Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República, Sobre o acesso à Adopção por casais do mesmo sexo

"Construir um país onde os direitos das crianças existam na Lei e na vida de todos os dias"

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
O 6.º princípio da Declaração Universal dos Direitos da Criança enuncia que «a criança precisa de amor e compreensão para o pleno e harmonioso desenvolvimento da sua personalidade».
O amor, o carinho e o afeto devem ser a base das relações familiares. E por isso mesmo, todas as crianças têm direito a nascer e a crescer numa família que as cuide e as ame incondicionalmente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com este debate retomamos hoje a discussão da adoção por casais de pessoas do mesmo sexo.
Aquando da última discussão sobre esta matéria, a 21 de janeiro de 2015, afirmámos que esta questão, direta e indiretamente, tem sido ao longo dos anos alvo de discussão e análise na sociedade e no Parlamento, designadamente aquando das discussões realizadas a propósito das alterações ao regime do casamento ou da coadoção.
Afirmámos que respeitamos as compreensíveis expectativas e os sentimentos dos que pretendem ver consagrada a possibilidade de adoção que hoje lhes está vedada, que não ignoramos as situações concretas existentes, de famílias constituídas, de ligações de afeto e de relações efetivas de parentalidade e filiação, e que procuramos refletir sobre estas importantes questões com profundidade.
A possibilidade do casamento gerou novos problemas e dificuldades na organização de vida destas famílias às quais é necessário também responder. E, na verdade, o debate continuou a aprofundar-se na sociedade portuguesa e registam-se evoluções e sinais de progressivo acolhimento social destas famílias na sociedade.
Continuamos a enfrentar hoje a realidade de crianças que crescem institucionalizadas à espera de serem adotadas e de casais de pessoas do mesmo sexo que querem adotar mas que são impedidos pela lei de o fazer em conjunto, vendo-se obrigados a fazê-lo individualmente, adiando ou ocultando a realidade da organização da sua vida em comum.
Não esquecendo, nem desvalorizando, a necessidade de resolver os graves problemas que hoje persistem no âmbito da adoção, e que o anterior Governo não quis resolver e inclusivamente agravou, queremos sinalizar a evolução que hoje se regista em relação a esta matéria e, por isso, votaremos favoravelmente os projetos apresentados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados,
O caminho do reconhecimento e da efetivação, na lei e na vida, de direitos económicos, sociais e culturais das crianças e das famílias é uma obrigação constitucional e uma necessidade, de progresso e justiça social.
Em Portugal, só a partir da Revolução de Abril de 1974, com a conquista e consagração legal de um sólido corpo de direitos económicos e sociais, teve início o caminho de construção e garantia dos direitos das crianças nas suas múltiplas dimensões e de forma transversal.
A Declaração Universal dos Direitos da Criança foi proclamada pela Organização das Nações Unidas a 20 de setembro de 1959, e passados 20 anos foi celebrado o Ano Internacional da Criança. Contudo, só a 20 de novembro de 1989 foi aprovada pela ONU a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, que seria ratificada por Portugal no ano seguinte.
A todas as crianças deve ser assegurado a igualdade de oportunidades, o direito à proteção, ao amor e ao afeto, ao respeito pela sua identidade própria, o direito à diferença e à dignidade social, o direito a serem desejadas, à integridade física, a uma alimentação adequada, ao vestuário, à habitação, à saúde, à segurança, à instrução e à educação.
Estes direitos são inseparáveis da obrigação do Estado no cumprimento efetivo dos direitos civis, sociais, económicos e culturais, bem como pelo assumir das responsabilidades para garantir, na prática da vida das crianças, os princípios da Constituição da República Portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados:
Hoje, no nosso País, pese embora a vigência destes direitos fundamentais em forma de lei, a vida quotidiana de milhares de crianças no nosso país é marcada por negação de direitos.
As causas estruturais da pobreza em Portugal foram nos últimos quatro anos agravadas de forma profunda pelo caminho de empobrecimento concretizado pelo Governo PSD/CDS-PP.
A derrota do Governo PSD/CDS-PP, imposta pela luta e traduzida também no voto, abre um caminho de esperança para as votações que hoje fazemos e para a construção de um País onde os direitos das crianças existam na lei e na vida de todos os dias.

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