Sobre a reunião do Comité Central
Declaração de Carlos Carvalhas, Secretário-geral do PCP
6 de Maio de 2003

 

O Comité Central tem vindo a analisar o balanço do debate preparatório da Conferência Nacional, “O PCP e o Poder Local”, a realizar nos próximos dias 10 e 11, bem como o projecto de resolução a submeter à discussão e aprovação da Conferência Nacional e que integra já os contributos resultantes da discussão realizada nas organizações do Partido.

O Comité Central tem-se debruçado também sobre alguns aspectos marcantes da evolução da situação nacional e internacional, nomeadamente o preocupante agravamento dos principais indicadores sociais e económicos, e a ofensiva contra o regime democrático-constitucional com consequências da chamada reforma do sistema político, e as ameaças à paz e à segurança no mundo em consequência da agressão ao Iraque e da estratégia belicista da Administração Bush.

1. O Comité Central tem analisado o agravamento da situação económica, a acentuação dos traços de recessão da economia portuguesa e denuncia mais uma vez a política de direita como principal responsável pela situação de crise que o País enfrenta.

A política de cega restrição orçamental prosseguida nos últimos anos, não só agudizou as dificuldades de uma conjuntura económica externa negativa, como ameaça mergulhar o País numa estagnação económica prolongada.

A brutal contracção do mercado interno articulada com o estrangulamento do investimento público e a redução da capacidade financeira das autarquias arrasta consequências em cadeia para as micro, pequenas e médias empresas e o conjunto das actividades económicas com todo o cortejo de problemas que se adivinham!

São crescentes as dificuldades das famílias de trabalhadores e reformados em satisfazerem necessidades básicas, aumentam atrasos e interrupções de investimentos públicos em infra-estruturas e políticas sociais, necessárias para o desenvolvimento do País, agravam-se as desigualdades sociais e assimetrias regionais, a que acrescem as tentativas do Governo através das ditas “reformas estruturais” de transferir para a generalidade dos portugueses uma factura crescente pelo serviços de saúde (taxas moderadores, preços dos medicamentos), ensino (aumento das propinas) e pelo enfraquecimento do sistema público de segurança social, com redução de importantes direitos.

Nos últimos meses multiplicaram-se os encerramentos e deslocalizações de empresas, cresceu dramaticamente o número de desempregados, com particular incidência nas mulheres, jovens e quadros, situação que o Governo e o grande capital aproveitam para impor uma política de congelamento e mesmo redução salarial, enquanto o nível de endividamento dos portugueses atingiu em 2002 um valor recorde de 103% do seu rendimento disponível – em média, cada português tem no fim do mês o seu salário consumido!

2. O Comité Central tem reafirmado a vigorosa condenação pelo PCP do grave retrocesso no regime democrático-constitucional que representa a aprovação no passado dia 24 de Abril de uma nova lei dos partidos e de uma nova lei sobre o seu financiamento, leis antidemocráticas que consagram respectivamente uma inadmissível ingerência do Estado na vida e organização internas dos partidos (procurando atingir de forma especial o PCP) e inaceitáveis limitações ao livre desenvolvimento da sua actividade e iniciativas.

O Comité Central tem sublinhado que o facto de o PS não ter votado favoravelmente a lei do financiamento dos partidos (o que se ficou a dever exclusivamente à repentina decisão do PSD de diferir para 2005 o reforço das subvenções estatais aos partidos) não pode fazer esquecer e em nada disfarçar que todo o processo de elaboração destas duas leis foi marcado por uma intensa convergência, no plano das concepções de fundo e dos propósitos, entre o PS, PSD e PP.

Reafirmando a profunda vinculação do PCP ao princípio de só aos militantes de um partido poder pertencer a soberania de decisão sobre as suas formas de organização interna, direito que os militantes do PCP não abdicam, e sublinhando o caracter intolerável de absurdas e excessivas limitações, em termos de natureza financeira, ao livre desenvolvimento da acção dos partidos, o Comité Central do PCP enuncia a firme disposição de continuar a lutar contra a entrada em vigor e a aplicação destas duas leis, sustentando que, dada a sua gravidade e consequências e a flagrante contradição com os princípios constitucionais, se justificaria plenamente que o Presidente da República requeresse a apreciação preventiva da sua constitucionalidade.

O Comité Central adverte ainda para a necessidade de, se desenvolver um firme e decidido combate aos novos e perigosos passos na alegada «reforma do sistema político» já anunciados pelo PS e pelo PSD, designadamente em torno de alterações de sentido antidemocrático às leis eleitorais para as autarquias locais e para a Assembleia da República.

3. O Comité Central põe uma vez mais em evidência os objectivos de rapina, conquista e hegemonia mundial inerentes à guerra de agressão imperialista contra o Iraque e exige o imediato fim da repressão da resistência popular e a retirada das forças de ocupação, que seja assegurado ao povo iraquiano o direito a decidir do seu próprio destino. O imperialismo, e em primeiro lugar os EUA, não só pretende redesenhar o mapa político do Médio Oriente à medida dos seus interesses, como pretende destruir a ordem jurídica e institucional saída da Segunda Guerra Mundial e instaurar uma “nova ordem” totalitária, hegemonizada pelos EUA, contra os trabalhadores e contra os povos. É este o caminho - com crescentes ataques à democracia e à soberania dos povos - que os sectores mais reaccionários e agressivos procuram trilhar para fazer face à crise manifesta do sistema capitalista, intensificar a exploração e suster a luta dos trabalhadores e dos povos, luta de que as poderosas manifestações contra a guerra que tiveram lugar no nosso país e por todo o mundo, são uma magnífica expressão.

É necessário chamar a atenção para as tentativas de legitimação da ocupação do Iraque e denunciar uma vez mais a vergonhosa política “atlantista” de subserviência aos EUA praticada pelo governo do PSD/CDS-PP, de que a “cimeira de guerra” das Lages foi expressão particularmente grave e manifesta a sua firme oposição ao envio de forças militares e policiais portuguesas para o Iraque que constituiria um gravíssimo precedente ao envolver Portugal na ocupação e pilhagem deste país. São inaceitáveis e arrogantes em relação ao Presidente da República as declarações do Primeiro-Ministro, que admitiu hoje que Portugal poderá enviar Forças portuguesas para o Iraque sem um mandato internacional contrariando assim a posição da Presidência. Mais uma vez o Primeiro-Ministro no seu afã de mostrar serviço ao império não se coíbe de publicamente dar mais um passo no confronto institucional e no desrespeito ao Presidente da República.

4. A realização do Fórum Social Português no próximo mês, nos trabalhos preparatórios dos quais o PCP e a JCP participam desde inicio, constituirá um importante momento de encontro de um largo conjunto de organizações e movimentos de massas e sociais que se posicionam, no respeito pela autonomia e a iniciativa de cada um e na diversidade de expressões e influência da cada uma, contra o neoliberalismo, o militarismo, a guerra, o racismo e a xenofobia. A realização do FSP pode constituir uma contribuição para ampliar a expressão da luta em Portugal contra a política de direita, contra o capitalismo e o imperialismo, para ampliar a consciência da necessidade da construção de uma nova sociedade.

5. O Comité Central tem apreciado os trabalhos de preparação da Conferência Nacional e realça que o debate realizado confirmou a importância para a elevação da qualidade do trabalho e da intervenção política do Partido, de uma adequada inserção do trabalho dos eleitos comunistas no quadro da acção e dos objectivos gerais do Partido e das suas organizações locais, da indispensável dinamização da iniciativa própria das organizações sobre os problemas locais, da igualmente necessária atenção a dar a par do acompanhamento e intervenção dos eleitos comunistas, à acção dos comunistas nas organizações populares e estruturas associativas, do aprofundamento das orientações para o desenvolvimento do trabalho nas autarquias e do conteúdo político da acção autárquica e do exercício do poder.

O Comité Central, valorizando o trabalho realizado na preparação da Conferência, mas reconhecendo as múltiplas tarefas e batalhas políticas a que o conjunto do Partido foi chamado nas últimas semanas e que objectivamente dificultaram a concentração das organizações no aprofundamento do debate, sublinha a importância do prosseguimento posterior em todas as organizações da discussão no sentido da concretização das orientações e linhas de trabalho a fixar pela Conferência.

Face às mais recentes decisões do Governo que afectam as autarquias o Comité Central do PCP denuncia as crescentes dificuldades financeiras a que a política orçamental vem impondo ao poder local entre as quais avultam as restrições ao crédito e a recusa de medidas de compensação imediatas pela perda de receitas resultantes das alterações à sisa bem como a operação de pretender com a aprovação da legislação sobre comunidades urbanas e intermunicipais, falsamente apresentadas como as medidas da descentralização que a organização administrativa reclama, amortecer a reclamação pela criação das regiões administrativas ou até mesmo adiá-la para sempre.

6. O Comité Central, na actual situação caracterizada por perigos e ameaças e por uma acrescida importância da luta por uma política alternativa para Portugal e por um mundo mais justo, aponta como direcções de trabalho para a acção partidária nos próximos meses:

- O contributo para o desenvolvimento da luta de massas de combate à política do Governo PSD/CDS-PP, contra o pacote laboral, por uma segurança social pública para todos, pela defesa dos serviços públicos, contra o processo de privatizações, por uma escola pública, gratuita e de qualidade, contra a degradação do ensino superior, as propinas e o seu aumento, pela defesa do serviço nacional de saúde, pelo aumento dos salários, contra o aumento dos preços e o desemprego, promovendo a convergência das lutas, acentuando o desgaste do Governo e evidenciando a necessidade de uma política alternativa.

- O aprofundamento do conhecimento da realidade do país e afirmação de uma política alternativa, em torno da dinamização da acção “Em Movimento por um Portugal com Futuro” com destaque para a acção “Mil localidades: participação e desenvolvimento” que o PCP vai promover entre Maio (arranque dia 25 de Maio na Sertã com as Jornadas da Zona do Pinhal) e Outubro com iniciativas em mais de mil localidades do país afirmando e mostrando que é necessário e possível um desenvolvimento equilibrado e sustentável, que Portugal pode ser um país mais desenvolvido e mais justo com uma política alternativa e a participação popular.

- A acção em torno das questões europeias e pela defesa da soberania e dos interesses nacionais.

- O trabalho na Assembleia da República destacando-se a interpelação ao Governo sobre política económica e social e acção no Parlamento Europeu em ligação com a realidade nacional.

- O prosseguimento da concretização da linha geral de reforço do Partido “Sim, é possível! Um PCP mais forte” designadamente o estímulo à iniciativa das organizações, a responsabilização de mais quadros, o aumento da militância, o alargamento do número de camaradas com responsabilidades regulares, o rejuvenescimento de organismos, a actualização do levantamento das organizações de base, a realização das assembleias das organizações, a realização de plenários regulares (de preferência mensais), a organização e intervenção nas empresas prioritárias e o reforço dos meios financeiros próprios com destaque para a valorização e pagamento regular das quotizações.

O Comité Central destaca em particular a importância da intensificação da campanha de recrutamento de 2000 novos militantes e a sua integração na vida partidária, que decorre até à próxima “Festa do Avante” e as medidas para uma forte dinamização da acção geral de contacto com os membros do Partido para actualizar contactos, esclarecer situações e elevar a participação na vida partidária, designadamente alargando o número de equipas, distribuindo contactos, definindo prazos e metas, intensificando o ritmo e a amplitude dos contactos.

O Comité Central exorta todas as organizações a consolidar e a prosseguir a tarefa de difusão do “Avante!”.

A concretização da nova modalidade da edição electrónica do “Avante” disponível no endereço www.avante.pt e a valorização de “O Militante”, revista do Partido que agora se apresenta com o subtítulo “PCP – reflexão e prática”, são outros aspectos importantes na dinamização da imprensa partidária.

7. O Comité Central sublinha a importância da Festa da Alegria, em Braga, marcada para os dias 26 e 27 de Julho e apela às organizações e militantes para se empenharem na preparação da Festa do Avante marcada para 5, 6 e 7 de Setembro, de modo a garantir o êxito desta realização político cultural ímpar no nosso país.