Intervenção de

Apreciação Parlamentar do Decreto-Lei nº 265/2001, de 28 de Setembro, que define o enquadramento da coordenação<br />Intervenção do Deputado Honório Novo

Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados Com alguns pretextos e argumentação avulsa, é sabido que o Governo anterior não avançou com as suas anunciadas propostas para a descentralização administrativa. Nesta matéria, a parilisia foi de facto extensa e profunda. Tão extensa e profunda que levou mesmo um destacado autarca socialista a reconhecer que "a descentralização tinha sido a grande desilusão do Governo de António Guterres". As opções feitas e as poucas decisões tomadas contraditaram no fundamental uma verdadeira política descentralizadora. Pelo contrário, acentuaram-se as medidas para um crescente controlo das políticas regionais por parte do Governo e das entidades e instituições desconcentradas da Administração Central. Caso típico deste insuspeitado centralismo, ainda que com o bondoso pretexto de optimizar modelos orgânicos e funcionais já existentes, é o decreto lei que visa enquadrar a coordenação da administração desconcentrada do Estado e de que hoje estamos a fazer a apreciação parlamentar. Esta iniciativa governamental concentra algumas novas embora limitadas competências, (por exemplo na articulação entre serviços e na promoção e informação de políticas regionais), nos Presidentes das Comissões Coordenadoras. Simultâneamente, remete os seus titulares para a dependência directa do Primeiro Ministro e promove a sua ascensão na hierarquia governamental, equiparando-os a subsecretários de Estado. Isto é: este decreto lei dá origem à bizarra situação de podermos ter as Comissões de Coordenação Regional sob a tutela do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e, ao mesmo tempo, ter o respectivo Presidente a "responder" perante o Primeiro Ministro. Ou seja, este decreto lei origina um contra senso mais que evidente, de difícil explicação política e ainda menor justificação funcional. O Decreto-Lei nº 265/2001, de 28 de Setembro, não se fica por aí na sua mal disfarçada tendência para centralizar políticas regionais. É que remete os autarcas para "foruns regionais" mais ou menos assépticos e eminentemente decorativos, ao mesmo tempo que cria os "conselhos coordenadores regionais" - com capacidade de intervenção notoriamente superior - onde não figura um único, repito, um único dos presidentes de câmara da respectiva região. E isto não é tudo, pois se nesses conselhos coordenadores regionais não têm assento autarcas, já lá existe lugar cativo - pasme-se! - para todos os senhores governadores civis dos distritos da região. O que, bem entendido, cria nova situação bizarra: a de saber quem fala aí em nome do Estado Central, se o Presidente da CCR, sob tutela do Primeiro Ministro, se algum dos Governadores Civis residentes, todos eles igualmente representantes do Governo! E no caso de serem estes últimos a assumir a função, não se sabe bem como vai ser designado o porta voz do grupo, se o mais antigo no cargo ou se, por exemplo, o de mais provecta idade! Assim reza, o decreto-lei 265/2001 de 28 de Setembro que o PCP quer ver alterado. Por isso apresentamos as seguintes alterações: 1º eliminar a presença dos Governadores Civis da composição dos Conselhos Coordenadores Regionais; 2º fazer incluir nestes órgãos alguns presidentes de Câmara escolhidos pelos seus pares regionais; 3º assegurar a presença dos restantes autarcas na composição dos foruns regionais; 4º manter as Comissões de Coordenação Regional e os respectivos presidentes na dependência do Ministério da tutela tradicional, no caso actual, o Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente; 5º manter o posicionamento originário dos Presidentes das CCRs na hierarquia da administração pública já que nada justifica neste quadro a sua equiparação a subsecretário de Estado. O PCP reafirma a sua convicção de que a descentralização exige vontade política e medidas concretas para a transferência para o Poder Local de novas atribuições e competências, bem como dos respectivos meios financeiros. A descentralização exige também uma nova mentalidade política e, por exemplo, impõe à administração desconcentrada uma atitude que admita sem desconfianças a participação operativa (e não meramente decorativa) dos autarcas. No caso das CCRs exigem-se mudanças radicais de atitudes e métodos, deve mesmo ser colocada na ordem do dia a atribuição de maiores responsabilidades aos autarcas na definição e gestão das políticas regionais, deve conferir-se uma maior capacidade de intervenção no processo da própria nomeação dos presidentes destas instituições da administração desconcentrada do Estado. O Governo em funções já não é aquele que avançou com este Decreto Lei, havendo quem possa advogar que esta apreciação parlamentar tem pouco sentido. Nada mais errado e por três razões essenciais. Antes do mais, por questões meramente formais, já que a legislação em causa continua plenamente em vigor e a mudança de Governo não determina qualquer revogação automática. Em segundo lugar, porque o texto legal, se for alterado conforme as propostas hoje apresentadas pelo PCP, introduzirá pela primeira vez na história da administração pública em Portugal elementos profundamente inovadores na estrutura de instituições desconcentradas do Estado, como sejam o reforço da participação democrática dos municípios e o estabelecimento de condições para uma intervenção diferencidada dos autarcas ao nível das decisões das CCRs. Por último, porque o texto legal assim alterado, e a fazer fé em múltiplas e insistentes declarações produzidas antes e depois das eleições de Março, dá também seguimento a perspectivas defendidas quer pelo PSD quer pelo PS, e pode assim colher o apoio largamente consensual dos diferentes grupos parlamentares, não se justificando, (a menos que se queira perder ainda mais tempo e dar o dito por não dito) qualquer necessidade de voltar à estaca do zero legislativo. Não podemos perder mais tempo, não são aceitáveis novas manobras de diversão, vamos reformular profundamente o enquadramento legislativo existente e avançar decididamente na descentralização. Sr. Presidente, Sr. Deputado Vítor Reis, Acabo de o ouvir com toda a atenção e, salvo alguma transcrição menos correcta, o Sr. Deputado acaba de exprimir três ideias que, no fundo, vêm rigorosamente na linha do que eu próprio disse na minha intervenção e na do texto que fundamenta a apreciação parlamentar pedida pelo PCP. O PSD também está de acordo em que se chamem os municípios a participar na estrutura desconcentrada da Administração Central. O PSD também está de acordo em que se deve reforçar a participação dos municípios na gestão e no acompanhamento das políticas regionais. O PSD também está de acordo com o PCP, neste caso concreto, quanto à realização de uma desconcentração para valer. Sr. Deputado, se bem ouviu a minha intervenção, e, quando tiver oportunidade, verifique as minhas propostas, é rigorosamente isto que o PCP propõe no conjunto de propostas que entregou na Mesa. Assim, naturalmente, o PSD vai estar de acordo com as propostas do PCP, vai aproveitar o trabalho já feito e vamos partir não do zero, porque a história, Sr. Deputado Vítor Reis, não começa no momento em que entramos como actores - começou antes de nós e há-de prosseguir depois de nós, e, portanto, não tenham a veleidade de pensar que a história só começou quando os senhores chegaram -, mas aproveitar esta iniciativa a fim de não voltarmos atrás, para não voltarmos à «estaca zero». Estão dispostos a colaborar neste sentido ou a fazer uma outra coisa, eventualmente a dar o dito por não dito? Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, Ouvi-o com atenção e registei, logo no início, o tempo verbal usado: o Sr. Deputado fala no passado, mas não tem legitimidade para o fazer, na minha opinião, porque este decreto-lei continua em vigor, não foi revogado. O Sr. Deputado Alberto Martins diz que este decreto-lei se destina a «pilotar», durante um ano, uma espécie de uma experiência. Embora não tenha lido em lado algum do decreto-lei que o prazo de validade do mesmo é de um ano - provavelmente li-o apressadamente, mas julgo que não! -, o que agora podemos concluir é que o que se pretendia com ele era adiar, mais uma vez, medidas concretas e eficazes na desconcentração, isto segundo a opinião agora expressa pelo Sr. Deputado Alberto Martins. Mas eu não penso assim, porque creio que nem do ponto de vista constitucional nem do ponto de vista material este decreto-lei era inocente quanto à perspectiva do ex-governo em matéria de desconcentração e de estruturas desconcentradas. A este propósito, percebe-se, mais uma vez, a bondade e a justificação do Presidente da Câmara Municipal da Cidade de Braga, quando recentemente afirmou (veio publicado nos jornais) que a grande desilusão, para ele, autarca, do governo de António Guterres tinha sido a total ausência de medidas concretas na descentralização. Sr. Deputado Alberto Martins, gostava que nos explicasse e que explicasse aos portugueses como é que uma instituição desconcentrada da administração do Estado, fundamentalmente virada para as políticas regionais - e não estou a falar de um qualquer serviço desconcentrado, de um qualquer governador civil mas, sim, desta estrutura especificamente vocacionada para este fim -, pode atirar para órgãos eminente e exclusivamente decorativos os autarcas, retirando-lhes a participação na única estrutura interna com alguma capacidade operativa, mantendo aí, contraditoriamente, todos os governadores civis! Como é possível falar em política regional sem as autarquias, Sr. Deputado Alberto Martins?

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