Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

"Combater a privatização dos CTT - Derrotar este governo e esta política"

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Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Secretário de Estado,

A primeira coisa que queremos afirmar neste debate é que os Correios não são nem podem ser um lucrativo negócio de alguns. Os Correios são do Povo! São de nós todos, têm de estar ao serviço de nós todos, e são um serviço público fundamental às populações, à economia nacional, ao desenvolvimento regional e à coesão territorial.

Os CTT pretendem encerrar centenas de estações de correios e passar parte do serviço para papelarias e estabelecimentos similares, ficando o resto do serviço só possível noutras estações de correios, quase sempre a vários quilómetros de distância.

As estruturas representativas dos trabalhadores dos correios alertaram já para o problema da confidencialidade do serviço que deixará de ser assegurada, tratando-se de informação sobre pensões de reforma, o que pagam ou recebem os cidadãos, a quem enviam cartas e de quem recebem.

Verifica-se uma opção de encerramento de estações dos correios em todo o tipo de localidades, desde as freguesias mais isoladas e deprimidas até centros urbanos densamente povoados. Desde o ano de 2000 mais de um milhar de estações e postos de correios foram encerrados, agora coloca-se a perspetiva de mais 200: a continuar esta política serão depois muitas mais.

Estamos perante uma operação também de desmantelamento de postos de trabalho cujos contornos e total dimensão estão ainda por revelar. Só no último ano a empresa terá ficado com 669 trabalhadores a menos. Agora a situação tenderá a tornar-se muito mais grave, caso se concretizem as medidas em causa.

Desde já, as opções do Governo e da Administração dos CTT (ao que tudo indica, com o aval da ANACOM) apontam para um aumento das tarifas do serviço postal, em vigor desde esta semana, que vem agravar mais este quadro preocupante para as populações e empresas.

A Administração veio a público anunciar uma “atualização” do tarifário, afirmando estar em causa um aumento médio anual de 2,9%.Mas esse nível “médio”, que só por si seria injusto e inaceitável, traduz-se afinal numa realidade bem mais gravosa. Por exemplo, o preço do selo do Correio Azul, até 20 gramas no formato normalizado, passa de 47 para 50 cêntimos, ou seja, um aumento de 6,38 por cento. O selo do Correio Normal, até 20 gramas normalizado, aumenta de 32 para 36 cêntimos, ou seja, 12,5 por cento!

Avança entretanto a diferenciação de preços praticados, em função das regiões servidas: começando para já no segmento do correio normal em quantidade (particularmente relevante para as atividades económicas), é promovida uma estratégia de discriminação tarifária, com preços mais baixos para correio com origem em Lisboa, Porto ou Coimbra e com destino em Lisboa ou Porto. Esta é uma opção com particular e preocupante significado para a coesão territorial do País no que concerne ao aprofundamento das assimetrias regionais e que contraria o que foi prática desde sempre, ou seja a periquação tarifária (tarifas iguais para todo o território nacional).

O Governo quer privatizar os CTT, um serviço com 500 anos de existência, uma empresa que dá lucro e que presta um serviço inestimável às populações de todo o país. Tudo isto está a ser feito em benefício de quem vier “comprar” a empresa CTT, e contra as necessidades das populações e do país.

Bem podem dizer as “almas piedosas” que apoiam a privatização… mas que estão contra os encerramentos no terreno. Mas é preciso não esquecer que esses encerramentos são consequência direta da política e da estratégia de privatização e liberalização do serviço público postal – que têm sido apoiadas e defendidas e levadas a cabo pelos seus partidos, aqui mesmo na Assembleia da República, em sucessivas legislaturas, com sucessivos governos!

Há um mês atrás, quando já estavam em força nos bastidores as movimentações de bancos e escritórios de advogados para “assessorar” a privatização, com os interesses privados em jogo neste negócio dos CTT, o PCP denunciou este processo e propôs que fossem chamados à comissão parlamentar o Governo, a ANACOM, a Administração dos CTT e as organizações representativas dos trabalhadores da empresa.

A maioria parlamentar do PSD e do CDS tentaram impor a “lei da rolha” e inviabilizaram essa audição chumbando a proposta. Mas aqui chegados, o que se evidencia é que não tiveram sorte nenhuma nos seus intentos. Por um lado, porque o PCP não desiste de dar voz nesta Assembleia à denúncia e ao combate indispensáveis a esta política de destruição do serviço público postal. E por outro lado, não menos importante, é que aquilo que alguns tentam calar na Assembleia não conseguem calar nas ruas deste país!

Nas ruas e nas praças, nos serviços e locais de trabalho, lá junto às estações que este Governo e esta Administração pretendem encerrar e retirar às populações, lá estão os utentes, os trabalhadores dos correios, tantas vezes os eleitos autárquicos em luta pela defesa daqueles serviços tão importantes para a vida das pessoas. Assim foi em Alcoentre, no centro histórico do Porto, Vale de Santarém, na Amora, no Barreiro, na Moita, ontem mesmo em Cacilhas, assim foi com as populações de Safara, de Alvalade Sado, Cercal e Ermidas que se deslocaram a Lisboa e fizeram ouvir a sua voz contra esta política.

Bem sabemos que as “ordens superiores” na empresa foram, em alguns destes casos, de encerrar as portas – se possível pela calada, sem que se dê uma palavra aos utentes (assim foi anteontem mesmo em Freixianda, Vila Nova de Ourém).

Até pudemos testemunhar em alguns casos que, numa atitude de verdadeiro insulto às populações, se encerrou a Estação dos CTT no próprio dia da concentração, afixando na porta um anúncio alegando «motivos de segurança» - como se os utentes, os trabalhadores ou os autarcas que ali estavam fossem alguns criminosos.

Queremos aqui dizer ao Governo que criminosa é esta política e esta estratégia! Criminoso é deixar as populações ao abandono, a uma distância cada vez maior do serviço de correios, e ainda ter a hipocrisia de dizer que ninguém fica excluído do acesso ao serviço postal. Criminoso é destruir emprego, degradar serviços públicos e sacrificar as populações e os trabalhadores aos interesses privados dos grupos económicos.

Por isso saudamos a luta, sim. Saudamos a luta que no terreno se desenvolve por esse país fora. Saudamos as organizações dos trabalhadores dos Correios e a sua firmeza numa luta de tantos anos, em defesa em defesa do trabalho com direitos, mas desde logo em defesa do interesse nacional, do serviço público postal, da coesão do território e da própria soberania do país. Saudamos as autarquias e os autarcas que não abdicam de lutar contra estes encerramentos. Saudamos as populações que rejeitam esta injustiça e este assalto às suas vidas.

Saudamos a coragem, a determinação, a dignidade que todos os dias se afirma e reafirma em cada luta, e daqui dizemos com a convicção e a experiência do que a vida nos ensina: este não é um assunto encerrado! Outros tentaram impor a lógica dos factos consumados e das inevitabilidades – e não conseguiram. Também agora, com a unidade e a luta de quem não desiste de defender um futuro melhor, será possível resistir e avançar!

Disse.

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