Declaração de Agostinho Lopes, membro da Comissão Política do Comité Central, Conferência de Imprensa

A crise da suinicultura, as tarifas da energia eléctrica e o encerramento da empresas Longa Vida/Nestlé e Texas Instruments/Samsung Electronic

A Comissão Política do PCP analisou três problemas actuais:

- A crise da suinicultura
- As tarifas da energia eléctrica
- O encerramento da empresas Longa Vida/Nestlé e Texas Instruments/Samsung Electronic

Uma primeira e geral constatação pode ser feita: são as orientações neoliberais (liberalização, desregulamentação e privatização) do Governo PS (como do governo PSD/Cavaco Silva) e da União Europeia que estão postos em causa. Os três problemas decorrem dessas escolhas de política económica: endeusamento do mercado e redução do papel do Estado na regulação económica.

1. A crise na suinicultura

A suinicultura portuguesa, como a europeia, vive uma profundíssima crise. Dificuldades de escoamento, preços na produção bastante abaixo dos seus custos, excedentes europeus da ordem de um milhão de toneladas, assalto do mercado nacional, cujo grau de auto-suficiência é da ordem dos 70%, por importações sem qualquer controlo. Sublinha-se o importante facto que as significativas baixas de preços na produção não terem tido, até ao momento, qualquer impacto nos preços pagos pelos consumidores.

As razões estruturais desta situação são conhecidas: uma fileira completamente liberalizada, uma produção dominada por meia dúzia de grandes pocilgas, apesar da presença de milhares de explorações familiares e pequenas suiniculturas. Como causa próxima, a crise asiática e o afundamento do mercado russo, principais clientes do suíno da União Europeia, como resultado das orientações neoliberais, aconselhadas e apoiadas pelo FMI/Banco Mundial, Estados Unidos e União Europeia!

Uma visão ultraliberal do mercado e a correspondente ausência de mecanismos públicos de regulação, não permitiram nem antecipar nem travar a crise.

As medidas anunciadas tardiamente pelo Governo são insatisfatórias.

Não respondem suficientemente aos problemas da produção, que são os problemas centrais da crise, fazendo depender a concretização das medidas da intervenção dos operadores ligadas à comercialização e à exportação. O que significa que estes podem vir a ser mesmo os grandes beneficiários da crise, pelos preços que estão a pagar à produção, pelas medidas anunciadas!

As medidas não respondem suficientemente à especificidade dos problemas da pequena produção e pocilgas familiares. Refira-se que cada crise grave na suinicultura se transforma num processo de liquidação de pequenas explorações, o que provoca uma posterior intensificação e concentração de produção em grandes unidades, fazendo crescer os problemas ambientais e os riscos de sobreprodução.

O PCP, consciente da importância desta produção na economia portuguesa, e no abastecimento do mercado nacional de produtos pecuários, no seguimento das intervenções já realizadas no Parlamento Europeu e na Assembleia da República, considera que o Governo deve, com urgência, reformular o conjunto das medidas anunciadas.

Consideramos que, no imediato, devem ser considerados os seguintes aspectos:

- Estabelecimento temporário de uma tabela de preços da carne de porco no consumo, pela fixação de uma margem de comercialização ou fixação de preços máximos, fazendo reflectir naqueles os actuais preços médios à produção;

- intervenção pública no escoamento da produção das explorações familiares a um preço que cubra os seus custos;

- alargamento da linha de crédito a médio prazo à taxa de 0%, até 60/70 porcas por activo, o que permitirá o acesso de uma exploração familiar de 180/200 porcas;

- garantir que as rações produzidas com as matérias-primas obtidas dos stocks de intervenção comunitária tenham preços reduzidos;

- alargamento aos pequenos suinicultores das condições estabelecidas para os pequenos agricultores afectados pelas intempéries no tocante às prestações para a Segurança Social;

- fiscalização rigorosa das importações, tomando medidas para impedir o consumo de toda a carne de suíno que não cumpra as exigências qualitativas impostas à produção nacional - alimentados com rações de origem animal, com vestígios de fármacos («antibióticos») não permitidos - ou em resultado de operações de dumping (vendida abaixo do preço de custo);

- concretização urgente pelo Governo, com a respectiva dotação dos meios materiais e humanos necessários, do «Observatório dos mercados agrícolas e das importações agro-alimentares», lei proposta pelo PCP e aprovada por unanimidade na Assembleia da República!

A fileira da suinicultura é indutora de numerosos empregos, a montante e a jusante, e é uma efectiva possibilidade de desenvolvimento de numerosas regiões, numa perspectiva de ordenamento equilibrado do território e de total respeito pelo ambiente. Por isso mesmo, reclamamos uma profunda reformulação da Organização Comum de Mercado (OCM) da Carne de Suíno, a incluir na reforma em curso da PAC/Agenda 2000, por forma a satisfazer três questões: o controlo da produção; uma actividade realizada preferencialmente por pequenos e médios produtores e em regiões com poucas alternativas culturais; e o cumprimento de normas ambientais.

2. A descida das tarifas eléctricas. Uma medida com eficácia social e eficácia económica

O PCP há muito que tem alertado para o facto de os portugueses estarem a pagar tarifas de electricidade que, em termos relativos de poder de compra, são as mais caras da Europa.
De facto, os consumidores nacionais têm estado a pagar um autêntico imposto para a privatização da EDP, garantindo-lhe lucros exorbitantes. Como, aliás, se pode comprovar pelas informações prestadas por várias entidades (onde se incluía a entidade reguladora), nos prospectos da OPV, aos potenciais investidores!

A EDP teve, em 1997, de lucros declarados, 93 milhões de contos, e prevê atingir os 120 milhões em 1998, à custa da economia nacional e das famílias portuguesas.

É sabido também que os custos de produção da EDP têm baixado.

Foi tendo em consideração estes factos que o PCP apresentou na Assembleia da República uma resolução, que foi aprovada, recomendando ao Governo que, pelos meios adequados, interviesse no sentido da concretização de uma baixa em termos nominais das tarifas da electricidade, no valor de 15%, designadamente para os consumidores domésticos.

Pelas notícias vindas a público, a Entidade Reguladora do Sistema Eléctrico (ERSE) anunciou uma descida, em termos nominais, de 10.4% para os consumidores industriais e de cerca de 6% para os consumidores domésticos.

O PCP considera que estas diminuições, embora sejam um avanço, ficam aquém do que era possível, desejável e justo, nomeadamente em relação aos consumos domésticos.

Há condições para uma redução mais significativa, sem pôr em causa o equilíbrio financeiro da EDP e a melhoria da qualidade do serviço.

A descida significativa dos preços da electricidade põe fim à irracionalidade económica que coloca as empresas portuguesas em desigualdade competitiva em relação às empresas espanholas e europeias.

As empresas portuguesas pagam a factura energética mais elevada da Europa.

A sua descida é, por isso, uma medida de grande eficácia económica. Por outro lado, a descida das tarifas pode e deve corrigir uma evidente injustiça social que é a das famílias estarem a pagar um «imposto escondido», para engordar os lucros da EDP. Em cinco anos, os resultados da EDP foram multiplicados por seis.
Segundo cálculos suportados em dados da própria empresa, em cada KW/hora, a nossa factura de electricidade contribui com 5,6 escudos directamente para os lucros da EDP, enquanto em 1995 essa contribuição era apenas de 2,6 escudos!

Por isso, o PCP entende que o anúncio da baixa dos consumos domésticos feito pela entidade reguladora é insuficiente e põe em causa a sua transparência e isenção, visto estar comprometida com a privatização da EDP.

Seria um escândalo que os consumidores portugueses continuassem a pagar um «imposto oculto», mesmo que mais baixo, para satisfazer os compromissos do Governo com as privatizações.

3. As multinacionais os despedimentos e o Estado português

O PCP considera que o Estado português não pode ficar de braços cruzados face aos despedimentos e às decisões tomadas pelas multinacionais a seu belo prazer.

Muitas multinacionais instalaram-se no nosso País recebendo avultados apoios financeiros e fiscais, tendo compromissos perante o Estado português, que deve exigir com firmeza o seu escrupuloso cumprimento. O que se passou com a Renault em Setúbal não pode repetir-se.

As notícias da venda da posição da Ford na AutoEuropa; que a Siemens pensa alienar parte do capital de três das sete fábricas que detém no País; que as Texas Instruments e a Samsung Electronic vão encerrar a empresa de semi-condutores que detém na Maia, lançando no desemprego 748 trabalhadores; que a Nestlé vai fechar a unidade produtiva de lacticínios e semi-frios Longa Vida, que controla em Perafita, em Matosinhos, com a sua possível deslocalização para Espanha ou França, colocando em risco os postos de trabalho de 100 trabalhadores; exigem do Governo uma posição firme e clara.

O PCP entende que estas multinacionais receberam chorudos benefícios e que não podem fazer como o beduíno, isto é, levantar a tenda sem deixar rasto ficando o País com os custos sociais do desemprego...

O PCP considera também que o Governo deve lançar um sério aviso à Nestlé, «useira e vezeira» em comprar empresas em boa situação para, mais tarde, as encerrar com vista a ficar sozinha no mercado. Recorde-se que a Nestlé já anteriormente tinha fechado as fábricas da Rajá e da Findus, e despedido 70 trabalhadores da Longa Vida.

E anote-se que, neste caso, não são apenas os empregos directos que desaparecem. É também o desaparecimento de unidades que utilizam matérias-primas nacionais (agrícolas, pescado).

O PCP vai estar atento à actuação do Governo em relação a estes casos e exigir, sem contemplações, que o País seja completamente ressarcido pelos prejuízos causados quer pela Samsung, quer pela Nestlé.

O PCP exige que sejam tornados públicos todos os contratos (com os respectivos benefícios financeiros e compromissos) de IDE em que hajam avultadas comparticipações públicas.

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