Reforça os direitos da Liga dos Bombeiros Portugueses
Intervenção do Deputado Rodeia Machado
3 de Outubro de 2002

 

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Quero começar por saudar o Conselho Executivo da Liga dos Bombeiros Portugueses, que esta presente nas galerias assistir a este debate.

É conhecido de todos, mas nunca é demais relembrar, que a criação do voluntariado em bombeiros, e o desenvolvimento da sua acção tem mais de seiscentos anos de existência em Portugal.

Nasceu da necessidade de protecção contra incêndios em Lisboa, e ao longo dos séculos, mais acentuadamente nos dois últimos, estendeu a sua acção a todo o território nacional, passando da vertente de combate a incêndios, para as áreas da protecção civil, de apoio às populações contra as calamidades naturais, inundações, incêndios urbanos e florestais, acidentes rodoviários, doenças súbitas e transporte de doentes em ambulâncias.

Resumidamente, pode afirmar-se que, o universo das acções de socorro confiadas aos bombeiros constituem hoje, uma imensidão de tarefas no seu dia a dia, que só a sua dedicação e o espírito de voluntariado consegue ultrapassar..

A preocupação, primeira há seiscentos anos eram os incêndios urbanos, numa zona de Lisboa, e foi por isso que o voluntariado em bombeiros, deu os primeiros presos.

Com o evoluir dos tempos, foram aparecendo um pouco por todo o território nacional, pequenas estruturas de bombeiros, criadas por um punhado de homens de boa vontade, que em estrito regime de voluntariado e ancoradas em Associações Humanitárias, começaram por desenvolver a sua acção.

À medida que a sociedade foi evoluindo e que as necessidades das populações foram transferidas de patamar, também a exigência para com os Bombeiros e dos Bombeiros foram crescendo de forma exponencial.

Surgiram então várias necessidades, tendo à cabeça a questão da formação do pessoal e do seu equipamento no sentido de por um lado melhorar as questões de segurança quer para os Bombeiros, quer na segurança das populações abrangidas.

A par destas preocupações, surgiram outras de não menor importância, ou seja, a da organização das estruturas locais, regionais , mas também nacional.

É então que surge, em 1920, a criação de uma estrutura nacional, que congregue no seu seio todas as Associações e Corpos de Bombeiros, que os represente e lhe dê voz com base nas suas necessidades e nas suas justas aspirações, ao serviço da causa e do bem comum, ou seja ao serviço das populações.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

A Liga dos Bombeiros Portugueses congrega hoje na sua estrutura central 484 Associações e Corpos de Bombeiros no Continente e Regiões Autónomas dos Açores e Madeira, sendo que 468 são de raiz Associativa e voluntária e as restantes são Sapadores, Municipais e privativos e dispõe de uma estrutura descentralizada assente em Federações de Bombeiros, em todos os Distritos e Regiões Autónomas.

No conjunto, são cerca de 40.000 os homens e mulheres que, voluntariamente, com farda e sem farda, servem com dedicação e empenho as populações e prestam apoio da mais variada índole às comunidades onde se inserem. A sua divisa “Vida por Vida”, não é uma frase de circunstância, é algo de profundo que todos sentem, e por isso desde sempre colocaram a sua vida ao serviço da comunidade e, em muitos casos, deram a sua vida, para salvar outras vidas.

A História é disso testemunha.

Mas relembrar a sua história é fixar no presente com base também no passado, as bases seguras para o futuro.

Mas relembrar a sua história, é também falar das suas aspirações e das suas dificuldades e é isso que de seguida faremos.

Como é sabido a estrutura local de bombeiros, assenta essencialmente a sua actividade nas Associações Humanitárias que juridicamente sustentam um corpo de bombeiros de raiz voluntária e que, regra geral, não têm condições económico financeiras próprias para sustentar as actividades que promovem.

Fazem autenticas ginásticas de tesouraria para manter toda a actividade que em cada ano se propõem.

Só a grande dedicação do voluntariado mantém ainda vivas e actuante grande parte das estruturas de Bombeiros, em Portugal.

Pode-se afirmar que, com raras excepções as direcções dos bombeiros voluntários e os comandos dos corpos de bombeiros, não conhecem antecipadamente e em cada ano quando da elaboração do orçamento e plano de actividades onde poderão arrecadar receitas para cumprir o que propõem.

Com efeito as excepções, advém da quotização dos seus associados e das parcerias protocoladas que mantém com as Câmaras Municipais.

Não se compreende, nem se aceita que as verbas contempladas no Orçamento de Estado, ainda que bastante insuficientes, não sejam conhecidas atempadamente pelas associações.

Sem querer aprofundar hoje e aqui as questões do apoio financeiro por parte do Estado convém, no entanto, esclarecer que as verbas são manifestamente insuficientes, para quem se substitui ao Estado nesta importante tarefa de socorro prestado ás populações.

Só como exemplo, diremos, que o apoio financeiro directo às associações através do orçamento de Estado, ou seja, às 468 Associações de raiz voluntária, é inferior à dotação financeira da Câmara Municipal de Lisboa para o Regimento de Sapadores Bombeiros.

Daqui se pode aquilatar, quanto seria necessário dispender no Orçamento de Estado para suportar uma estrutura de idênticas dimensões, mas de carácter profissionalizado.

A importância do voluntariado e do socorrismo confiado a Bombeiros, atinge pois uma importância fundamental para as populações, que importa reconhecer, mas também acarinhar.

Os bombeiros em Portugal são, sem sombra de dúvidas, das mais velhas instituições de solidariedade humanas, e por isso merecem da parte do povo anónimo, as mais altas expressões de carinho e simpatia e hoje a Assembleia da República, tem oportunidade também de fixar em letra de lei através do reforço dos direitos da Liga dos Bombeiros Portugueses a expressão desse reconhecimento.

A estrutura, Liga dos Bombeiros Portugueses, representa hoje, como através se afirma um universo de homens e mulheres em acções de voluntariado indispensável na sociedade portuguesa e é credora de todo o apoio que a sociedade lhe possa prestar.

E se hoje já é reconhecida, como parceira de facto, dada a sua actividade, em prol da comunidade, o que este projecto de lei do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português pretende é que a Liga dos Bombeiros Portugueses seja reconhecida, como parceira de direito, e que, para além de outras competências que já detém lhe seja reconhecido o direito de ser ouvida na elaboração dos Planos e Programas em que seja parte interessada.

O reconhecimento do Estatuto de Parceiro Social, dá-lhe também o direito a consultas prévias, pelos órgãos de soberania, sobre todas as iniciativas legislativas respeitantes a matérias do seu interesse.

O direito a tempo de antena na rádio e na televisão, e nos mesmos termos das Associações Profissionais, é em nosso entender, outro normativo importante para o esclarecimento da actividade dos Bombeiros.

O apoio do Estado para a prossecução dos seus fins, a par do dever de colaboração entre o Governo e a Liga são fundamentais para uma verdadeira política de desenvolvimento da actividade do Socorrismo confiado aos Bombeiros.

Com este projecto-lei, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, pretende tão só e simplesmente que a Assembleia da República reconheça na lei, aquilo que são as justas aspirações dos Bombeiros Portugueses, ou seja, reconheça no direito, o que na prática já é reconhecido, que a Liga dos Bombeiros Portugueses é um parceiro indispensável nas áreas da protecção civil e do socorrismo.

Pela nossa parte, desde há muito o reconhecemos, e esperamos, que os outros Grupos Parlamentares aceitem a nossa proposta e votem favoravelmente o Projecto de Lei do Partido Comunista Português.

Disse.

(…)

Sr. Deputado Fernando Cabral,

Penso que não percebeu a profundidade que colocámos neste projecto de lei.

De facto, e passo a redundância, a Liga dos Bombeiros Portugueses já é reconhecida «de facto», mas não é «de direito», como parceiro social.

Daí que quando colocamos a questão constatamos que ela é ouvida nalgumas matérias, mas não o é obrigatoriamente. Aliás, há algumas leis que foram feitas à margem dos bombeiros, apesar de terem uma particular incidência sobre os bombeiros, que deveriam ter sido ouvidos sobre essas matérias e não foram.

Efectivamente, aquilo que pretendemos é que, em letra de lei, a Liga dos Bombeiros Portugueses seja reconhecida como parceiro social para ser ouvida a priori, e não a posteriori, sobre a feitura de leis que lhe digam respeito.

Sr. Deputado Fernando Cabral, gostaria de dizer-lhe, também, que a Liga dos Bombeiros Portugueses tem hoje uma actividade extraordinariamente diversificada nas áreas de protecção e socorro em Portugal. É uma panóplia de actividades extremamente importantes, sendo que hoje os bombeiros portugueses são naturalmente os primeiros agentes da protecção civil em Portugal.

Como sabe, também na área da protecção civil ficam muito aquém, não pertencendo a várias estruturas nacionais da protecção civil, porque quem tem assento na protecção civil são os organismos do Estado: o Serviço Nacional de Protecção Civil e o próprio Serviço Nacional de Bombeiros, que são organismos do Estado e não de uma confederação desta grandeza como é a Liga dos Bombeiros Portugueses.

Naturalmente que na Lei de Protecção Civil e nas outras, haverá que fazer alguma inflexão quando forem tidas em linha de conta a experiência e a capacidade de intervenção por todos reconhecidas da Liga dos Bombeiros Portugueses.

Quanto ao direito de antena, não é bem assim como o Sr. Deputado disse e quando colocamos o direito de antena neste normativo é, exactamente, para obrigar a que seja ouvida directamente, na rádio, na televisão, com direito próprio, a Liga dos Bombeiros Portugueses, que, como sabe, e como eu disse da tribuna, tem hoje 40 000 homens e mulheres com uma acção extremamente dedicada.

É, pois, importante que também ela tenha capacidade de intervenção junto das pessoas. E esta capacidade de intervenção é a capacidade de ser ouvida (e não de dizer, porque essa tem, certamente!) pelas pessoas, pela população portuguesa, para quem a actividade da Liga dos Bombeiros Portugueses se dirige.

Foi, pois, nesse sentido, Sr. Deputado Fernando Cabral, que elaborámos este projecto de lei com toda a profundidade, reconhecendo no Direito o que de facto e na prática já é reconhecido aos bombeiros.

(…)

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados

Há aqui um enorme equívoco da parte das bancadas do Partido Social-Democrata e do CDS-PP.

E do PS também, mas já lá vamos ao PS!

Aquilo que está dito no projecto de lei é que reforça os direitos da Liga dos Bombeiros Portugueses. Repito: reforça os direitos, Srs. Deputados! Não tiveram em conta isso. Este projecto de lei é para reforçar os direitos e não para tirá-los. Aquilo que os senhores querem é tirar direitos à Liga dos Bombeiros Portugueses não aprovando este projecto de lei. Da vossa parte há uma enorme hipocrisia em relação a esta matéria — são as chamadas lágrimas de crocodilo!

Dizem bem da Liga dos Bombeiros Portugueses, dizem bem dos bombeiros em Portugal, mas quando se trata de lhes dar direitos na prática, de os colocar em letra de lei, fogem à vossa responsabilidade.

A Sr.ª Deputada do PSD Aurora Vieira diz que a Liga dos Bombeiros Portugueses é uma associação privada. Claro que é e ninguém diz o contrário, mas a Confederação dos Agricultores Portugueses, por exemplo, é uma associação pública que está como parceiro social. Qualquer outra entidade que seja parceiro social é uma associação pública ou privada? São confederações. Ora, o que nós pretendemos é que a confederação Liga dos Bombeiros Portugueses seja parceiro social «de direito» porque já o é «de facto»!

Gostava ainda de dizer que não bastam palavras bonitas em relação ao bombeiros. Os bombeiros querem actos e querem que se lhes reconheçam o seu mérito e a sua capacidade de intervenção, o que todos reconheceram nesta Câmara — o Partido Socialista também! Curiosamente, não percebi a intervenção do PS sobre esta matéria quando avança em alguns aspectos e recua noutros.

Penso que o reconhecimento da Liga dos Bombeiros Portugueses, em cada momento, não pode ser feita ad hoc por qualquer governo. Tem de estar em letra de lei porque não pode ser uma cortesia de qualquer governo reconhecerem-na como parceiro de facto, têm de reconhecê-la como parceiro de direito. É porque, assim, qualquer governo, a qualquer momento, pode retirar essa cortesia e não ligar nenhuma à Liga dos Bombeiros Portugueses.

O que queremos é que esteja em letra de lei e para isso é preciso que cada um assuma as suas responsabilidades.

Fica, aqui, hoje, nesta Casa, nesta Assembleia, o que é reconhecido pela população portuguesa, mas que os Srs. Deputados do PS, do PSD e do CDS-PP não querem reconhecer: a justiça que deve ser feita à Liga dos Bombeiros Portugueses e aos bombeiros em Portugal.

(…)

Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Aurora Vieira,

Gostava de lhe colocar algumas questões.

V. Ex.ª pensa que o PCP, com este projecto de lei que trouxe à Assembleia da República, não ouviu devidamente as estruturas dos bombeiros acerca desta matéria.

Desde há muito que as ouvimos e desde há muito que sabemos que os bombeiros querem efectivamente ser parceiros sociais quando já são reconhecidos como parceiros de facto pelos vários governos e pelas várias entidades.

Mas o problema aqui é muito mais vasto e gostaria de perguntar concretamente à Sr.ª Deputada o que quer dizer quando afirma que está nos estatutos dos bombeiros. Significa que está como parceiro social? É reconhecido de direito? É isso? Não é, Sr.ª Deputada! Nos Estatutos da Liga estão os seus direitos e os seus deveres enquanto confederação de associações de bombeiros de e para os bombeiros. O problema aqui é totalmente diferente: é a responsabilidade do Estado para com os bombeiros.

É essa a questão dos parceiros sociais.

V. Ex.ª ou não entendeu ou não quer entender! Mas eu bem percebo: o problema é que V. Ex.ª e o CDS-PP suportam o Governo e criando um parceiro social têm receio de lhes vir a dar mais direitos do que aqueles que VV. Ex.as lhes querem dar na prática.

Esse é que é o problema e estamos todos esclarecidos em relação a essa situação.

Gostava ainda que me dissesse o que pensa dos bombeiros em Portugal e o que pensa para o futuro nomeadamente numa situação desta natureza: a Liga dos Bombeiros Portugueses representa mais de 40 000 homens e mulheres; se eles não existissem quanto é que representava para o Orçamento do Estado uma situação de profissionalização? Eu posso dizer-lhe: entre 130 e 140 milhões de contos anuais, quando o Governo no Orçamento do Estado — e isso até já se verificava no governo de Cavaco Silva — dispõe de pouco mais de 13 milhões de contos.