Declaração de Octávio Teixeira, Membro da Comissão Política do Comité Central e Presidente do Grupo Parlamentar, Conferência de Imprensa

Balanço de Actividade do Grupo Parlamentar

Caras amigas e amigos,
Senhoras e senhores jornalistas,
Camaradas

1 - Com o termo da VII Legislatura da Assembleia da República, é tempo de o Grupo Parlamentar do PCP fazer o balanço da sua actividade e de os Deputados comunistas publicamente prestarem contas da sua intervenção e acção políticas.

Esta "apresentação de contas" é devida aos portugueses, e em particular aos eleitores que em 1995 em nós confiaram a sua representação parlamentar.

Recorde-se que esta Legislatura correspondeu a uma composição política da Assembleia da República totalmente diferente da que se registou nos 10 anos anteriores. Desapareceu a maioria absoluta do PSD e o Partido Socialista passou a deter a maioria relativa dos Deputados.

Neste quadro, o PS e o eng. Guterres fizeram as suas opções políticas estruturantes da Legislatura:

- decidiram a constituição de um Governo sem apoio maioritário na Assembleia da República;

- afastaram expressamente qualquer hipótese de entendimentos preferenciais à esquerda;

- apresentaram um Programa de Governo que deixou caídas no esquecimento muitas das promessas eleitorais do PS e que, em aspectos políticos centrais, se orientou abertamente pelo abraçar de orientações neoliberais, de políticas de direita (designadamente, nos planos económico, da construção europeia, das privatizações, das relações com os grupos económicos e dos direitos laborais).

Assim, desde o início da Legislatura e com toda a lógica e naturalidade, o PCP apresentou-se como oposição ao Governo. Como a oposição de esquerda, clara e frontal. Mas igualmente como oposição responsável.

Propondo-nos, em primeiro lugar, apresentar, defender e fazer aprovar as nossas próprias propostas, consequentes com o projecto de esquerda do PCP. E, em segundo lugar, afirmando e garantindo que potenciaríamos e viabilizaríamos as propostas do Governo que, numa perspectiva progressista, fossem positivas para o País e para os portugueses.

2 - Durante estes quatro anos, mantivemos esta atitude de seriedade e de responsabilidade para com os portugueses e os eleitores da CDU. Mesmo quando o PS e o Governo, com um certo ar provocatório, tudo fizeram para empurrar o PCP para uma postura de oposição sistemática, de oposição pela oposição.

Por exemplo, quando o PS inviabilizou projectos de lei do PCP, apesar da sua similitude essencial com propostas do Governo, com o objectivo de levar ao debate na especialidade e à votação final apenas as propostas do Governo ou, se o PCP respondesse com a mesma atitude egoísta e estulta, poder utilizar esse "capital de queixa" para acusar o PCP de inviabilizar medidas progressistas. Como sucedeu, por exemplo, com o Rendimento Mínimo Garantido e com o nosso projecto de IVG.

Quando o PS e o Governo inviabilizaram o projecto de lei do PCP de redução do horário semanal de trabalho para as 40 horas, e aprovaram, com o apoio da direita, uma lei que visava ludibriar essa redução com a não contagem dos períodos para pausas.

Ou quando no início da legislatura o Governo elegeu, numa suíte de hotel, como seu aliado preferencial e permanente, como sua muleta para governar à direita, o CDS-PP de Manuel Monteiro, a extrema direita parlamentar.

Ou, ainda, quando o PS e o Governo se aliaram expressamente ao PSD para inviabilizar um referendo sobre a moeda única, ou para levar a cabo uma revisão constitucional decidida pelas chefias do PS e do PSD à margem da Assembleia da República. Acordo de revisão espúrio, em que o PS cedeu em toda a linha ao PSD e que, entre outros aspectos , abriu as portas à subversão do princípio da representação proporcional para as eleições legislativas e impediu a concretização da Regionalização administrativa do País.

E continuámos a manter essa atitude de responsabilidade nas semanas mais recentes, quando o PS e o Governo, mais uma vez em estreita comunhão de orientações políticas com a direita, impôs a aprovação de três dos diplomas mais negativos do novo "pacote laboral", em particular o do trabalho a tempo parcial.

Em suma, durante a Legislatura foram muitas as situações de grande conflitualidade e confrontação políticas do PS e do Governo com o PCP.

Mas a serenidade com que mantivemos a firmeza das nossas posições e da nossa orientação responsável, nunca deu ao PS e ao Governo aquilo que desejavam: o pretexto de usarem uma eventual oposição sistemática do PCP para justificarem as suas alianças à direita.

Não o tendo conseguido, ficou claro que as opções à direita de políticas governamentais e de escolha de aliados preferenciais pelo eng. Guterres, decorreram única e exclusivamente da sua vontade política!

Ao fim de quatro anos, podemos afirmar que foi correcto o termos traçado aquela orientação e a termos sabido manter, apesar do PS e do seu Governo, até ao último dia da Legislatura.

Do mesmo modo que foi adequado o termos recusado participar no debate parlamentar marcado pelo espalhafato verbal, pelo artificialismo e pela mera chicana política. Que outros partidos privilegiaram e, paradigmaticamente, se prolongou até aos derradeiros minutos da última sessão plenária da Legislatura ...

Com seriedade, em respeito pelos cidadãos eleitores, marcámos a diferença fazendo incidir a nossa intervenção sobre os problemas e as preocupações da maioria dos portugueses. Ainda que isso nos pudesse fazer perder "tempo de antena" nos órgãos de comunicação social ...

3 - Foi neste quadro global que se desenvolveu a actividade do Grupo Parlamentar do PCP nesta legislatura, e cujo balanço se me impõe sintetizar.

Os Deputados do PCP foram na Assembleia da República, com frontalidade, a oposição de esquerda ao Governo do PS e à sua política.

Combatemos os aspectos mais salientes da política neoliberal do Governo, fiscalizámos a actividade governativa, denunciámos as múltiplas convergências e entendimentos do PS e do seu Governo com o PSD e com o CDS-PP.

Mas, para além disso, o Grupo Parlamentar do PCP fez aprovar Leis e Resoluções, apontou políticas alternativas, propôs soluções para problemas reais, defendeu os direitos de quem trabalha e produz, deu voz à defesa dos interesses nacionais e a importantes sectores da sociedade, combateu a desigualdade social.

Em termos quantitativos, e com apenas 13 deputados (5,7% do total), os comunistas foram responsáveis por cerca de 27 % do total das iniciativas parlamentares e por 32 % dos projectos de lei apresentados.

Para além disso, os projectos de lei originários do PCP representam cerca de 29 % dos projectos dos Grupos Parlamentares aprovados na legislatura, o número mais elevado entre todos os Partidos.

Não, certamente, pelos nossos lindos olhos.

Mas por duas razões fundamentais:

- a primeira, o incontornável valor político e social intrínseco às nossas propostas,

- a segunda, o facto, extremamente positivo para os portugueses, de nesta legislatura não existir uma maioria absoluta de suporte ao Governo, capaz de funcionar como rolo compressor de todas as iniciativas das oposições, em particular das iniciativas do PCP.

Não é adequado dar-vos agora conta de todas as iniciativas apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PCP.

Mas permitam que vos recorde alguns exemplos das que foram aprovadas nesta legislatura.

Assim, no âmbito da área laboral, a lei que "garante o direito à igualdade de tratamento no trabalho e no emprego", a que instituiu o "regime jurídico do trabalho a bordo das embarcações de pesca", a que reforça os "direitos dos trabalhadores-estudantes" e a que "proíbe a discriminação dos jovens na fixação do salário mínimo" ou, ainda, a que "aumentou as coimas por violação da legislação do trabalho".

No que concerne à toxicodependência, as que criaram "uma rede de serviços públicos para o tratamento e a reinserção dos toxicodependentes", e a que "assegura o financiamento público de projectos de investimento respeitantes a equipamentos destinados à prevenção secundária da toxicodependência". No plano do que poderíamos designar dos direitos à liberdade e à igualdade, lembro a lei que institui o "direito a uma licença especial nos casos de gravidez de risco", a que garante "os alimentos devidos a menores", a do agravamento das "penas para os crimes sexuais, nomeadamente de que são vítimas os menores", a que garante o "reforço do direito à saúde reprodutiva", impondo, em particular, a implementação nas nossas escolas de um programa pluridisciplinar de educação sexual e a criação de consultas de planeamento familiar nos locais de trabalho em que existem serviços de saúde.

Mas também a lei que estabelece um "programa especial de acesso aos cuidados de saúde", a que "previne a prática de discriminação no exercício dos direitos por motivos baseados na raça, cor, nacionalidade ou origem étnica", a que cria os "conselhos municipais de segurança dos cidadãos", ou ainda a "lei de bases do desenvolvimento florestal" e as relativas ao "reforço das competências e meios das freguesias", à "criação de empresas públicas municipais" e ao "regime jurídico das associações de municípios". Tal como é indispensável realçar as propostas do PCP relativas ao IRS, e aprovadas no OE para 1999, que conduziram, como é possível comprovar com as novas tabelas de retenção na fonte, à isenção de imposto para cerca de 700 mil famílias e a que cerca de 2 milhões de famílias passassem a ser tributadas a taxas inferiores às que suportavam.

Não tenho dúvidas em afirmar que estas alterações ao IRS foram, na perspectiva da justiça fiscal, a grande medida tomada durante toda a Legislatura!

Mas houve, infelizmente para os portugueses, propostas do PCP que foram recusadas por responsabilidade primeira do PS, em convergência com o PSD e/ou CDS-PP. Neste âmbito, entre muitas outras, realço as relativas à interrupção voluntária da gravidez, a que repunha a idade de reforma das mulheres nos 62 anos, a que reforçava a proibição da vigilância dos trabalhadores nos locais de trabalho por meios mecânicos e electrónicos, a que determinava uma aumento extraordinário de todas as pensões de reforma e de aposentação mais degradadas, as relativas ao ensino superior, ......

Aliás, contando-se por muitos os aspectos negativos da acção parlamentar do PS e do Governo, um deles marcará indelevelmente esta Legislatura: o deplorável, escandaloso e grave episódio das cambalhotas políticas, da falta de palavra e de coerência do Grupo Parlamentar do PS e do Primeiro-Ministro em torno da lei da interrupção voluntária da gravidez que chegou a ser aprovada pelo Parlamento.

Mas a despenalização da IVG é um problema incontornável da sociedade portuguesa. Por isso, e mais cedo que tarde, ele terá necessariamente a solução adequada. Por gestão do tempo adequado para esta intervenção, permito-me remeter outros aspectos da nossa actividade parlamentar, no âmbito das Resoluções, das Interpelações ao Governo, das Comissões de Inquérito, das Audições e dos Colóquios que promovemos, para o documento que já vos foi entregue ou que está à vossa disposição.

4 - Em suma conclusiva, quero afirmar-vos que ao apresentarem o balanço da sua actividade nesta legislatura (coisa que, aliás, os restantes partidos parecem não sentir o dever de fazer), os Deputados comunistas, diferentemente de outros, se apresentam com a consciência tranquila de terem honrado os compromissos assumidos perante os cidadãos eleitores.

Demos voz no Parlamento aos que trabalham, aos reformados, aos estudantes, às mulheres, às causas e lutas sociais. E não esquecemos o dever de irmos ao encontro dos eleitores, em mais de 200 visitas que realizámos e em cerca de 700 audiências que concedemos.

Defendemos a necessidade de reformas estruturais, e apresentámos orientações e propostas com esse objectivo, designadamente no âmbito do Sistema Fiscal, da Saúde, da Justiça e da Segurança Social.

Nenhuma reforma estrutural, com marca de progresso e de justiça sociais, ficou por realizar por carência de maioria parlamentar para a aprovar.

Não se concretizaram, apenas porque o PS e o Governo não quiseram, por não terem essa vontade política e por temerem ferir interesses ilegítimos instalados.

Denunciámos e combatemos o clientelismo partidário, os "jobs for the boys", os fumos de corrupção, a impunidade dos crimes de "colarinho branco".

Não regateámos o nosso contributo na defesa dos interesses do País e dos trabalhadores, e combatemos as desigualdades sociais.

Fomos firmes na oposição às políticas e medidas de direita e aos múltiplos entendimentos e convergências do PS e do Governo com os partidos da direita e às relações promíscuas entre o poder político e o poder económico.

Demos corpo na Assembleia da República à afirmação do projecto político do PCP, um projecto de esquerda, assente na garantia dos direitos e liberdades, no desenvolvimento económico e social, na dignificação e valorização do trabalho e do emprego com direitos, na justa repartição do rendimento, na preservação e melhoria do ambiente, na efectiva subordinação do poder económico ao poder político e na defesa da soberania e da independência nacionais.

Serão estes, sem margem para quaisquer dúvidas, os caminhos que o futuro Grupo Parlamentar do PCP continuará a trilhar.

Com a garantia de que com mais Deputados na próxima Assembleia da República, o PCP poderá contribuir mais e melhor para dar resposta aos problemas e aspirações da maioria dos portugueses, para mais decisivamente influir na concretização de medidas e de políticas de esquerda em Portugal.

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