Declaração de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Sessão Pública «Combate ao vírus e defesa dos direitos dos reformados, pensionistas e idosos»

Combate ao vírus e defesa dos direitos dos reformados, pensionistas e idosos

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Os últimos meses têm sido marcados por uma situação excepcional, em resultado do surto epidémico da COVID -19 e das medidas sanitárias para a sua prevenção e combate, em que o Serviço Nacional de Saúde e os seus profissionais tiveram um papel insubstituível.

Entramos num novo período de retoma da vida do País, um caminho de normalização da actividade económica e da vida dos portugueses conscientes da necessidade de cumprir as regras básicas de protecção da saúde, individual e colectiva.

O retorno gradual ao trabalho tem de ser acompanhado pela necessidade de reforçar a protecção de todos aqueles que dinamizam a actividade económica do País, desde logo com a criação de condições que salvaguardem a protecção dos que diariamente têm que se deslocar nos transportes públicos para trabalhar.

Os que se vêem no desemprego com cortes nos salários e os que sobrevivem com pensões baixas têm dificuldades acrescidas no acesso a máscaras, luvas e gel desinfectante resultante de preços incompatíveis com o seu nível de rendimento.

Uma situação inaceitável que mostra que o surto epidémico tem sido potenciado pelo capital e pelas empresas multinacionais como uma oportunidade para aumentar os seus lucros, pelo aumento da exploração laboral e pela especulação de preços destes produtos e de outros bens essenciais à vida.

Gostaria, entretanto, de observar o equívoco que tem gerado na sociedade, entre o "dever de especial atenção aos cidadãos com mais de 70 anos" e o seu confinamento obrigatório, sem que para tal tenha havido qualquer sustentação legal.

É compreensível o desejo por parte das famílias de tudo fazer para proteger os seus pais, os seus avós e mesmo os seus vizinhos ou conhecidos.

O que é inadmissível é que a partir desta justa preocupação se pretenda a segregação dos idosos e a limitação dos seus direitos e liberdades.

É preciso contrariar concepções como as avançadas pela Presidente da Comissão Europeia, quando defendeu que os contactos dos idosos com outras pessoas teriam de ser limitados até ao final do ano.

Tal perspectiva não deve ser desligada da matriz de fundo dos que têm transformado o envelhecimento num “fardo social”.

Nesta Sessão dirigida aos reformados, pensionistas e idosos, o PCP reafirma que a prevenção e o combate ao surto epidémico para todos os cidadãos, designadamente para os que têm mais de 70 anos têm de ser acompanhados pela valorização do papel que tiveram enquanto trabalhadores, pelo valor da sua participação social, política e cultural nesta fase da sua vida e pelo contributo à sociedade da sua experiência e saberes.

Não desvalorizamos os riscos de contágio e dos cuidados adicionais para pessoas mais vulneráveis, idosos ou não, mas é preciso rejeitar o estigma sobre os idosos!

Não são os mais idosos que transportam o risco de contágio, entre si e aos restantes cidadãos. Ser idoso não é sinónimo de dependência, de falta de autonomia social ou de falta de capacidade a tomarem decisões informadas e responsáveis, seja no domínio da prevenção ao vírus, seja em todos os domínios da sua vida.

Alimentar tal estigma significaria alimentar o sentimento que estão a “pesar” à família e à sociedade; transformar a vida dos que vivem em lares num pesadelo; de reduzir o direito da grande maioria à liberdade e o direito de decidirem das suas vidas e agir na defesa dos seus direitos.

A complacência com tal caminho teria consequências bem nefastas para a sua saúde física e emocional.

Uma palavra aos idosos que vivem em lares. Tudo tem que ser feito para assegurar a especial protecção destes idosos e dos trabalhadores, mas igualmente no assegurar da qualidade dos serviços prestados, que garantam a sua segurança, o seu bem-estar e a realização de actividades que mitiguem as consequências do seu isolamento social e familiar.

Importa recordar que os reformados, pensionistas e idosos são um grupo social heterogéneo que envolve os cidadãos com mais de 65 anos, destacando-se de grosso modo «os jovens idosos», os idosos e muito idosos. A maioria tem expectativas, uma forte motivação para viver esta fase da sua vida, com prazer, com a possibilidade de realizar actividades que não puderam concretizar quando eram trabalhadores e uma forte apetência para formas associativas ligadas a actividades de convívio, recreativas, culturais ou desportivos.

A vida dos mais idosos não pode ficar suspensa perante o surto epidémico. O cumprimento das normas de segurança que a todos é devido e exigido não pode estar associado à perversa ideia de que nada vai ser como dantes, no presente e para o futuro.

É preciso que o medo não paralise a vida de cada um, que o medo de ser contagiado e de contagiar prive os mais idosos de relações afectivas e sociais gratificantes. Como não pode ficar suspenso um combate sem tréguas às desigualdades sociais e à pobreza entre idosos, bem como a necessidade de criar uma Rede Pública de Equipamentos e Serviços que responda às necessidades específicas da terceira idade, sem prejuízo do papel complementar, nem por isso menos valioso, das instituições particulares de solidariedade social.

Sem esquecer o necessário apoio às associações de reformados, pensionistas e idosos, enquanto importante expressão associativa deste grupo social, incluindo as suas actividades de apoio domiciliário, bem como ao seus centros de dia e de convívio para retomarem essas actividades quando estiverem criadas as condições para tal.

O actual contexto não pode secundarizar a resolução dos problemas que afectam a maioria dos reformados e pensionistas, bem como prosseguir avanços no combate aos baixos valores das reformas e às situações de pobreza, e na concretização do seu direito a uma pensão e a condições de vida dignas.

Valorizamos, por isso, a concretização neste mês de Maio, do aumento extraordinário das reformas que abrange um milhão e oitocentos mil reformados e pensionistas, que foi possível pelo quarto ano consecutivo pela determinação do PCP e pela luta dos reformados e das suas organizações específicas por melhores pensões e condições de vida dignas.

Por iniciativa do PCP alcançou-se em 2020 um aumento de 10 e 6 euros.

Vejamos dois exemplos, da importância deste aumento para pensões do regime previdencial:

Uma pensão de 450 euros, em Janeiro de 2020 teve um aumento de 3,15 euros. Em Maio terá um aumento de mais 6,85 euros totalizando assim os 10 euros.

A pensão social de velhice que em 2019 era de 210,32 euros teve em Janeiro de 2020 um aumento de 1,58 euros. Em Maio terá um aumento de 4,82 euros totalizando assim os 6 euros.

Este aumento extraordinário em 2020, somado aos de 2019, 2018 e 2017 significa que uma parcela significativa dos reformados, pensionistas e idosos tem, nestes 4 anos, um acréscimo no valor da sua pensão de 40 ou 24 euros mensais.

Estes aumentos extraordinários mitigam as consequências do congelamento das pensões, entre 2011 e 2015, impostas pelo governo PSD/CDS e dos insuficientes aumentos anuais que a mera aplicação do mecanismo de actualização das reformas defendida pelo PS concretizaria.

Eles só foram possíveis porque o PCP não desistiu. Mas estamos conscientes que este aumento extraordinário ficou aquém dos objectivos e da abrangência preconizada pela sua proposta: 10 euros para todas as pensões, a partir de Janeiro, cujo valor percentual era maior para as mais baixas e menor para as restantes assegurando a todas a reposição do seu poder de compra.

A prioridade à valorização das pensões exige a valorização dos salários e dos descontos para a segurança social, como elemento central para interromper a espiral de baixas reformas para as gerações de trabalhadores que passam à condição de reformados, mas igualmente impõe a alteração do injusto mecanismo de actualização das reformas, criado por um governo PS em 2006, e a criação de novos escalões de pensões mínimas do regime previdencial que valorize as mais longas carreiras contributivas.

O combate ao vírus não pode significar um direito a menos para os reformados, pensionistas e idosos. Continuaremos a lutar em defesa do papel central do Sistema Público de Segurança Social na garantia do direito à reforma e a uma pensão dignas, nem pactuaremos com as soluções da política de direita, assentes na fragilização do Sistema Público de Segurança Social facilitando a delapidação das receitas que são devidas ao regime previdencial, dando por adquirido que nada se pode fazer para impedir tal caminho.

Tudo faremos para assegurar os direitos de todos à saúde no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, bem como de outros serviços públicos. Porque todos eles são essenciais para garantir o direito a envelhecer com direitos e permitir viver mais anos com saúde e bem-estar.

O tão propagado envelhecimento activo, quando se trata de impor soluções da política de direita de prolongamento da actividade profissional dos mais velhos não pode ser associado a manter os idosos confinados e sem perspectiva, resignando-se a que tudo fique irremediavelmente pior.

É necessário dar confiança de que é preciso retomar com naturalidade as suas vidas, procedendo às adaptações necessárias a que a todos obriga dada a excepcionalidade do tempo que vivemos com respeito pelas suas liberdades e direitos.

Saúdo, por isso, a acção dos reformados, pensionistas e idosos e do seu movimento associativo específico e o seu papel na luta pela elevação das suas condições de vida e direitos e pela sua participação política, social, cultural e desportiva.

O surto epidémico confirma a necessidade de dar corpo a uma política alternativa, patriótica e de esquerda, que concretize uma estratégia nacional sobre as questões do envelhecimento assente em políticas que assumam o aprofundamento dos direitos dos reformados, pensionistas e idosos, que garantam que viver mais tempo signifique ter qualidade de vida, com autonomia económica e social, bem-estar físico e psicológico e prevenção e combate aos riscos de pobreza entre idosos e que promova uma adequada protecção na doença e na dependência.

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