Intervenção de

Contagem do tempo de serviço para efeitos de progressão nas carreiras e congelamento do montante dos suplementos remuneratórios - Intervenção de Jorge Machado na AR

Prorrogação da vigência das medidas aprovadas pela Lei n.º 43/2005, de 29 de Agosto, até 31 de Dezembro de 2007 (não contagem do tempo de serviço para efeitos de progressão nas carreiras e congelamento do montante dos suplementos remuneratórios dos funcionários, agentes e demais servidores do Estado)

 

Sr. Presidente,
Sr. Secretário de Estado,
Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados:

O debate que hoje realizamos é um déja vu. No passado dia 28 de Julho de 2005, nesta mesma Assembleia, o Governo apresentava uma proposta de lei que estabelecia, dizia o Governo, uma medida transitória.

Dizia o Governo, nessa altura, que o tempo de serviço dos trabalhadores da Administração Pública não contava para efeitos de progressão na carreira e congelava também todos os suplementos remuneratórios até Dezembro de 2006. Ora, esta medida transitória vê a sua esperança de vida prolongada.

É mais um ano de perda do tempo para efeito de progressão e é mais um ano sem actualização dos suplementos remuneratórios, o que constitui um novo ataque aos vencimentos dos trabalhadores da Administração Pública.

A proposta de lei n.º 104/X, que hoje discutimos, prorroga os efeitos da Lei n.º 43/2005 até 31 de Dezembro de 2007. O Governo não inova nos argumentos que invocou.

Diz o Governo que a presente proposta de lei encontra «a sua motivação na forte tendência de crescimento das despesas com pessoal (...) que representaram, em 2004, 14,4% do PIB contra 10,8% da média da União  Europeia a 15». Ora, o Governo «compara alhos com bugalhos».

Se analisarmos o peso das despesas totais da Administração Pública, isto é, aquilo que o Estado gasta para a prestação de serviços, então, chegamos a números bem diferentes.

Portugal gasta cerca de 47,8% do seu PIB, quando a média da União Europeia, também a 15, gasta 47,6%, existindo mesmo muitos países, como a Bélgica e a Dinamarca, com despesas superiores a 50%.

Assim, a ideia tão propagandeada de que a Administração Pública é a causa do défice cai por terra.

A solução para o problema do défice reside no lado das receitas. Contudo, o Governo alimenta toda uma política de destruição de serviços públicos e de ataques aos direitos dos trabalhadores, tendo como pano de fundo esse combate ao défice que devia, e podia, passar pelo lado das receitas e pelo combate à economia paralela.

O Governo volta a insistir na falsa ideia de que existem progressões automáticas na Administração Pública.

Na Administração Pública, Sr. Secretário de Estado, não existe nenhuma carreira que progrida apenas com o decorrer do tempo. Além do tempo de serviço, os trabalhadores precisam de uma avaliação positiva do seu desempenho para progredirem na carreira.

Já no ano passado desafiámos o Sr. Secretário de Estado a dizer quais são as carreiras da Administração Pública que progridem automaticamente. Nessa altura não respondeu, nem responderá agora, porque não existem.

O Governo, à imagem do que aconteceu no ano passado, simula uma negociação colectiva.

Na verdade, cumpriu formalmente as regras de negociação, mas não chega. Importava ouvir verdadeiramente as organizações representativas dos trabalhadores e negociar com elas.

O Governo assume o seu verdadeiro objectivo com este diploma, quando afirma que a Lei n.º 43/2005 fez baixar a despesa pública com pessoal e que isso demonstra que a medida é oportuna e necessária.

Sr. Presidente,
Sr. Secretário de Estado,
Sr.as e Srs. Deputados:

Oportuna e necessária era uma outra política que encarasse a Administração Pública como um factor de desenvolvimento, que abandonasse de vez a concepção retrógrada e balofa de «menos Estado, melhor Estado».

Necessária era uma outra política que valorizasse a Administração Pública e o importante serviço que esta presta ao País e à população. O que era oportuno e necessário era uma política que pusesse fim ao vergonhoso processo de privatizações de serviços públicos, que alimentam a gula de alguns sectores privados à custa de todos os portugueses. Importante era que o Governo dignificasse os salários de miséria que existem na Administração Pública, que olhasse para os trabalhadores da Administração Pública com respeito e não como inimigos a abater.

Sr. Presidente,
Sr. Secretário de Estado,
Sr.as e Srs. Deputados:

No passado dia 28 de Julho de 2005, o Governo congelou a progressão na carreira e a actualização dos suplementos até Dezembro de 2006, porque estava em curso a revisão do sistema de avaliação. Hoje, o Governo estende o prazo até Dezembro de 2007 porque, além da revisão do sistema de avaliação e desempenho, quer mudar o estatuto remuneratório, os vínculos e as carreiras dos trabalhadores da Administração Pública.

Este diploma é, assim, uma espécie de aquecimento, uma espécie de antecâmara, o preâmbulo de um conjunto de medidas que vão atacar os alicerces em que se funda a Administração Pública.

Ficamos a saber que, quanto a ataques aos trabalhadores, o Governo não deixa os seus créditos em mãos alheias. Enquanto não consegue atingir os seus objectivos finais, congela «transitoriamente» a progressão nas carreiras.

Importa lembrar as palavras do Sr. Deputado António Gameiro, do Partido Socialista, nesse debate. «(...) É evidente que a medida é transitória, está na letra da lei que se aplicará desde a data de entrada em vigor do diploma até 31 de Dezembro de 2006». Ora, o presente diploma prova que estas medidas são tudo menos transitórias.

Enquanto não muda o sistema de avaliação e desempenho, enquanto não altera as carreiras e os vínculos, o Governo vai destruindo os direitos por esta via e, uma vez concretizadas estas medidas, deixa de ser necessário congelar a progressão das carreiras porque o Governo, nessa altura, já terá encontrado a maneira de ou eliminar o direito a progressão na carreira ou limitar a progressão a casos muito residuais.

Sr. Presidente,
Sr. Secretário de Estado,
Sr.as e Srs. Deputados:

Infelizmente, tínhamos razão quando afirmámos, no passado dia 28 de Junho de 2005, que o Governo iria abrir mais uma frente de batalha numa guerra. Hoje, podemos afirmar que a guerra não é só contra os trabalhadores da Administração Pública mas também contra os serviços públicos.

Infelizmente, tínhamos razão quando dissemos que, com estas políticas e com estas medidas, o Governo apenas iria conseguir o conflito, a luta. Hoje, e após diversas manifestações e greves, podemos afirmar que com estas políticas e estas medidas, o Governo conseguiu não só a forte e determinada oposição dos trabalhadores da Administração Pública mas também o descontentamento e o protesto de milhares e milhares de trabalhadores do sector privado.

 

A persistir neste caminho, o Governo só pode esperar mais descontentamento e mais protestos por parte dos trabalhadores e do povo português.

 

 

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