Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP
na Audição do PCP sobre a política necessária ao desenvolvimento económico e social do país
Lisboa, 12 de Janeiro de 2005

Estimados convidados,
Senhores Jornalistas,

A Audição que aqui decorre sobre “ A política necessária ao desenvolvimento económico e social do país”, está integrada na preparação do programa eleitoral do PCP e que visa auscultar e recolher contributos de um leque variado de especialistas e personalidades com grande experiência e conhecimento nos mais relevantes domínios da vida nacional.

Trata-se de uma audição cujos principais pólos em apreciação são as questões da política económica, nomeadamente os problemas e constrangimentos que o Pacto de Estabilidade coloca à economia portuguesa e as soluções alternativas, mas igualmente outras matérias ligadas à elaboração de uma estratégia de desenvolvimento para o país.

Nesta audição a contribuição que solicitámos ao conjunto das personalidades que aqui connosco debatem um projecto de desenvolvimento para o país, estão particularmente dirigidas a aspectos do desenvolvimento económico sustentado, no qual se inserem matérias ambientais e de recursos naturais, as questões da distribuição da riqueza, a política fiscal, dos serviços públicos de qualidade e da educação, formação e ciência.

Trata-se, portanto, de uma reunião de trabalho muito útil para nós e das intervenções, que já tive oportunidade de escutar, avançam com caracterizações e propostas que vêm ao encontro e enriquecem o trabalho de elaboração do nosso programa eleitoral, também já muito adiantado, que será apresentado ao país na próxima semana.

Em relação à evolução da situação económica e às perspectivas que se apresentam para o futuro, confirma-se o que afirmámos ainda recentemente no debate do Orçamento, isto é, que as metas previstas pelo Governo, quer em relação ao aumento do PIB, do emprego e da inflação são irrealistas visando apenas objectivos políticos.

Uma política que levou Portugal ao afastamento da média europeia no desenvolvimento e à degradação do nível e qualidade de vida de milhares e milhares de famílias.

Este é o resultado de uma política cega de travagem do défice que criou as condições objectivas para a quebra do investimento privado, a retracção da procura e o pessimismo.

Uma política que tem acentuado um modelo de desenvolvimento assente nos baixos salários e nas baixas qualificações, quando a produtividade do aparelho produtivo e a competitividade da economia portuguesa exigem precisamente o contrário.

Nós pensamos que é preciso inverter este caminho. O nosso programa desenvolverá o que consideramos dever ser uma politica alternativa para Portugal assente em cinco grandes eixos estratégicos.

Temos afirmado e muitas das intervenções aqui o confirmam que o problema do país não é o problema do défice público. É um problema. Não é o problema. O problema do país é sobretudo do aparelho produtivo e não orçamental. São os problemas que resultam de uma economia cada vez mais subcontratada, dependente e apendicular e que vem alienando os seus principais centros de decisão e, crescentemente, a substituição da produção nacional pela estrangeira.

Nós precisamos de uma política que defenda a produção nacional e que, recusando a continuação da privatização e liberalização de serviços, assegure a preservação pública de alavancas fundamentais da economia e serviços públicos de qualidade, e garanta a manutenção de centros de decisão e de soberania económica nacionais.

Uma política que promova um crescimento económico acelerado e sustentado, liberto de submissão ao Pacto de Estabilidade e outras imposições externas, na base de um tecido económico de perfil produtivo valorizado, regionalmente equilibrado, e fazendo um uso racional da energia e dos recursos naturais. Canalizar políticas e recursos para o crescimento foi dito aqui.

Face ao nosso estádio de desenvolvimento económico e social, a sustentabilidade das finanças públicas deve ser procurada no quadro da necessidade de um elevado esforço de investimento em infraestruturas físicas, em capital humano (educação e formação profissional) e em áreas sociais como a saúde e a protecção social.

É por isso que nós defendemos que as despesas de investimento não devem contar para o défice;

O Pacto de Estabilidade deve ser revisto tendo em conta esta questão da despesa de investimento, pois a economia portuguesa, precisa de despesas orçamentais que possam ultrapassar os 3% nos próximos anos, como forma de estimular a produção, o emprego, o desenvolvimento e para travar as consequências da sobrevalorização do euro em relação ao dólar.

É tempo também de se ver que a questão orçamental é, essencialmente, um problema de receitas e não de despesas.

O equilíbrio orçamental não pode continuar a ser conseguido à custa da diminuição da prestação das funções sociais do Estado, da educação, da saúde, do apoio social e do investimento.

A questão orçamental é mais uma questão de receitas, nomeadamente o grave problema da evasão fiscal, escândalo das baixas taxas de IRC que a Banca e os grandes grupos económicos pagam efectivamente, do que de despesas;

Conseguir um crescimento económico sustentado e a ritmos relativamente elevados, que promova o desenvolvimento do país e potencie as receitas fiscais. Este é que é o grande problema da economia portuguesa! Não o do défice público.

O que é necessário concretizar é uma política de educação, cultura e ciência, uma política ambiental como objectivos centrais da sociedade portuguesa.

Uma política educativa que tenha como principais orientações, em todos os níveis de ensino, a defesa e aperfeiçoamento de uma escola pública e gratuita. Escola democratizada no acesso, frequência, sucesso e saídas profissionais. Uma escola pública de qualidade e para todos.

O grande desafio que se nos coloca no plano social é o de pôr fim a uma política de rendimentos que nos últimos 28 anos levou a que se tenha cavado cada vez mais o fosso entre os 20% das famílias mais ricas e os 20% das famílias mais pobres.

Que 100 famílias acumulem fortunas de 20 mil milhões de euros e milhões de portugueses conheçam as dramáticas consequências da pobreza, do desemprego, da exclusão social, enquanto uns trabalhando empobrecem, outros especulando enriquecem.

Nós defendemos que o país deve criar mais riqueza, mas esta ideia é indissociável duma mais justa repartição.

A criação de emprego com direitos é fundamental.

Sabemos que sem crescimento, sem desenvolvimento económico, sem valorização do aparelho produtivo e da produção nacional, sem aumento de produtividade, voltaremos a assistir àqueles anúncios de anteriores Primeiros Ministros que em noites de Ano Novo, lamentando o desemprego e cheios de pena dos desempregados, tiravam sempre um coelho da cartola com a afirmação que o desemprego diminuía com a criação de mais empregos..

Actualmente há quem dê um ousado passo, quantificando esses empregos a criar. Por explicar fica a contabilização dos empregos a destruir nesses próximos quatro anos e por saber fica como e onde vão ser criadas esses 150 mil postos de trabalho.

Da nossa parte continuaremos a afirmar a valorização do trabalho e dos trabalhadores como elemento intrínseco do desenvolvimento económico.

Portugal não está condenado ao atraso. Temos propostas para uma outra política. Sem mudança não há soluções duradouras para sairmos da crise.