Nota da Comissão para as Questões da Ciência e Tecnologia

C&T - o retrato do imobilismo

Mais de um ano decorrido desde que o PS assumiu responsabilidades governativas, impõe-se fazer um balanço da sua actuação na área da Ciência e Tecnologia (C&T) mormente quando, pela primeira vez, essa área mereceu a criação de um Ministério para a sua tutela.

Seis pontos suscitam uma particular atenção:

1º Mantém-se o quadro de desresponsabilização do Estado quanto às exigências básicas de funcionamento dos organismos públicos de execução de I&DE (investigação e desenvolvimento experimental) e de OAC&T (Outras actividades científicas e técnicas). Isto significa, nomeadamente, que a carência de recursos humanos e financeiros para o cumprimento das missões cometidas às instituições continua a ser generalizada; que há instituições que continuam sem quadros de investigadores; que há instituições com quadros de pessoal, investigador e técnico, há largos anos congelados e que assim permanecem; que nada foi feito para modificar a situação de corpos envelhecidos de investigadores e de técnicos superiores; que continua a haver instituições dependentes do trabalho de bolseiros ou de estagiários sem vínculo ou a termo certo; e que tem sido agravada a dependência face aos fundos e programas enquadrados no 2º Quadro Comunitário de Apoio.

2º A formulação explícita de uma política nacional da Ciência e Tecnologia continua adiada. Existe descoordenação entre o Ministério da Ciência e Tecnologia e os ministérios da tutela de organismos sectoriais de C&T. Não são reconhecidas e valorizadas as competências existentes e as missões legalmente cometidas aos organismos de C&T.

O exercício de autonomia científica por parte dos organismos sectoriais, tem sido coarctado. Num quadro de crescentes exigências de intervenção de I&DE em todas as esferas da vida económica e social, é completa a ausência de iniciativas inovadoras que mobilizem as largas centenas de mestres e doutores sem emprego. A carência de recursos, a falta de iniciativa e de coordenação para programas mobilizadores de assumido interesse nacional continua a ser uma realidade dominante.

3º Não obstante a publicação em Agosto de 1996 da lei orgânica do Ministério da Ciência e da Tecnologia, as estruturas para a elaboração participada e coordenação da política nacional de I&DE continuam inoperacionais.

O Conselho Superior de Ciência e Tecnologia, existente há largos anos e de novo reformulado, continua inoperante e continua adiada a auscultação organizada da comunidade científica.

A JNICT herdada da anterior SECT e apesar de desmantelada, continua entretanto a ser a única estrutura operativa da anterior Secretaria de Estado. Novas acções surgem como actos voluntaristas avulsos que apenas ilustram intenções programáticas que não constróem uma política nacional consequente.

4º Quanto ao financiamento verifica-se que o subprograma Ciência e Tecnologia do 2º Quadro Comunitário de Apoio - PRAXIS XXI (17 milhões de contos) continua a ser uma das principais fontes de financiamento das actividades de I&DE desenvolvidas no nosso país, o que confere particular importância ao aperfeiçoamento da respectiva gestão. Apesar de significativo este financiamento acaba de ser escasso por ir suprir necessidades de financiamento que deveriam ser asseguradas por fundos nacionais. Além disso é um financiamento aleatório, resultando incoerente e falho de estratégia sectorial, pelo que não produz impactes estruturantes.

É ainda um instrumento de financiamento que carece de orientação e supervisão por parte de órgãos de acompanhamento e avaliação e por isso vulnerável às pressões de grupos de interesses e dependente do mero arbítrio do gestor nomeado pelo Governo.

5º Sendo evidente que, pela sua natureza, as actividades de I&DE sempre foram internacionais e internacionalizantes, verifica-se que o actual Governo entende a realidade em sentido inverso. Ou seja, entende que da internacionalização resultará espontaneamente o progresso da I&DE, ainda que sem recursos nem objectivos para as actividades científicas nacionais. Assiste-se, pois, a uma "política" pretensamente internacionalizante que não reconhece e desvaloriza as capacidades nacionais. Designadamente: ao colocar a tónica da internacionalização na adesão a organismos internacionais, assume encargos adicionais sem garantir recursos aos organismos nacionais interessados, pelo que tais esforços não são rentabilizados; ao subalternizar especialistas, associações profissionais e sociedades científicas, face ao protagonismo de júris, peritos e consultores estrangeiros, supostamente mais competentes; ao ignorar méritos e competências das instituições nacionais que, se adequadamente apoiadas, naturalmente intensificariam o seu contributo e entrosamento internacionais.

6º Importa chamar também a atenção para o facto do desempenho do Ministério da Ciência e Tecnologia caracterizar-se por uma posição paternalista relativamente à comunidade científica e aos outros ministérios que tutelam instituições sectoriais de C&T (laboratórios e universidades). Não evidenciar competência na sua área de intervenção (como é patente na incapacidade para definir uma política científica nacional e na intervenção em acontecimentos de impacte mediático, como sejam os casos COMBO e SIEMENS). Defraudar expectativas criadas quanto a pontos programáticos do Governo em particular no que respeita: à afectação de recursos suficientes ao funcionamento estável das equipas e das instituições de I&DE; à rentabilização de recursos humanos especializados mas sem vínculo e actividade regular; à inscrição em Orçamento do Estado de um Orçamento de C&T por sector, área e acções (e não o mero aditamento do Orçamento de um novo ministério); à mobilização do interesse das empresas para a I&DE; à mobilização do sistema de ensino para a cultura científica e o avanço do ensino das ciências; à transparência de actuação e credibilidade do aparelho de Estado na área da sua intervenção.

A Comissão para as questões da Ciência e da Tecnologia do PCP, ao exprimir esta sua apreciação crítica, não é movida por qualquer atitude política preconcebida, antes se move pela necessidade de ser alterada e dinamizada a intervenção num sector que apresenta uma importância estratégica para enfrentar os graves problemas com que o país está confrontado, e os desafios do desenvolvimento integrado nacional.

É neste quadro e com esta perspectiva que o PCP irá procurar intervir mais activamente nesta área - seja contribuindo para que a comunidade científica assuma uma voz própria e um protagonismo reforçados, seja alargando e dinamizando a sua acção política própria - designadamente na esfera institucional.

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