Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

«A cedência à chantagem do patronato que exige contrapartidas para o aumento do salário mínimo é inaceitável»

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Sr. Presidente, Sr. Deputados,

A decisão tomada pelo Governo de oferecer a redução da TSU como moeda de troca ou contrapartida pelo aumento do Salário Mínimo Nacional deve hoje ser revogada pela Assembleia da República porque é uma medida errada e prejudicial aos trabalhadores e porque são o Governo e a Assembleia da República os órgãos com competência para tomar decisões em matéria laboral.

A decisão desta e de outras matérias da legislação laboral não é competência nem responsabilidade da concertação social, é competência do Governo e da Assembleia da República no uso dos seus poderes próprios que a Constituição prevê.

O aumento do salário mínimo nacional é uma exigência de dignidade e não deve ter contrapartidas para além do trabalho prestado por cada trabalhador.

O trabalho prestado por cada trabalhador é mais que suficiente para justificar muito mais que o salário mínimo. Mesmo que o aumento seja maior, a cada trabalhador continua a ser extraída uma parte do seu trabalho, que reverte para o capital. Nada justifica que para além disso ainda seja usado dinheiro do Orçamento de Estado. Ao mesmo tempo a redução da TSU significa a opção do governo por um estimulo à política dos baixos salários. Regista-se ainda que, fazendo depender a decisão sobre o SMN, bem como sobre outras matérias, da concertação social, o governo não só não está a cumprir as suas funções, como limita as competências da Assembleia da República e atribui uma espécie de direito de veto às confederações patronais.

São razões mais que suficientes para derrotar tal medida e por isso o PCP requereu a apreciação parlamentar do diploma do governo e propôs a cessão da sua vigência.

As linhas que se podem justificar de estimulo às micro pme como a redução e eliminação do PEC ou a baixa dos custos de energia entre outros têm a sua ponderação e justificação própria e não podem ser considerados como contrapartidas pelo aumento dos salários.

Sr. Presidente, Sr. Deputados,

No nosso país, praticamente um terço das pessoas em situação de pobreza são trabalhadores, cujo salário que recebem não chega para despesas básicas.
Não é novidade para ninguém: os baixos salários e em particular o valor do salário mínimo nacional é causa estrutural de pobreza.

O salário mínimo nacional é uma conquista da Revolução de Abril.

Acontece que ao longo das décadas tem sido profundamente desvalorizado. Entre 2011 e 2014 esteve congelado. Últimos dados disponíveis apontam para mais de 648 mil trabalhadores a sobreviver com o salário mínimo nacional. E se tivesse sido actualizado, considerando a inflação e o aumento da produtividade, rondaria hoje os 1200 euros por mês. Valorizamos o aumento do salário mínimo para 557 euros mas é claramente insuficiente.

Não permite a recuperação do poder de compra e o combate à pobreza. Portugal mantém um dos mais baixos salários mínimos nacionais da Europa, mesmo tendo em conta a retribuição a 14 meses, e corre o risco de se atrasar ainda mais nomeadamente em relação a Espanha.

Sr. Presidente, Sr. Deputados,

A redução da TSU cuja revogação o PCP propõe, expressa um reiterado e flagrante exemplo de incentivo à política de baixos salários, oferecendo uma redução da TSU como moeda de troca pelo aumento do Salário Mínimo.

A redução da TSU representa um incentivo à contratação de trabalhadores com salário mínimo, como o comprova o aumento do número de trabalhadores que auferes este salário e contribui para a estagnação ou absorção das restantes grelhas salariais, nomeadamente as previstas em contratação colectiva.

Reduzir as contribuições das empresas para a Segurança Social quando contratam trabalhadores a quem pagam o salário mínimo, representa um incentivo declarado à prática de baixos salários.

A redução da TSU representa uma forma de financiamento às empresas, desresponsabilizando-as de cumprir uma obrigação exclusiva que é o pagamento dos salários dos trabalhadores ao seu serviço, transferindo e colocando essa responsabilidade às costas do OE e do OE da SS.

A actualização do salário mínimo é um direito fundamental e tarefa do Estado. O âmbito de aplicação desta medida vem sendo sucessivamente alargado desde 2014. Continuam a ser abrangidos todos os tipos de contrato de trabalho, desde que celebrados antes dessa data.

A redução aplica-se agora às empresas cujos trabalhadores, entre os meses de outubro e dezembro de 2016 tenham auferido uma remuneração base média mensal situada entre os 530 e 557 euros. A redução é ainda alargada às empresas em que os trabalhadores aufiram valores salariais até 700 euros, desde que a diferença para a retribuição base resulte da prestação de trabalho suplementar e/ou nocturno. Importa ainda dizer que esta redução da TSU abrange todas as empresas independentemente da sua dimensão e sector de actividade, incluindo as empresas de trabalho temporário.

Sr. Presidente, Sr. Deputados,

A cedência à chantagem do patronato que exige contrapartidas para o aumento do salário mínimo é inaceitável.

Nem sequer encontra qualquer justificação económica na medida em que as remunerações têm um peso de apenas 18% na estrutura de custos das empresas, muito inferior a outros custos com energia, combustíveis, telecomunicações, crédito ou seguros.

Ao mesmo tempo é precisamente para garantir uma mais justa distribuição da riqueza, combater a pobreza e dinamizar a economia que o aumento para 600€ o salário mínimo nacional é tão importante.

O aumento do salário mínimo nacional é uma exigência nacional por razões de justiça social, de uma mais justa distribuição da riqueza, mas também por razões económicas, pelo aumento do poder de compra, na dinamização da economia e do mercado interno, pelo reforço do financiamento da segurança social.

Hoje o oportunismo do PSD pode ter, por coincidência, um efeito positivo na vida dos trabalhadores, mas isso não apaga o facto da verdadeira motivação do PSD ser contra o aumento do salário mínimo nacional.

Mas isso é incoerência que o PSD terá que resolver.

Da parte do PCP estamos onde estivemos e onde queremos estar, com os trabalhadores, pela valorização dos salários, pela melhoria das condições de vida, por uma mais justo e soberano.

Disse.

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