, abastecimento e saneamento de água, tratamento de resíduos, entre outros. O aprofundamento do mercado único no quadro dos serviços, a liberalização deste sector, o acordo comercial que está a ser negociado entre EUA e UE, irão levar ao encerramento dos serviços que hoje são de todos e à abertura de serviços que serão apenas de alguns.

Lutaremos pelo respeito pelos direitos dos migrantes e dos refugiados, particularmente o direito ao trabalho e o direito de voto aos residentes estrangeiros, o direito de acesso à educação, aos serviços de saúde e à protecção social.Rejeitaremos a Europa fortaleza de cariz securitária, repressiva e exploradora, que expulsa os imigrantes quando o mercado não os necessita e os recruta quando necessita de os explorar.

Defenderemos a igualdade de direitos entre homens e mulheres, nomeadamente nos direitos laborais, salários e direitos sociais.

São estas algumas das prioridade que, no domínio social, os deputados do PCP no PE assumem neste mandato que agora se inicia, de forma comprometida. Prioridades que serão sempre concretizadas em estreita ligação com a realidade portuguesa e com a luta dos jovens, mulheres, trabalhadores, reformados, pensionistas. Porque como a realidade demonstra - e ao contrário do que afirmam os apologéticos da UE, que vão desde partidos como o BE ao CDS-PP - não é através de mais integração que se resolvem os problemas sociais nos países da UE. É sim com mais conquista e resistência à retirada de direitos sociais em cada um dos países, que se contribui para a construção de uma Europa mais justa e solidária.

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