Marcelo pelo SIM

Artigo de João Amaral
no «Jornal de Notícias»

21 de Setembro de 1998



Tenho à minha frente a intervenção que o professor Marcelo Rebelo de Sousa produziu na Assembleia Municipal de Lisboa no dia 9 de Maio de 1996, sobre a regionalização. Se a Direcção do JN quiser, dar-lhe-ei uma cópia, que será mais uma contribuição para a argumentação a favor do SIM!

Não há engano: a favor do SIM. O prof. Marcelo fez aquela intervenção como deputado municipal de Lisboa, tinha sido eleito presidente do PSD dois meses antes. Aí estava o professor a intervir como presidente do PSD e como autarca do PSD e a definir a posição do PSD no debate sobre a regionalização.

Uma semana antes, a 2 de Maio, tinha sido a votação na Assembleia da República dos projectos sobre o mapa das regiões. O professor e o PSD estavam embaladíssimos, na reclamação de um referendo. Mas... e sobre a regionalização, o que quereria o PSD?

O professor falou num tom entre uma aula de Direito Administrativo e os seus famosos exames na TSF. E respondeu àquela pergunta. Cito a acta: "É defensor da institucionalização de regiões administrativas enquanto cidadão sentia-se bem em dizê-lo, assim como se sentia bem em dizê-lo também como líder partidário, visto que a moção que subscrevera, e que foi maioritariamente votada no Congresso", isso mesmo dizia. Para que não restasse qualquer ambiguidade, acrescentou mais à frente que "defendia ele e defende o PSD a regionalização".

E esta?!

Mas o professor vai mais longe, e alinha argumentos para combater afirmações de partidários do "NÃO".

Aos que contrapõem regionalização e descentralização, o professor explica que há várias formas de descentralização (por ex., o municipalismo), mas sublinha e esclarece que a regionalização é uma forma de descentralização.

Aos que falam das posições do PSD dizendo que era descentralizador mas não regionalizador, o prof. explica que, "no caso do PSD, a tónica da descentralização, e dentro dela, da regionalização, esteve sempre presente".

Aos que dizem que a regionalização é sempre política, o prof. contrapõe que a "regionalização política é uma coisa - é a que existe nos Açores e na Madeira -, a regionalização administrativa é uma coisa distinta".

Aos que contrapõem às regiões as associações de municípios, como por exemplo as associações que são as áreas metropolitanas, o prof. comenta que essas associações são uma fórmula "insuficiente".

Aos que dramatizam a criação das regiões, o prof. responde que "a argumentação dramática (...) não fazia sentido".

Mas será este Marcelo o mesmo que agora anda a dramatizar a criação das regiões, a contrapor-lhes as associações de municípios e áreas metropolitanas, a dizer que a regionalização cria tachos políticos e que não é uma verdadeira descentralização?

Este professor é o produto da enorme fragilidade política com que se senta na cadeira de presidente do PSD. A posição anti-regionalista do PSD é filha do maquiavelismo e tactismo que Marcelo adoptou como orientação pessoal na sua liderança.

Ele foi conduzido ao "NÃO" pelas posições do então líder do PP Manuel Monteiro, que se colocou na posição de tentar capitalizar todo o espaço do NÃO. Na tentativa de engolir e dirigir o PP através da AD, Marcelo torna o NÃO na "bandeira comum" PSD/PP. Assim, Monteiro acaba por ser o pai tutelar da posição anti-regionalista do PP e do PSD, posição que hoje serve uma estratégia de aliança do PP contrária à que ele defendeu. A política também sabe ser irónica...

Com esta posição do NÃO, Marcelo pôs muita gente séria e convicta do seu partido, que era e é partidária da regionalização, a dizer o contrário do que pensa. As feridas que isto causa são incuráveis.

Mas, quem quer substituir o prof. Marcelo na liderança? O PSD está demasiado roto para servir agora as ambições dos que se perfilam ao fundo, à espera do espalhanço de Marcelo. Para já, sofre a regionalização, tornada mero expediente táctico.