Intervenção de

Declaração Política sobre a política seguida pelo Governo contra os interesses nacionais<br />Interven??o de Octávio Teixeira

Senhor Presidente Senhoras e senhores Deputados Há menos de uma semana atrás, em artigo de opinião num diário lisboeta, significativamente intitulado "Portugal ainda existe", um "ex-recente" deputado do PS expressamente afirmava em ar compungido, a propósito, em geral, das privatizações em benefício de grupos estrangeiros, e em particular das ligações entre a EDP e a Iberdrola: "esses erros são (...) imputáveis a um certo bloco conservador e não tanto ao PS, enquanto partido político de esquerda. Para melhor compreender os erros, recordemos que no passado recente o tema era a superioridade, quase biológica, das empresas privadas relativamente às empresas públicas, agora é a incapacidade de sobrevivência das empresas privadas portuguesas relativamente às suas congéneres de outros países, pelo meio ficam os incentivos do Estado ao investimento fora de Portugal e a continuada deterioração da disciplina democrática do Estado e da sociedade. Ou seja, factores de contradição, indecisão e enfraquecimento de uma cultura de competição, de rigor e de exigência nacionais, sem esquecer a imperdoável e perigosa manipulação da opinião pública, que não pode passar sem protesto". Desta longa transcrição, discordo totalmente da parte em que se pretende fazer uma diferenciação entre um alegado "PS/partido de esquerda" e um efectivo "Governo do PS/bloco conservador". Porque a orientação e as práticas políticas do Governo do PS e do eng. Guterres são, indeclinavelmente, as orientações e práticas políticas aceites e apoiadas pelo PS e pelo Grupo Parlamentar do PS. Não há um PS no Governo e outro PS, alegadamente de esquerda, fora do Governo. Essa táctica, a táctica de pretender iludir a opinião pública de que o PS é, simultaneamente, Governo e oposição de esquerda ao Governo, é uma habilidade, para além do mais de cariz antidemocrático. Em tudo o resto da transcrição que fiz, não teria rebuço em a subscrever ... embora considere que um simples protesto é excessivamente condescendente. De facto, e em particular desde que chegou ao Governo, o PS tem sido um obcecado apologista e concretizador da privatização de empresas e de serviços públicos, orientado basicamente pela obstinação da privatização pela privatização. Como ao longo destes mais de quatro anos o PCP o tem denunciado. E hoje reafirmo o que muitas vezes temos dito: no âmbito das privatizações, os Governos do PS têm-se mostrado, no discurso e na prática, muito mais fundamentalistas que os próprios Governos do PSD que os antecederam. No anterior Governo do PS, o então Ministro das Finanças gabava-se, a torto e a direito (mas sempre pela direita) da supremacia da eficácia governativa socialista, mostrando aos que dele duvidavam que, em apenas quatro anos, o Governo do PS obteve de receitas de privatizações muitas mais centenas de milhões de contos do que o obtido pelos Governos do PSD ao longo de dez anos. Agora, o Ministro das Finanças do actual Governo do PS, afirma que "o programa de privatizações será acelerado (ainda mais? perguntamos nós) e deixará a preocupação de maximizar o encaixe financeiro". Isto é, a orientação básica dos Governos do PS permanece: acelerar o processo de privatizações. A desculpa, o pretexto para "vender" essa orientação política prioritária é que pode variar. Agora, abandonado que foi o pretexto do encaixe financeiro e considerando o que se está a passar, a razão sobejante do Governo do PS apenas pode ser uma: a vontade política de entregar empresas nacionais estratégicas a empresas estrangeiras. E aí temos, demonstrativamente, os casos recentes da jura cega do Ministro do Equipamento de entregar a TAP à Swissair e a operação racionalmente inexplicável do Ministro da Economia de oferta da GALP ( o que significa PETROGAL, TRANSGÁS E GÁS DE PORTUGAL) à ENI italiana, sem esquecer o caminho já aberto para a futura entrega da EDP à IBERDROLA espanhola e a consumada entrega do BTA e do Crédito Predial Português ao não menos espanhol Banco Santander. Os casos da TAP e da GALP são paradigmáticos da enorme obscuridade que rodeia decisões do Governo profundamente gravosas para o interesse nacional. Até hoje, os Governos do PS foram incapazes de apresentar uma explicação e sustentação racional para a sua obscura teimosia em querer impôr, contra tudo e contra todos, a chamada parceria com a Swissair. Na anterior legislatura, o então Ministro da tutela veio a esta Assembleia jurar a pés juntos que era a melhor, a única via, para "salvar" a TAP, sem nunca o ter conseguido demonstrar. Mudou o Ministro da tutela, mudou o Conselho de Gestão, e a teimosia mantém-se. O novo Ministro continua a não conseguir demonstrar a bondade da opção. Mas a situação agravou-se. É que agora existem estudos da própria empresa, subscritos pelo próprio Conselho de Gestão que dizem que o acordo com a Swissar é mau, é ruinoso para a TAP. São esses estudos que afirmam, por exemplo, que "existem razões estratégicas e económicas para que a TAP opte pela sua associação à Aliança AirFrance - Delta" porque, entre outras razões de relevante importância para a manutenção da autonomia da TAP, proporcionaria uma "vantagem económica de cerca de 7 milhões de contos/ano" face à aliança com a Swissair. Na passada semana, nesta Assembleia, o Ministro tentou iludir os Deputados e a opinião pública declarando a existência de estudos posteriores alegadamente dizendo o contrário. A verdade é que, recebidos e vistos esses estudos, se constata que eles não são posteriores, são anteriores ao estudo do Conselho de Gestão da TAP. Voluntária ou inadvertidamente, o senhor Ministro faltou à verdade. De qualquer modo, permanece a questão central para que exigimos resposta: que faz correr o Governo tão apressadamente e tão erradamente visando a privatização e segmentação da TAP e a sua aliança desnacionalizadora com a Swissair? Por acréscimo, talvez numa atitude desesperada para defender o indefensável, o Ministro procurou ainda lançar o alarmismo, ameaçando que, sem o acordo com a Swissair, a TAP não teria possibilidade de pagar os salários em Março! Será isto uma chantagem? É pelo menos, mais um exemplo de "perigosa manipulação da opinião pública" e dos trabalhadores da empresa, que não pode passar sem a nossa enérgica condenação e uma exigência de rápida clarificação e reposição de toda a verdade No que concerne ao caso da GALP, ele associa, por um lado, um muito chorudo negócio financeiro para os grupos privados em benefício de quem anteriormente foi feita a privatização parcial da PETROGAL e, por outro lado, a perda de capacidade de decisão autónoma nacional numa empresa que vai gerir todo o sector energético não eléctrico. Em apenas oito anos, os grupos económicos reunidos na Petrocontrol viram o seu "investimento" inicial de 8 milhões de contos e uns empréstimos que entretanto foram obtendo na ordem dos 80 milhões de contos, render-lhes a módica quantia de 193 milhões de contos. Aliás, o próprio presidente da Petrocontrol manifestou, sibilinamente, a sua incontida satisfação por tão rendoso negócio que permitiu, nas suas palavras, "uma rentabilidade média anual de 14,5%. O que sendo bom, não é excepcional. Excepcional seria uma rentabilidade acima dos 15%". Isto é, o bom, aqui, significa, no mínimo, "nas bermas do excepcional! Mas mais grave, ainda, é a assumpção pela ENI italiana de uma participação de bloqueio no capital da GALP. No passado dia 4 de Dezembro, o Secretário de Estado da tutela fez, aqui no Plenário, duas afirmações centrais em relação a este negócio. A primeira, a de que, após esta fase de concentração e de troca de acções, o Estado ficaria com 60,56% do capital social da GALP. A segunda a de que, ao nível do Governo, seria salvaguardada uma empresa energética muito importante e garantida a capacidade de decisão autónoma nacional. Nada disto se confirma, antes pelo contrário. Por um lado, a participação do Estado baixa agora para 45,56% e, a curto prazo, para 35%. Por outro lado, e o mais importante, é que nenhuma decisão estratégica, nenhuma decisão de fundo sobre a empresa, sobre o sector energético não eléctrico nacional, pode ser tomada sem o acordo e, muito menos, contra a vontade e os interesses dos italianos. A sede da empresa continuará em Portugal, mas o centro de decisão efectivo passa para Itália. Isto significa não apenas uma gravosa privatização da produção de crude e da expansão da rede de gás natural e da sua distribuição, mas uma inaceitável desnacionalização, no verdadeiro e intrínseco significado da palavra. Senhores Deputados do PS: é público e notório que temos claras e profundas divergências políticas sobre o processo de privatizações que o vosso Governo vem desenvolvendo. Mas aquilo que o Governo está a fazer vai muito para além da privatização de empresas de capitais públicos. O que está em causa é a transparência das opções e das decisões e é, acima de tudo, a transferência de sectores estratégicos nacionais para a dependência de interesses e decisões estrangeiras. É urgente pôr cobro a isto! Não vos proponho que se revoltem contra o vosso Governo. Mas desafio-vos a que reforcem com os vossos os nossos esforços, ao menos para obrigar o Governo a "parar, escutar e olhar". Para que o Governo assuma uma postura exigente de defesa de inequívocos interesses nacionais.

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