Projecto de Lei N.º 637/XIII/3.ª

Altera o regime de serviços mínimos bancários, tornando-o mais adequado às necessidades dos clientes bancários

Altera o regime de serviços mínimos bancários, tornando-o mais adequado às necessidades dos clientes bancários

A titularidade de uma conta bancária à ordem e de um cartão de débito para sua movimentação constitui, hoje, uma necessidade para a esmagadora maioria dos cidadãos.

O Banco de Portugal, na sua Carta Circular n.º 24/2014/DCS, reconheceu que “a conta de depósito à ordem é um produto de base que configura uma infraestrutura indispensável ao acesso ao sistema bancário” e que «a conta de depósito à ordem é o produto bancário chave para a inclusão financeira», devendo tal reconhecimento traduzir-se, na opinião do PCP, na possibilidade de os cidadãos acederem a estas contas sem estarem sujeitos à possibilidade de as instituições de crédito abusarem da sua posição para cobrarem comissões de manutenção excessivas.

Segundo o Banco de Portugal, de acordo com os dados dos preçários que lhe são reportados, o valor das comissões de manutenção das contas bancárias não tem parado de aumentar, assumindo valores cada vez mais expressivos. Em algumas instituições financeiras, o peso do conjunto das comissões no produto bancário aproxima-se de ou ultrapassa já os 40%.

Esta é uma situação inaceitável, que penaliza fortemente os clientes bancários – particulares ou empresas – e que se traduz no pagamento forçado de uma renda às instituições bancárias sem qualquer intervenção que a contrarie por parte dos poderes públicos, seja do Governo, seja do Banco de Portugal.

Seguindo as orientações de sucessivos governos ou perante a passividade destes, administrações da Caixa Geral de Depósitos, em vez de afirmarem uma estratégia de diferenciação da banca pública, adotam critérios de gestão em linha com a banca privada. Exemplo disso é o recente aumento das comissões de manutenção das contas à ordem que a Caixa Geral de Depósitos decidiu impor aos seus clientes. Assim, o banco público, em vez de dar um exemplo nesta matéria, desagravando comissões bancárias, junta-se ao “esbulho” praticado pelos bancos privados, mostrando quão justa é a proposta do PCP de uma outra orientação para a Caixa Geral de Depósitos, que, contrariando as diretivas e imposições da União Europeia, alargue a sua cobertura territorial, a vocacione para o apoio às pequenas empresas, desagrave os custos dos serviços bancários, recuse a especulação financeira e o favorecimento dos grupos monopolistas.

Perante os abusos praticados pelas instituições de crédito no que à cobrança de comissões diz respeito, torna-se necessária uma intervenção legislativa que garanta o acesso dos cidadãos aos serviços bancários básicos.

No ano 2000 foi criado, pelo Decreto-Lei n.º 27-C/2000, de 10 de março, o regime de serviços mínimos bancários que visava garantir aos cidadãos o acesso a uma conta à ordem e a realização de operações bancárias de depósito, levantamento, pagamento de bens e serviços, débito direto e transferência bancária, ao mesmo tempo que estabelecia um limite máximo para as comissões de manutenção, despesas e outros encargos dessas contas, atualmente fixado em 1% do valor do indexante dos apoios sociais.

Contudo, apesar das boas intenções do legislador, o regime de serviços mínimos bancários teve uma fraquíssima adesão. Tal circunstância é explicada pelas limitações impostas aos titulares das contas de serviços mínimos bancários, designadamente a obrigatoriedade de possuírem uma e apenas uma conta no conjunto das instituições de crédito e o facto de os cartões de débito associados a essas contas terem condições de utilização mais restritivas do que demais cartões de débito (não podendo, por exemplo, ser utilizados no estrangeiro ou em compras de baixo valor que não requerem a inserção do PIN – portagens, parques de estacionamento, etc.).

Estas limitações explicam por que motivo, 17 anos depois da sua criação, no final do 1.º semestre de 2017 havia apenas 39.146 contas de serviços mínimos bancários, uma ínfima parcela da totalidade de contas de depósito à ordem existentes em Portugal.

Impõe-se, assim, uma alteração ao regime de serviços mínimos bancários, eliminando estas limitações e tornando as contas de serviços mínimos bancárias mais adequadas às necessidades dos clientes bancários. É esse o objetivo do presente Projeto de Lei do PCP.

Em primeiro lugar, abre-se a possibilidade de um cidadão poder ser, simultaneamente, titular de uma conta de serviços mínimos bancários e titular ou contitular de outras contas à ordem não abrangidas por este regime. Assim, um cidadão poderá abrir uma conta de serviços mínimos bancários numa instituição de crédito à sua escolha ou converter uma conta depósito à ordem numa conta de serviços mínimos bancários, sem ter de encerrar todas as outras contas de que eventualmente seja titular, na mesma ou noutras instituições bancárias.

Em segundo lugar, a proibição, constante no atual regime de serviços mínimos bancários, de as instituições de crédito oferecerem, explícita ou implicitamente, quaisquer facilidades de descoberto ou permitirem a ultrapassagem de crédito, deixa de ser aplicar às operações realizadas com o cartão de débito, o qual, desta forma, passa a possuir as mesmas caraterísticas e condições de utilização dos cartões de débito disponibilizados fora do âmbito do regime de serviços mínimos bancários, permitindo, em particular, a sua utilização no estrangeiro e em pagamentos de baixo valor para os quais não é necessária a introdução de PIN.

Pelo exposto, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Objeto

A presente lei procede à quinta alteração ao Decreto-Lei nº 27-C/2000, de 10 de março, que institui o sistema de acesso, pelas pessoas singulares, aos serviços mínimos bancários, alterado pela Lei nº 19/2011, de 20 de maio, pelo Decreto-Lei nº 225/2012, de 17 de outubro, pela Lei n.º 66/2015, de 6 de junho, e pelo Decreto-Lei n.º 107/2017, de 30 de agosto, que o republica.

Artigo 2.º
Alteração ao Decreto‐Lei n.º 27‐C/2000, de 10 março

Os artigos 4.º, 4.º-A, 4.º‐B, 4.º-C, 4.º‐D e 5.º do Decreto‐Lei n.º 27‐C/2000, de 10 março, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 4.º
[…]

1 – A abertura de conta de serviços mínimos bancários depende da celebração de contrato de depósito à ordem junto de uma instituição de crédito que disponibilize, ao público, os serviços que integram os serviços mínimos bancários, pelo interessado que não seja titular de outra conta de serviços mínimos bancários nessa ou noutra instituição de crédito, salvo no caso previsto no n.º 3 do artigo 4.º -B, ou no caso de o interessado declarar que foi notificado de que a sua conta de serviços mínimos bancários noutra instituição de crédito irá ser encerrada.
2 – O interessado deve declarar nos impressos de abertura de conta, ou em documento a eles anexo, que não é titular de outra conta de serviços mínimos bancários, salvo no caso previsto no n.º 3 do artigo 4.º-B, ou que foi notificado de que a sua conta de serviços mínimos bancários noutra instituição de crédito será encerrada.
3 – […]
4 – […]
a) […]
b) […]
c) […]
d) As consequências decorrentes da eventual detenção de outra conta de serviços mínimos bancários titulada pelo interessado no momento da abertura de conta de serviços mínimos bancários ou, posteriormente, durante a vigência do contrato de depósito à ordem.
5 – […]
a) À data do pedido de abertura de conta, o interessado for titular de uma ou mais contas de serviços mínimos bancários em instituição de crédito, salvo no caso previsto no n.º 3 do artigo 4.º-B;
b) […]
c) […]
6 – […]
7 – […]

Artigo 4.º-A
[…]

1 – […]
a) [Revogado]
b) […]
2 – […]
3 –
4 – […]

Artigo 4.º-B
[…]

1 – […]
2 – […]
3 – Sem prejuízo do previsto nos números anteriores, a pessoa singular que seja titular de uma conta de serviços mínimos bancários pode ser titular de outra conta de serviços mínimos bancários desde que um dos contitulares dessa conta seja uma pessoa singular com mais de 65 anos ou dependente de terceiros.
4 – […]

Artigo 4.º-C
[…]

1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – Para além da especificação dos elementos exigidos na lei e nos regulamentos aplicáveis, o contrato de depósito à ordem referido no n.º 1 do artigo 4.º e o aditamento previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º -A devem:
a) […]
b) […]

Artigo 4.º-D
[…]

[…]
a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) [novo] O disposto na alínea anterior não se aplica às operações realizadas com cartão de débito, o qual não pode ter caraterísticas específicas que resultem em condições mais restritivas para a sua utilização do que as existentes para os cartões de débito disponibilizados fora do âmbito do presente diploma.

Artigo 5.º
[…]

1 — […]
a) […]
b) O titular não realizou qualquer das operações enumeradas na subalínea iv) da alínea a) no n.º 2 do artigo 1.º durante, pelo menos, 24 meses consecutivos;
c) […]
d) […]
e) O titular, durante a vigência do contrato de depósito à ordem celebrado ou convertido ao abrigo do presente diploma, detém uma outra conta de serviços mínimos bancários numa instituição de crédito em Portugal, que lhe permite utilizar os serviços enumerados na alínea a) do n.º 2 do artigo 1.º deste diploma, salvo nos casos previstos no n.º 3 do artigo 4.º -B.
2 — […]
3 — […]
4 — […]
5 — [...]
6 — […]
7 — […]»

Artigo 3.º
Norma revogatória

É revogada a alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º-A do Decreto-Lei n.º 27 -C/2000, de 10 de março, alterado pela Lei n.º 19/2011, de 20 de maio, pelo Decreto-Lei n.º 225/2012, de 17 de outubro, pela Lei n.º 66/2015, de 6 de julho, e pelo Decreto-Lei n.º 107/2017, de 30 de agosto.

Artigo 4.º
Disposições finais

No prazo de 30 dias após a entrada em vigor da presente lei, as instituições de crédito procedem à substituição dos cartões de débito atualmente associados às contas de serviços mínimos bancários por novos cartões de débito com caraterísticas idênticas às dos disponibilizados fora do âmbito dos serviços mínimos bancários.

Artigo 5.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 11 de outubro de 2017

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