Apresentação dos Candidatos CDU do Porto
Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP
Porto, 29 de Março de 2005

(Extractos)

As nossas mais cordiais saudações a todos os eleitos e activistas da CDU. Permitam-me que particularmente dirija uma saudação aos nossos amigos e aliados do Partido “Os Verdes” e da “Intervenção Democrática” e aos muitos milhares de independentes que connosco estão neste nosso projecto unitário e de ampla participação democrática ao serviço das populações.

Iniciamos hoje, aqui, com a apresentação pública dos cabeças de lista da CDU à Câmara Municipal do Porto e à Assembleia Municipal, respectivamente os camaradas Rui Sá e Sérgio Teixeira, uma nova batalha eleitoral que, estamos certos, sendo uma eleição diferente, vai confirmar e reforçar o bom resultado eleitoral obtido pela CDU nas recentes eleições para a Assembleia da República.

A nova e importante batalha que temos pela frente é uma batalha de grande exigência para todos nós e que apela ao redobrado envolvimento de todos os activistas e eleitos da CDU.

Exigente, porque, ao mesmo tempo que se impõe lançar uma forte dinâmica de afirmação do distinto projecto da CDU, estamos desde já confrontados com a necessidade de desenvolver a luta contra a proposta do PS de fazer convergir para o mesmo dia das eleições autárquicas o referendo sobre o Tratado conhecido como da “Constituição Europeia”.

Uma incompreensível proposta do PS que ainda há um ano, quando Durão Barroso fazia essa mesma proposta, defendia exactamente o contrário.

É inaceitável que aqueles mesmos que apelavam ao respeito pela Constituição e pela lei para exigir que se distanciasse o mais possível o acto do referendo de outro acto eleitoral, e que, por razões políticas, que nós inteiramente subscrevemos, afirmavam na Assembleia da República, pela voz do actual Ministro da Justiça, ser necessário esse distanciamento como “factor de autenticidade e de genuinidade da consulta referendária como consulta distinta de uma consulta a partidos”, venham agora dar o dito por não dito e fazer a mesma proposta que a outros condenavam.

Trata-se de uma clara manobra que visa reduzir o acto referendário do novo Tratado Europeu a uma mera formalidade, com prejuízo não só para o debate, compreensão e avaliação sobre as diversas propostas e projectos autárquicos em disputa nas próximas eleições, mas também para o imprescindível aprofundamento do debate e conhecimento sobre o verdadeiro conteúdo e significado da proposta do novo Tratado.

A concretizar-se a proposta de fazer confluir no mesmo dia o referendo e as eleições, que exige além do acordo do Presidente da República uma nova revisão da Constituição nesse sentido, as próximas eleições para as Autarquias realizar-se-iam num quadro de maior complexidade e confusão que se traduziriam na menorização de ambas as consultas.

E se as eleições para as autarquias locais são de uma enorme importância para as populações de cada concelho e de cada freguesia, o que está em jogo com no novo Tratado é de tal importância que a sua aprovação teria um inegável impacto negativo em todos os domínios da nossa vida colectiva nacional. E, por isso, exige de nós também uma aturada denúncia e combate.

Desde logo pelas negativas consequências para a soberania nacional, com as suas propostas de cariz federalista e a inaceitável subordinação do direito nacional à “Constituição Europeia e ao direito comunitário, mas também pelo impacto na definição das políticas nacionais e comunitárias, em resultado da matriz neoliberal em que assenta todo o seu edifício normativo.

Um novo Tratado que vem consagrar a ofensiva liberalizadora e privatizadora dos serviços públicos e a flexibilização do mercado de trabalho que vêm sendo concretizadas nos últimos anos e a que o Conselho Europeu da semana passada, com a presença do novo governo português, vem dar novo folgo com a aprovação da proposta de revisão da Estratégia de Lisboa e com o pretexto do melhoramento da “competitividade” vem agora acelerar e promover novos avanços dos processos de liberalização e desmantelamento dos serviços públicos alargando-os aos domínios da saúde, audiovisual, educação e água, enquanto no plano das directivas laborais se ensaia o retrocesso brutal da organização e do tempo de trabalho.

Uma Cimeira que confirma, quer nas insuficientes propostas de revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento em relação às necessidades dos países de menor desenvolvimento económico, quer na revisão intercalar da “Estratégia de Lisboa” e nas restritivas perspectivas financeiras do Orçamento Comunitário 2007/2013 o domínio dos Estados mais poderosos, na definição das orientações que melhor servem aos seus objectivos nacionais e de grandes potências e que as profundas alterações ao nível das instituições e processos de decisão que o novo Tratado prevê e consagra mais agravariam.

Uma batalha exigente também porque é necessário aliar o trabalho de afirmação do nosso projecto e de divulgação e defesa das nossas propostas concretas na solução dos problemas das populações à firme denúncia da pretensão da direita e do PS de subversão de características essenciais do poder local, nomeadamente a da representação plural nos executivos municipais.

A recente proposta do PSD de revisão imediata da lei eleitoral para as autarquias, cujo conteúdo vai ao encontro das propostas apresentadas na passada legislatura pelo PS e confirmadas agora no Programa do Governo são não só motivo de séria preocupação, como revelam as concepções hegemónicas e de poder absoluto dos seus projectos políticos e de intervenção autárquica que só podem merecer a nossa recusa e oposição.

Esta exigência da direita de promover alterações da lei eleitoral para as autarquias a tempo de se aplicarem já nas próximas eleições só pode merecer o nosso mais vivo protesto.

Mas independentemente da cobertura que venha a ter esta proposta de revisão imediata da Lei, o que está em causa com as cada vez mais coincidentes propostas da direita e do PS para além da concretização do velhíssimo objectivo de eliminação da pluralidade das forças políticas representadas nos órgãos executivos municipais por parte da direita e que as propostas de “executivos homogéneos” do PS agrava é a clara intenção de deitar borda fora a rica experiência que durante anos foi consagrada constitucionalmente que favorece a cooperação de eleitos de forças políticas diversas e a unidade em torno dos problemas concretos das populações e da sua resolução para, em vez disso, impor um modelo de funcionamento do poder local redutor e democraticamente empobrecedor que privilegia e fomenta a divisão artificial e promove a mais sectária partidarização da gestão autárquica. Eram eles os campeões do pluralismo!

Um modelo de funcionamento com graves consequência para a transparência dos actos de gestão com a exclusão das forças minoritárias na discussão e decisão e consequentemente facilitador do fomento do compadrio e da corrupção. Situação que se agrava com a crescente presidencialização no funcionamento dos órgãos imposta pela direita e pelo PS.

Um modelo que troca um funcionamento assente na colegialidade, na cooperação entre eleitos e no contributo dos elementos válidos de cada força política na procura da resolução dos problemas concretos e do progresso das respectivas terras, por um funcionamento que é a transposição das lógicas e mecanismos da governação nacional e do funcionamento parlamentar que a direita e o PS difundem e valorizam como modelo ideal de funcionamento com o claro objectivo de garantir o seu domínio hegemónico e poder exclusivo nas autarquias.

O fim da eleição directa das câmaras municipais como pretendem PS e PSD consagrando em definitivo a lógica de “parlamentarização” do poder local”, para além de por em causa a legitimação da vontade directa das populações, transformariam também o poder local numa arena de confrontação e oposição cega entre vencedores e vencidos, de mero espaço de polémica e confrontação verbal e formal, em prejuízo da capacidade de realização e da procura da confluência de vontades na solução dos problemas concretos das populações.

Num momento em que o PS e agora também o Bloco que propositadamente deturpam e confundem, por puro cálculo eleitoralista e mesquinhez partidária, esta forma de estar que sempre norteou os eleitos da CDU no poder local, sempre contrária com qualquer prática de submissão, frete ou cumplicidade às forças maioritárias em cada autarquia, daqui queremos reafirmar que não abdicaremos, afirmando naturalmente o nosso projecto alternativo, de contribuir com a nossa presença, trabalho e obra concreta para a solução dos problemas das populações.

Não são, por isso, também inocentes as afirmações de Teixeira Lopes do Bloco de “recusa de qualquer aliança com a CDU no Porto” com o estafado e falso argumento da cumplicidade com a direita ”. Elas são objectivamente uma cedência às concepções e pretensões de hegemonia das duas principais forças políticas que maioritariamente dominam as autarquias locais e revelam também a hipocrisia e a palavra vã dos seus tão propalados propósitos de promover um poder local participado, bem como quanto falsos e instrumentais são, também, os seus cíclicos apelos a soluções de unidade das forças de esquerda.

A arrogância desmedida que revelam as afirmações do Bloco, certamente deslumbrados com os seus resultados eleitorais, deveria ser mais contida. Primeiro, porque cometem um erro de palmatória, fazer o transporte mecânico de resultados das legislativas para as autárquicas. Em segundo, porque esquece a prática e contributo, esse sim, de completo frete à direita na Câmara de Lisboa com a sua saída e divisão da coligação “Amar Lisboa” da qual se transformaram em inimiga principal, dando de bandeja a vitória a Santana Lopes.

Não contem connosco para enterrar uma prática que deu frutos na sociedade portuguesa e que permitiu potenciar a capacidade realizadora do poder local.

Os eleitos da CDU, quando em minoria, se, por um lado, denunciam e combatem tudo o que lhes parece negativo, por outro lado, não abdicaram de apoiar todas as propostas que lhe parecem justas, venham de onde vierem, e cooperam com todos os que prossigam o objectivo da sua concretização. Uma postura e uma intervenção que recusa o poder absoluto, a estrita lógica do combate político do poder pelo poder, acima dos problemas, anseios e aspirações das pessoas, que não enjeita assumir responsabilidades em autarquias de minoria com inteira independência.

Temos um passado de realização nas autarquias e um projecto alternativo de esquerda no poder local que não deixam dúvidas quanto ao sentido e rumo da nossa intervenção na defesa do interesse público e das populações.

Vamos para estas eleições propondo-nos confirmar e prosseguir no próximo mandato nas autarquias locais o reconhecido valor do trabalho realizado.

Trabalho alicerçado num projecto assente na assunção da participação como um factor essencial de uma gestão democrática.

Vamos para estas eleições com o firme propósito de continuar a ancorar o projecto da CDU no envolvimento efectivo das populações na definição das principais opções da política autárquica.

Vamos para estas eleições propondo a concretização de uma gestão integrada e de um planeamento de forma a assegurar a construção de espaços urbanos humanizados, ambientalmente equilibrados e dotados dos equipamentos indispensáveis a uma vida social e colectiva.
Vamos para este combate eleitoral com o firme propósito de defender a promoção de uma gestão do território que, garantindo um desenvolvimento equilibrado sustentável, salvaguarde a defesa do interesse público e colectivo face a pressões especulativas.

Assumiremos com determinação o fomento de uma política local que assegure a valorização cultural e desportiva das populações, estimule o associativismo popular e adopte uma orientação marcada por uma particular sensibilidade aos sectores mais frágeis e desfavorecidos da população.

Defenderemos o carácter público da prestação dos serviços básicos essenciais pela autarquia como um instrumento essencial de salvaguarda dos interesses das populações e do direito à prestação de um serviço com qualidade e acessível a todos os cidadãos.

Vamos bater-nos para que o poder local democrático continue a ser expressão de Abril.