Comunicado do Comité Central do PCP
30 de Março de 1999

 

1. O Comité Central destaca como traços muito relevantes na situação política nacional: 2. O Comité Central do PCP atribuiu uma grande significado à luta que tem sido desenvolvida pelos trabalhadores e pela CGTP contra o pacote laboral.

A manifestação do dia 25 de Março em Lisboa, precedida de largas dezenas de greves e paralisações, constitui uma das maiores acções de massas da última década, revelando assim os sentimentos de repúdio e o grau de combatividade dos trabalhadores face à persistência do Governo em levar por diante graves alterações às leis laborais.

Persistindo na tentativa de concretização dos compromissos com as confederações patronais, o governo agendou para dia 7 de Abril uma das peças mais graves do pacote laboral: a proposta de lei do trabalho a tempo parcial. O Comité Central apela a todos os militantes do Partido, aos trabalhadores e às suas organizações para continuar a luta, reafirmando a exigência do abandono do pacote laboral, por uma política social diferente de respeito e valorização dos salários e dos direitos dos trabalhadores.

3. Após três anos e meio de actuação o Governo persiste em levar às últimas consequências a liquidação do sector público. Acaba de lançar uma nova fase de privatizações que entre outros aspectos integra o propósito de promover a privatização de mais uma fatia da Portugal Telecom reduzindo o capital do Estado a um nível residual, da alienação de partes do capital da EDP, da Galp-SGPS — holding do gás e dos petróleos — e das celuloses conduzindo à passagem da maioria do capital das empresas destes sectores para os grupos privados e da privatização de novas áreas da Administração Pública.

O governo PS levou mais longe que qualquer outro a entrega do património público num escandaloso processo de privatizações, com graves problemas para o país, um processo que deu aos grupos económicos e financeiros e às multinacionais um poder sobre a economia, a comunicação social e a vida nacional sem paralelo desde o 25 de Abril.

A defesa dos interesses nacionais, de serviços públicos de qualidade, dos direitos e interesses dos trabalhadores e das populações, da democracia e do desenvolvimento do país, colocam a interrupção do processo de privatizações e a garantia de um sector público forte e dinâmico, como um imperativo essencial e inadiável.

4. Na área da justiça, são muito preocupantes os sinais de crise político-institucional que, a não serem rapidamente debelados, desacreditam cada vez mais a justiça aos olhos dos cidadãos e constituem factores de bloqueio do normal funcionamento das instituições.

Estes acontecimentos somam-se, de resto, a uma intolerável passividade do Governo ao longo dos anos que tem feito com que se acumulem factores de descrédito, morosidade e ineficiência, dificuldades de acesso à justiça das classes e camadas mais desfavorecidas, bem como a incapacidade ou falta de vontade política para enfrentar a corrupção e a criminalidade mais sofisticada.

Na actual situação são altamente perniciosos quer os posicionamentos de cariz corporativo quer, sobretudo, o envolvimento de magistrados e magistraturas, ou de outros protagonistas do sector da justiça, em estratégia a que não são alheios propósitos inconfessados, que objectivamente põem em causa a independência dos tribunais e enfraquecem o poder judicial.

Do jogo de interesses mais ou menos nebulosos que se movem e procuram instrumentalizar e condicionar pessoas e instituições, fica claro que o objectivo prosseguido é a manutenção do quadro de impunidade existente no que toca à corrupção e ao crime organizado que minam os fundamentos do Estado de direito democrático.

É necessário que sejam rapidamente atenuados e superados factores de conflitualidade no sector da justiça, e encontrados, com debate sereno, os consensos e as soluções que se mostrem necessárias ao reforço do poder judicial e da sua independência, em ordem à realização da justiça e à defesa da democracia.

5. Apreciando os resultados das negociações da Agenda 2000, o Comité Central sublinha que a barreira de propaganda ao Governo não deverá fazer esquecer os magros resultados obtidos.

É razoável o ter-se conseguido a manutenção global do nível de transferências que o País vinha recebendo, quando a proposta inicial da Comissão apontava para uma redução de cerca de 500 milhões de contos no período de sete anos que se inicia no ano 2000. Mas é mau que o volume de fundos estruturais possa vir a ser reduzido através de mecanismos condicionadores da sua transferência. Como, fundamentalmente, é mau que o volume global de transferência seja incapaz de responder às necessidades do País, com a concretização a prazo do processo de alargamento, a liberalização anunciada do comércio pelas próprias negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) e as políticas monetária e orçamental (Pacto de Estabilidade) decorrentes da Moeda Única. As mais que previsíveis restrições orçamentais – a pesarem e impulsionarem reclamadas reformas de cariz neoliberal da segurança social, saúde, administração pública – e o agravamento da concorrência no mercado nacional e comunitário, exigiriam não os mesmos, mas mais fundos.

Sobre a reforma da Política Agrícola Comum (PAC), para lá dos resultados globais e sectoriais negativos, obtidos no Conselho de Ministros da Agricultura e já analisados, há agora de concreto a duplicação do trigo duro, o que é positivo, e (através de um dito acordo de cavalheiros) a não redução da quota de tomate.

Mas, na questão central da PAC, o que o Governo (e bem como, aliás, as principais organizações de agricultores e o PCP) inscrevia como principal objectivo da sua estratégia – o reequilíbrio financeiro entre agricultores, culturas e países – foi derrotada. Foram eliminadas, inclusive, as tímidas propostas de plafonamento que o documento inicial da Agenda 2000 continha.

Sobre o proclamado reforço de verbas para o Desenvolvimento Rural, ver-se-á o seu significado e importância, quando for clarificado o seu âmbito e contrapartida financeira.

O PCP, que desde o primeiro momento denunciou e rejeitou as propostas inscritas na Agenda 2000 como altamente gravosas para o País, que travou ao longo destes dois anos um persistente combate por mais fundos e por uma verdadeira reforma da PAC, na Assembleia da República, no Parlamento Europeu, e no esclarecimento e mobilização do povo e dos agricultores portugueses, considera que sem prejuízo de um conhecimento mais preciso do que foi aprovado em Berlim, os resultados não correspondem à propaganda do Governo.

O PCP não desistirá de travar o combate pela defesa dos interesses nacionais, enquanto exigirá que a larga margem de manobra que o Governo dispõe, seja utilizada para uma mais eficaz, justa e equitativa aplicação dos fundos, na correcção das assimetrias regionais e sociais, no desenvolvimento e modernização da estrutura produtiva portuguesa.

6. O Comité Central reitera a firme condenação pelo PCP da agressão da NATO contra a Jugoslávia e do submisso envolvimento das Forças Armadas portuguesas em acções de guerra que violam princípios básicos do direito internacional, causam elas próprias uma catástrofe humanitária e só podem agravar os complexos problemas existentes nos Balcãs.

Sem esquecer a anterior participação nas operações militares da NATO na Bósnia, adquire entretanto um grave significado político que tenha sido por decisão de um Governo do PS que, pela primeira vez nos 25 anos decorridos desde o 25 de Abril, militares portugueses foram directamente envolvidos na agressão a um Estado soberano do Continente europeu.

E adquire também um enorme significado político que, 54 anos depois do fim da 2ª Guerra Mundial, a guerra entre Estados tenha voltado à Europa precisamente na altura em que 13 dos 15 países da União Europeia são governados por partidos socialistas que, mais uma vez, se comportaram como os mais esmerados e obedientes servos da Administração norte-americana.

Apelando ao desenvolvimento de um vasto movimento de opinião e protesto nacional contra esta agressão da NATO, o PCP insiste na reclamação dirigida ao Presidente da República e ao Primeiro-Ministro, do fim da participação portuguesa nesta acção militar da NATO e de uma intervenção das autoridades nacionais no sentido do termo da agressão armada à Jugoslávia e da procura persistente de uma solução política no quadro do respeito pela integridade territorial e soberania da Jugoslávia.

7. Tendo debatido as tarefas imediatas do Partido, o Comité Central sublinha a necessidade de prosseguir e intensificar as linhas de intervenção e orientação que nos últimos meses asseguraram uma intensa, dinâmica e diversificada actividade do PCP que, apesar de sujeita a uma forte barreira de silêncio e discriminação em muitos órgãos de comunicação social, representaram uma prestigiante afirmação do PCP com positiva apreciação por parte de largos sectores da população.

Entre muitos outros aspectos, são de destacar as centenas de iniciativas de comemoração do 78º aniversário do Partido e a realização de inúmeras Assembleias de Organização, com o envolvimento de muitos milhares de membros do Partido; uma intensa e combativa intervenção sobre as principais questões e problemas da actualidade política; as acções de esclarecimento realizadas em todo o país e especialmente dirigidas aos trabalhadores e aos agricultores; o arranque da Campanha Nacional de Fundos para reunir os meios materiais indispensáveis a uma activa intervenção eleitoral da CDU; o promissor lançamento da candidatura da CDU ao Parlamento Europeu; a acção desenvolvida pelos deputados do PCP no Parlamento Europeu (os únicos deputados portugueses que se bateram pela indispensável demissão da Comissão Europeia) e do grupo Parlamentar do PCP que desenvolveu uma enérgica acção fiscalizadora do Governo e conseguiu fazer aprovar mais propostas suas de inegável valor e positivas consequências.

O Comité Central saúda a JCP pelo êxito do seu VI Congresso, realização que evidenciou a força e as potencialidades da juventude comunista e dos ideais que suportam a sua intervenção. O Congresso dos jovens comunistas constitui uma clara confirmação do papel desempenhado e a desempenhar pela JCP na defesa dos direitos da juventude e na luta por uma política de esquerda que inicie a resolução dos problemas da juventude.

Prosseguindo a dinâmica de reforço da organização partidária, como elemento de maior importância para a intervenção do Partido e a par de uma forte contribuição para o êxito das comemorações do 25º aniversário do 25 de Abril e da jornada do 1º de Maio, é essencial que: 8. As eleições para o Parlamento Europeu, a partir de agora uma tarefa política prioritária, representam a possibilidade real de dar mais força ao PCP e à CDU para uma efectiva viragem à esquerda na política portuguesa e para um novo rumo na construção europeia que assegure a defesa de um Portugal democrático independente e soberano numa Europa assente na cooperação entre povos e países iguais em direitos. É por isso indispensável:

O Comité Central sublinha a importância do Encontro Nacional do PCP sobre as Eleições de 1999 a realizar, em Lisboa, em 10 de Abril, que deverá favorecer uma mais ampla agregação das energias e capacidades do colectivo partidário para a batalha eleitoral e reforçar a sua determinação e confiança na obtenção de um bom resultado para a CDU.

9. O Comité Central alerta para a necessidade de prosseguir o combate às manobras mistificatórias de propaganda e fomento de uma alegada "bipolarização" entre o PS e a direita que, tendo perdido a carta do pretenso «confronto AD-PS", pretendem agora ressuscitar artificialmente a carta do pretenso «confronto PSD-PS». A verdade é que, se já com a AD e mesmo como o benefício que o método de Hondt poderia dar à votação conjunta dos partidos que a integravam, a direita não tinha, nas legislativas, qualquer possibilidade realista de alcançar uma vitória eleitoral, extinta agora a AD e com o PSD e PP a concorrerem separadamente, mais claro se torna ainda que o único grande elemento de novidade e mudança que as eleições podem trazer é o reforço da CDU e uma alteração a seu favor na correlação de forças com o PS.

O Comité Central salienta que é por demais significativo e elucidativo que os principais promotores e propagandistas da "bipolarização", ontem entre AD e PS e agora entre PSD e PS, não se ocupem nem sejam capazes de explicar quais as grandes diferenças entre a política defendida pelo PSD e a seguida pelo Governo PS.

Torna-se assim claro que, por detrás da propaganda de "bipolarização" entre PS e PSD, o que se esconde ainda e sempre é o propósito de animar um mero confronto de personalidades e de etiquetas como melhor forma de salvar a política de direita que lhes é comum.

E torna-se também claro que o preconceito e a discriminação contra o PCP o que escondem é sobretudo a consciência de que o PCP é, de entre os principais partidos, o único que, pela sua influência, intervenção e propostas, verdadeiramente incomoda e ameaça a política de direita e os interesses que ela serve.

10. A patente degradação da vida política e da escandalosa instrumentalização do aparelho de Estado pelo Governo do PS, as injustiças e desigualdades sociais geradas pelo prosseguimento de uma política enfeudada ao grande capital e nas suas opções fundamentais semelhante à antes praticada pelo PSD, a abdicação servil da defesa dos interesses e da soberania nacionais, acentuam o carácter indispensável e insubstituível de uma vigorosa, quotidiana e determinada iniciativa e contribuição dos comunistas portugueses quer no terreno do fortalecimento das lutas e dos movimentos sociais, quer na sua combativa e construtiva intervenção nas instituições, quer através de uma dinâmica e mobilizadora campanha de esclarecimento nos dois próximos actos eleitorais.

Neste ano em que se celebram os 25 anos passados sobre a Revolução de Abril e também a modernidade e actualidade dos seus valores, o vasto património de propostas, de intervenção, de luta e de resultados conseguidos pelo PCP como oposição firme de esquerda ao Governo do PS, justificam a nossa confiança e convicção de que, não ignorando dificuldades e obstáculos conhecidos, existem condições para que se alargue e fortaleça a consciência de que há um outro e melhor caminho para Portugal.

Um outro caminho alicerçado na dignificação do trabalho e no respeito por quem trabalha, na valorização de uma cidadania activa, na construção de uma democracia plena, simultaneamente política, económica, social e cultural.

Com o indispensável fortalecimento do PCP e da CDU e do projecto e dos valores que afirmam a nossa diferença na vida política, fundados em padrões de seriedade, coerência, firmeza de convicções, respeito dos compromissos assumidos.

Com a convicta afirmação dos ideais e projecto comunistas de transformação social, com confiança na luta por uma sociedade e um mundo mais justos.