Intervenção de

Criação do Provedor do Ouvinte e do Provedor do Telespec-tador nos Serviços Públicos de Rádio e Televisão<br />Intervenção de António Filipe

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria manifestar a nossa concordância com esta iniciativa do Governo. Já aqui foi dito que poderá ser uma medida pouco relevante. Admitamos que assim seja. Em todo o caso, não nos parece que seja uma medida negativa, pelo contrário. Costuma dizer-se, muitas vezes, que «se não fizer bem, mal também não fará». Mas esperamos que possa ter um efeito positivo, que possa ter relevância o facto de existirem nos serviços públicos de rádio e de televisão provedores do ouvinte e do telespectador. Também não vemos mal algum que tal seja determinado por lei desta Assembleia. Sabemos que há órgãos de imprensa escrita que têm, por sua própria decisão, um provedor dos leitores, mas, como é evi-dente, também sabemos que isso está inteiramente na disponibilidade das respectivas direcções e que, de um dia para o outro, se o entenderem, podem acabar com os respectivos provedores. Daí ser importante que seja a Assembleia da República a determinar, seja qual for o conselho de admi-nistração que estiver à frente dos concessionários dos serviços públicos de rádio e de televisão, a obriga-ção, estabelecida por via legal, de existência de um provedor dos respectivos ouvintes e telespectadores. Portanto, nada nos repugna que exista essa imposição legal, cujos contornos sejam regulados por lei, e que seja também estabelecido por lei o seu quadro de competências e o quadro institucional em que devem funcionar. É claro que há alguns aspectos que poderão ser objecto de reflexão, não pondo em causa o quadro geral de concordância relativamente a esta iniciativa. Por exemplo, não nos parece que seja obrigatório que o provedor seja alguém ligado profissionalmente ao sector da comunicação social nos últimos cinco anos. Não nos repugna que uma personalidade destacada da vida cultural portuguesa, por exemplo, possa ser provedor do telespectador ou do ouvinte sem que tenha de ter estado obrigatoriamente ligado em termos profissionais ao sector da comunicação social. Pensamos que não deve ser obrigatória esta ligação profis-sional ao sector, embora também não nos choque, obviamente, que seja alguém ligado ao sector da comu-nicação social. Mas poderá haver aqui alguma rigidez excessiva. Talvez se possa conceber uma intervenção maior do próprio Conselho de Opinião, que não seja apenas a emissão de parecer. Entendemos que, no mínimo, o parecer do Conselho de Opinião deveria ter carácter vinculativo. Mas gostaria que o Governo esclarecesse se se poderá pensar numa intervenção maior do Conselho de Opinião, designadamente se pela via da proposta ou da decisão de entre vários nomes que lhe sejam indicados se poderia encontrar uma outra forma de participação mais efectiva. Também deveria ser pensada a questão do programa. Estabelece-se aqui uma obrigatoriedade de asse-gurar a difusão de um programa semanal dos provedores, mas valia a pena pensar se esta é a melhor for-ma. Pode ser, mas quer o serviço público de rádio quer o serviço público de televisão têm vários canais: a RDP tem a Antena 1, a Antena 2, a Antena 3, a RDP Internacional, a RDP África; e a RTP tem o primeiro e o segundo canais generalistas, os canais que emitem por cabo e os canais internacionais… Portanto, há que ver, desde logo, onde é que este programa será emitido e ter em atenção que o provedor pode ter de pronunciar-se sobre matérias relativas a vários canais e que pode não haver uma comunicação muito direc-ta entre eles. Talvez fosse preferível assegurar que as posições manifestadas pelo provedor têm eco na programação. Isso parece-me inquestionável, senão serviria para muito pouco. Ou seja, se o provedor é dos ouvintes e dos telespectadores, mas depois os ouvintes e os telespectadores não têm acesso, através dos canais adequados, às decisões tomadas pelo provedor, isso faz pouco sentido. Portanto, deve encontrar-se uma forma de expressão da actividade do provedor na programação, mas talvez o diploma seja excessivamente rígido, pois até é de admitir que possam existir provedores que não tenham uma vocação para participar ou fazer programas de televisão ou de rádio e, apesar disso, ser bons provedores. Esta é uma questão que poderia ser debatida, assim como o dever de resposta fundamentada ao pro-vedor por parte das administrações e a adopção das medidas necessárias. A adopção das medidas neces-sárias parece-nos obviamente pertinente, visto que o provedor deve ver reflectida a sua opinião, isto é, as administrações devem actuar, tanto quanto possível, em conformidade com as recomendações e os pare-ceres que sejam manifestados pelo provedor, para que ele tenha um sentido efectivamente útil. No entanto, não gostaríamos de entender esta resposta fundamentada como uma espécie de troca de missivas — de resposta, de réplica e de tréplica — entre o provedor e a administração. Se o provedor, no âmbito dos pro-cessos que tem de apreciar, vai ouvir a administração e depois decidir a final, não nos parece que seja muito útil que, depois da decisão do provedor, a administração possa responder, podendo vir a suscitar uma controvérsia entre a própria administração e o provedor. Pode não ser essa a ideia, mas creio que deveria ser reflectida a formulação do n.º 3 do artigo 6.º do diploma. Estes são apenas alguns aspectos que gostaríamos de colocar desde já, com o intuito de contribuir para que, de facto, se possa aprovar um diploma positivo. Parece-nos que isso vai ser possível, que será essa a ideia de todas as bancadas, pelo que poderemos estar aqui na presença de uma medida, que pode ser relevante para melhorar a relação dos serviços públicos de rádio e de televisão com os respectivos ouvintes e telespectadores.

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