Intervenção de João Narciso, Pescador, no debate sobre «O futuro das pescas em Portugal e a reforma da Política Comum de Pescas»

Debate sobre «O futuro das pescas em Portugal e a reforma da Política Comum de Pescas» - «Política Local de Pescas Sesimbra/Setúbal e a Pesca Artesanal»

O Sector das Pescas na Região de Setúbal, que outrora teve importante peso económico, encontra – se hoje, com crescentes dificuldades. Às políticas dos sucessivos governos juntaram-se as orientações de submissão da União Europeia. A Política Comum de Pescas contribuiu para a destruição do sector, mais de metade da Frota da Região desapareceu na última década, com toda a Legislação Comunitária destrutiva, iniciada com o desmantelamento e seguida da aplicação de cotas de Pesca aos Estados Membros.

Ao nível das espécies de pescado, aconteceu primeiro com a Pescada e o Tamboril e está actualmente a acontecer com o impedimento de captura de uma espécie de raia frequente nas águas de Setúbal e Sesimbra.
Muitos Pescadores e pequenos Armadores tiveram que abandonar a actividade, por falta de apoios por parte dos Governos, em relação aos combustíveis que constituem grandes encargos, juntamente com outros factores de produção, levam a que cada vez seja mais difícil a continuação da actividade e a garantia do sustento de muitas famílias da Região.

Relativamente à Pesca Artesanal Local a situação não está melhor, o POPNA e o Regulamento do Parque Marinho Luíz Saldanha, cuja revisão é urgente e reclamada à muito, continua a trazer grandes problemas aos Pescadores de Setúbal e Sesimbra. Exageradas exigências para a atribuição de Licenças, como a dependência do número de vendas em Lota, assim como a exclusão de embarcações entre 7 e 9 metros de trabalhar dentro do Parque, sem qualquer compensação por tal facto, a proibição de pesca com anzol, da arte do Palangre, que é uma arte selectiva e não se percebe porque é proibida nas áreas parciais, assim como toda a Regulamentação que trás graves problemas relacionados com as transmissões de embarcações e respectivas Licenças de Pesca, pois é inaceitável que as embarcações apenas possam ser transmitidas em caso de descendência directa de familiares ou em caso de doença grave comprovada, e esta última, apesar de estar definida no Regulamento do Parque Marinho, nem por isso está a ser cumprida. Restrições, estas, que levam a que seja bastante penalizador a quem compra uma embarcação que não poderá utilizar, por a Licença de Pesca ser considerada pessoal e não da referida embarcação, não sendo esta a opinião da Direcção Geral das Pescas que refere que a Licença é da embarcação. Todos estes factores contraditórios e muitos mais levam a que sistematicamente sejam aplicadas severas multas aos Pescadores, que os mesmos vão acumulando por ser o seu ganha-pão e se não se sujeitarem às mesmas não conseguem sobreviver.

O POPNA foi contestado pelas Autarquias, Associações, Entidades representativas dos Pescadores e População dos Concelhos de Setúbal e Sesimbra. Numa atitude de prepotência e autoritarismo o Governo do PS não promoveu o diálogo com as diversas Entidades, não tomou em consideração as propostas e reivindicações das Populações, das Associações e Autarquias, nem procurou encontrar melhores soluções para o POPNA. Ao mesmo tempo que se criam medidas restritivas que impedem a actividade da Pesca Artesanal, sustento de muitos Pescadores e suas famílias, permite-se a continuação da co-incineração de resíduos industriais na Serra da Arrábida e a exploração desenfreada de inertes, nomeadamente a matéria-prima para a produção de cimento, que tem esventrado parte da Serra.

A criação do parque Marinho Luíz Saldanha, resultante da aprovação do POPNA impede o desenvolvimento das actividades da Pesca Artesanal, afectando directamente centenas de Pescadores. Aprovou-se um Diploma ignorando a posição dos Pescadores e as restrições impostas agravam as condições de vida da População que reside e vive das actividades tradicionais, principalmente da actividade da Pesca, pois todas as limitações não têm base científica. Os instrumentos de conservação da Natureza devem ter em conta a realidade social, económica e as necessidades das Comunidades que afectam. A conservação da natureza deve estar ao serviço da preservação dos recursos para benefício das próprias Comunidades.

Aquando da aprovação e publicação do POPNA, o Governo do PS, na altura, assumiu o compromisso de proceder á sua revisão ao fim de cinco anos. Entretanto passaram cerca de sete anos e o POPNA continua sem ser revisto. O anterior Governo comprometeu-se também em elaborar um Estudo para avaliar os impactos das medidas restritivas das condições de vida da População que não realizou.

A Pesca Artesanal desempenha um papel muito importante no contexto sócio-cultural e garante o sustento de muitas famílias, a ausência de alternativas no Sector da Pesca, na Região de Setúbal, como é o caso das Industrias relacionadas com o Mar, principalmente as conserveiras, de forma a permitir melhor rentabilidade do pescado e empregar mais trabalhadores, exige que a Pesca Artesanal seja considerada a única alternativa que possa permitir utilizar o importante recurso, como é toda a Costa envolvente do Parque Natural da Arrábida. É importante salientar que os Pescadores de Setúbal e Sesimbra não estão contra o POPNA nem contra a preservação das espécies, querem apenas exercer a sua actividade de forma a garantir o seu sustento e das suas famílias, respeitando uma Legislação diferente, exigindo melhores condições de higiene e segurança a bordo das embarcações e a modernização da Frota da Pesca Artesanal.

É necessário um papel activo no esclarecimento dos Pescadores, na denúncia destas situações e na apresentação de propostas para ultrapassarem os problemas da Pesca. Na Assembleia da República, no Parlamento Europeu e nas Autarquias Locais é necessário continuar a apresentar propostas, projectos de resolução, perguntas escritas e até acções de protesto, como foram exemplo os desfiles de embarcações em Sesimbra. É esta luta que terá de continuar na defesa da Pesca Artesanal na Região de Setúbal e no País.

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