Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, IV Assembleia da Organização Regional de Bragança do PCP

Assembleia da Organização Regional de Bragança

Assembleia da Organização Regional de Bragança

A todos os delegados e convidados presentes na VI Assembleia da Organização Regional de Bragança do PCP apresento as mais calorosas saudações.

Acabamos de tomar importantes decisões para o desenvolvimento do nosso trabalho em defesa dos trabalhadores e do povo, e sobre o melhoramento do funcionamento e reforço do nosso Partido.

Sabemos das muitas dificuldades que enfrentamos para levar a bom porto a nossa tarefa de contribuir para o melhoramento das condições de vida das populações, mas a luta pela superação das dificuldades é o sal da nossa militância e é ela que torna ainda mais nobre a tarefa de servir o nosso povo e a sua luta.

Não ignoramos as carências com que os comunistas lutam nesta vasta região e, simultaneamente, a determinação com que enfrentam todas as dificuldades.

É grande o apreço que o nosso Partido tem pelo vosso trabalho realizado em condições muito difíceis.

Acabámos de sair de uma importante batalha eleitoral que, pensamos, abre boas perspectivas e dá confiança ao desenvolvimento do combate que travamos por uma alternativa e pela derrota do actual governo de Passos e Portas.

Os resultados eleitorais confirmam um importante êxito da CDU com a eleição de três deputados e uma clamorosa derrota sofrida por PSD e CDS-PP e o seu governo.

Eleições que traduzem igualmente um revés para o conjunto dos partidos das troika e para a sua política que os portugueses claramente recusam.

Resultados que revelam que há no País um generalizado sentimento de repulsa em relação aos responsáveis pela introdução da troika no País e confirmam que este governo de ruína e desastre nacional está cada vez mais isolado política e socialmente.

Um governo que perdeu há muito a sua legitimidade política, pela ruptura com os seus compromissos eleitorais, pelo seu profundo isolamento e, particularmente, por uma prática governativa em reiterado confronto com a Constituição da República Portuguesa, acrescenta-se agora a ilegitimidade democrática que resulta da drástica diminuição da sua base eleitoral.

Uma erosão substancial da sua base de apoio que justifica ainda mais a exigência da sua demissão e da convocação de eleições antecipadas.

Uma exigência que assume uma maior premência quando vemos que o País continua o rumo de ruína e empobrecimento nacional com a permanência do PSD/CDS à frente do governo e em permanente confronto com a Constituição.

Se restasse alguma dúvida de que o Governo PSD/CDS governa e pretende governar contra a Constituição e contra as regras mais elementares do Estado de Direito, o que se passou nos últimos dias dissiparia qualquer réstia de dúvida.

Pela terceira vez consecutiva, o Tribunal Constitucional declarou inconstitucionais normas do Orçamento do Estado. Desde que o atual Governo assumiu funções, são já oito, os diplomas com normas declaradas inconstitucionais.

Desagradado com as mais recentes decisões do Tribunal Constitucional, que mais não fez do que exercer com independência as funções para que foi criado, o Governo, os Deputados e os comentadores ao seu serviço, desencadearam uma tempestade de ataques aos juízes, que chegou ao desaforo quando uma vice-presidente do PSD avançou com a ideia de haver “sanções jurídicas” para os juízes que ousem decidir contra a vontade do Governo.

Mas essa declaração não foi um acto isolado. É que o Primeiro-Ministro e líder do PSD, Passos Coelho, não só não a desautorizou, como seria seu dever, como veio elogiar essas declarações, ao mesmo tempo que o Governo instrumentalizava a Assembleia da República com a trapalhada de pedir uma aclaração de uma decisão do Tribunal Constitucional que era, e é, claríssima, para qualquer pessoa que esteja de boa-fé.

O que o Tribunal Constitucional decidiu, e tem de ser cumprido, é que os cortes salariais são inconstitucionais e que os trabalhadores da Administração Pública têm de receber os salários e os subsídios a que têm direito, sem os cortes impostos pelo Governo.

Mas o Governo não está de boa-fé. E mais uma vez vem inventar uma absurda e inaceitável interpretação para roubar a parte já cortada até Maio a quem recebeu em duodécimos o subsídio de Natal.

Este Governo não é um Governo de bem. Ofende a Constituição, ofende quem tem o dever de garantir o cumprimento da Constituição, ofende princípios elementares do Estado de Direito democrático e ofende os portugueses, tudo fazendo para lhes cortar salários e liquidar direitos.

Nós acompanhamos com muita preocupação toda a evolução da situação nacional e as consequências resultantes de uma política que se afirma, cada vez mais, como uma política de submissão ao estrangeiro e aos grandes interesses económicos nacionais e internacionais.

Já sabemos o resultado destes três últimos anos fatídicos de concretização do Pacto de Agressão, que PS, PSD e CDS assinaram com a troika do FMI, União Europeia & Companhia, e que se traduziu num desemprego brutal, na destruição de milhares de empresas, no empobrecimento crescente e generalizado das populações com o ataque que se promoveu aos rendimentos, nomeadamente aos rendimentos dos trabalhadores, dos reformados, dos pequenos empresários e agricultores, mas também em resultado do aumento dos impostos, na degradação dos serviços públicos que deveriam garantir o direito de todos à saúde, à educação e à protecção social das populações.

Hoje, por causa desta política de ruína nacional temos um substancial alargamento do número de portugueses a viver abaixo do limiar da pobreza, quase um quarto da população, e temos milhares e milhares de portugueses empurrados para a emigração forçada.

Mais de 250 mil portugueses emigrantes nos últimos dois anos, esvaziando cada vez mais o País, porque cá não encontram uma saída para as suas vidas!

Enormes sacrifícios para o povo sem que isso significasse qualquer melhoria significativa dos problemas do País.

Tudo feito para manter privilégios dos grandes senhores do dinheiro e dos grandes grupos económicos.

Com a aproximação da data da saída da troika, que afinal não sai tão cedo como vamos vendo, disseram que tudo ia ser diferente, que a recuperação estava a caminho e quase juravam que a política de austeridade e os sacrifícios estavam a chegar ao fim.

Falavam em saída limpa da troika, sem mais dependências e submissões e com Portugal a governar livremente.

É tudo uma grande farsa!

Passam por cima e escamoteiam a existência dos compromissos que mantêm e visam manter o País amarrado a uma situação de dependência da troika e às mesmas políticas de desastre destes últimos anos, tal como omitem a verdadeira dimensão do condicionamento das políticas do País por outros instrumentos de dominação da União Europeia, designadamente por via do Tratado Orçamental que PSD, CDS e PS aprovaram.

Na verdade, nem Portugal com a saída da troika ficou liberto das imposições estrangeiras, que vão permanecer enquanto não houver uma ruptura com esta política de direita e este governo, nem a saída que anunciaram é limpa e sem mais sacrifícios para o povo.

Também é pura propaganda a ideia de que o País está a recuperar e vai no bom caminho.

Primeiro, não há qualquer viragem na situação económica e social do País, como se vê não apenas na vida real dos portugueses – uma vida cada vez mais difícil – mas também pelos mais recentes dados da situação do País.

Por um lado, o País continua a afundar-se sob o peso de uma dívida insustentável que impede o desenvolvimento e crescimento económicos, com um novo salto para mais de 130% do PIB da dívida portuguesa. Novo máximo histórico!

Por outro, e não menos preocupante, o regresso a novas quebras da economia para níveis negativos neste primeiro trimestre de 2014. A tendência é para a estagnação, com as exportações de que tanto falam a cair, o mesmo em relação ao investimento.

Vêm com o argumento da baixa do desemprego mas, a saírem do País 350 portugueses por dia como está a acontecer, até podem chegar à taxa zero de desemprego, mas não temos País, nem gente.

Em segundo lugar, a saída limpa é a maior mentira das mentiras deste governo.

A verdade irrefutável é que o governo se prepara, com a cumplicidade do PS, para prosseguir e perpetuar a mesma política de empobrecimento que tem sido seguida até hoje, e que impede o desenvolvimento soberano de Portugal.

O que têm em preparação, e pretendem, é um vasto programa de novas medidas de austeridade e sacrifício para o povo nos próximos anos.

Isso confirmou-o há dias o próprio Banco de Portugal. Veio dizer que até 2019, para cumprir os objectivos do Pacto Orçamental e consolidar a dívida, são necessárias novas medidas de austeridade de quase 7 mil milhões de euros!

É este o preço a pagar nos próximos cinco anos pelos compromissos assumidos pelos partidos da troika.

Uma enormidade, depois das medidas dos últimos anos!

É isso que espera os portugueses a manter-se este governo e esta política – o empobrecimento do povo e do País.

É isto que já se percebia quando o governo apresentou o Documento de Estratégia Orçamental 2014-2018 e o seu Guião para a Reforma do Estado.

Aliás, é ver que medidas o governo está a tomar e contra quem são dirigidas para se ver que o massacre contra o povo vai continuar.

Este governo não tem outra política que não seja a dos cortes nos salários, o aumento de impostos de quem trabalha, a desvalorização do valor das reformas, agora com a transformação da CES num imposto permanente e, no futuro, com a alteração do sistema de pensões que têm em preparação.

Cortes nos rendimentos das camadas populares e, ao mesmo tempo, esvaziamento das funções sociais do Estado e destruição dos serviços públicos – saúde, educação, tribunais etc. que está também a contribuir para aumentar os problemas das zonas do interior do País com o aumento da desertificação humana, de abandono e declínio social, de estagnação e declínio das actividades económicas e que fazem com que as regiões mais pobres do País fiquem ainda mais pobres.

Afundam as regiões mais carenciadas em vez de tomarem medidas de revitalização das suas economias debilitadas que só podem ser asseguradas com mais investimento público e comunitário, dirigido à criação de infraestruturas de desenvolvimento e ao apoio aos seus sectores produtivos.

Uma política que, matando o mercado interno, tem como consequência o estrangulamento da actividade dos pequenos empresários e dos pequenos e médios agricultores.

Na verdade, se há elemento que caracteriza este Governo é o seu apego pelos grandes e pelos poderosos e o ataque às condições de vida de todas as camadas populares.

Não faltam apoios para a banca e para o grande capital, enquanto espezinham os direitos de quem trabalha e contribuem para o definhamento de todas as outras camadas da população. Não falta atenção e desvelo para com os senhores do grande agro-negócio, enquanto desprezam a pequena e média agricultura.

Tomemos o distrito de Bragança como exemplo. Terra de boa produção. De castanha, desde logo, mas também de batata, de cereais, de fruta, e de carne, seja ovinos, caprinos ou bovinos. E também de azeite, de reconhecida qualidade.

Terra de grandes potencialidades. Basta olhar para o Vale da Vilariça. Ali se produzem das melhores frutas do País. Mas os pequenos produtores continuam, como se afirma na nossa resolução, dependentes das cadeias de distribuição, que esmagam os preços à produção, enquanto os custos dos factores de produção – sementes, adubos, combustíveis, fertilizantes – aumentam a cada dia que passa.

Mas não é apenas o Vale da Vilariça. Entretanto, fruto da política de abandono do interior, particularmente grave para o Distrito de Bragança, os pequenos agricultores foram forçados a demandar em busca do emprego, do sustento que aqui não encontram, dos serviços públicos que aqui foram encerrados, dos transportes públicos que aqui já não circulam.

E aos que resistem, maioritariamente idosos, que persistem em fazer a sua agricultura, e que precisavam de ver garantido o escoamento a preços justos, o Governo, só tem para apresentar mais cortes nos apoios sociais, mais exigências fiscais, mais impostos e contribuições.

Pela nossa parte, não nos cansaremos de denunciar que a única medida para os pequenos agricultores que, nestes três anos de Governo PSD/CDS, foi a obrigatoriedade de todos eles, sem excepção, se inscreverem nas finanças.

Como se compreende que o mesmo governo que fecha os olhos às práticas mais brutais de comércio por parte da grande distribuição, venha exigir a quem vende o que lhe sobra do seu consumo, complementando com esse parco rendimento as magras reformas de uma vida inteira de trabalho?

Como se pode querer obrigar quem vende umas alfaces, uns ovos, uma galinha a passar uma factura? E como se pode entender que, por se colectarem nas finanças, os pequenos agricultores sejam obrigados a novos pagamentos para a Segurança Social e vejam cortados subsídios de gasóleo, complementos solidários para idosos e outras prestações sociais? Não é por acaso que, nos últimos dois anos, houve cerca de 30 mil candidaturas a menos ao regime de pagamento único.

Agora no quadro da implementação da Nova Reforma da PAC, quais as medidas para os pequenos produtores?

O Governo decidiu, em primeiro lugar não majorar os apoios aos primeiros 13 hectares, o que beneficiaria esta região de pequena e muito pequena dimensão fundiária. Não contente, decidiu agora aumentar a área mínima de 0,3 hectares para se poder aceder aos apoios comunitários, para 0,5ha. A questão que se põe é a seguinte: quantos agricultores é que serão assim afastados do acesso aos apoios.

Agora, na ânsia de destruir ainda mais, avança com a extinção da Casa do Douro, deixando os cerca de 35 mil pequenos vitivinicultores desprotegidos face às grandes casas exportadoras que hoje dominam todo o mercado, e com alterações à lei dos baldios espoliando os milhares de compartes dos seus ancestrais direitos, com vista à sua entrega às autarquias e a privados.

Nós estamos a falar de um sector muito importante da agricultura nacional. As explorações com pequena e muito pequena dimensão económica são 91% do total e detêm a maioria do volume de trabalho – 78%.

E é por isso que é exigível uma política agrícola que não veja apenas os grandes interesses do grande agro-negócio. Uma política que tenha em conta as especificidades da agricultura nacional e, particularmente, a agricultura de montanha que aqui se pratica, e que tenha como eixos centrais a garantia de escoamento a preços justos e o apoio à pequena e média agricultura, que mantém o mundo rural vivo!

Este governo está a mostrar que o único propósito que preside à sua governação é o prosseguimento do caminho de empobrecimento que tem vindo a ser concretizado até aqui.

Hoje, mais do que nunca é a permanência do actual governo e o prosseguimento da sua política de submissão que põe em causa o futuro do País.

Mais do que nunca é preciso mudar de política e não apenas de caras!

Portugal não está condenado à ruína e à dependência. É possível assegurar com outra política a soberania e a independência do País e o seu desenvolvimento. É possível concretizar uma política capaz de assegurar a elevação das condições de vida do nosso povo.

Uma outra política que exige a ruptura com a política de direita em Portugal e com os eixos fundamentais do processo de integração capitalista europeu.

Uma ruptura que urge e que se impõe como um imperativo e uma condição para abrir o caminho à construção de uma verdadeira política, patriótica e de esquerda que o País precisa.

Uma política que, afirmando os interesses do povo e do País e a decisão soberana do povo português, se baseie em seis opções fundamentais nas quais se incluem: - a renegociação da dívida que se torna cada vez mais uma necessidade para relançar a economia do País; a defesa e o aumento da produção nacional; a valorização dos rendimentos das populações, nomeadamente dos trabalhadores e dos reformados; a defesa e recuperação dos serviços públicos, em particular nas funções sociais do Estado; uma política orçamental de combate ao despesismo, à despesa sumptuária, baseada numa componente fiscal de aumento da tributação dos dividendos e lucros do grande capital e de alívio dos trabalhadores e das pequenas e médias empresas; uma política de afirmação do primado dos interesses nacionais nas relações com a União Europeia.

Uma política patriótica e de esquerda que retome os valores de Abril e dê cumprimento ao projecto de progresso e justiça social que a Constituição da República Portuguesa consagra!

Vivemos tempos de duros combates. São grandes e exigentes as tarefas que a actual situação coloca ao PCP.

A este Partido necessário e indispensável para mudar o rumo do País. Partido necessário e indispensável que se impõe reforçar, porque do seu reforço não só dependerá a garantia da defesa dos interesses dos trabalhadores e dos interesses populares, mas o êxito da tarefa da construção em Portugal de uma alternativa política e de uma política ao serviço dos trabalhadores do povo e do País.

Num momento tão difícil na vida do nosso povo, esse reforço a todos os níveis, é vital para conduzir a luta que se impõe em todas as frentes.

Nesta Assembleia esteve bem presente essa importância e necessidade de melhorar a nossa organização e reforçar a nossa capacidade de intervenção.

A importância e necessidade de avançar mais no plano da responsabilização e assunção de responsabilidades por mais quadros, mas igualmente no recrutamento de novos militantes.

A importância e necessidade de dar mais força e atenção à dinamização das organizações de base, à ligação aos trabalhadores e ao povo, aos seus problemas e aspirações.

A importância de ter um Partido mais activo e mais forte, preparado para as grandes tarefas que se lhe colocam e que, sabe a organização partidária, é a chave para o reforço da nossa intervenção e da nossa influência social e política.

Somos um Partido independente, com a sua natureza de classe, o partido da classe operária e de todos os trabalhadores. Um partido portador de um projecto de futuro. Um partido portador das soluções alternativas para o País.

Sabemos das dificuldades e das exigências que se colocam ao nosso Partido e a cada um de nós!

Mas nós temos confiança. Confiança neste Partido Comunista Português, no seu colectivo militante e nas nossas próprias forças e nas possibilidades e potencialidades que se podem abrir com a luta dos trabalhadores e do nosso povo.

Confiança num Partido que não desiste de cumprir o seu papel para com os trabalhadores o povo e o País.