Intervenção de Carlos Carvalhas, Secretário-Geral

Abertura da Campanha Nacional do PCP «Melhores salários, emprego com direitos, mais valor no trabalho»

No nosso país como é sabido, são no essencial os trabalhadores por conta de outrém que pagam os impostos e como em toda a parte são os trabalhadores que criam a riqueza.

Fará então sentido que estes fiquem à margem do progresso económico?

Temos o mais baixo salário mínimo e dos salários médios mais baixos da União Europeia, mas paralelamente temos um grau de concentração de riqueza que está no "top" do conjunto destes países.

Pertencemos ao país da União Europeia em que é maior o fosso entre os 10% mais ricos e os 10% mais pobres. E tudo isto, com um governo do Partido Socialista, que ainda tem o despudor de afirmar que governa com sensibilidade social.

As injustiças sociais e salariais no nosso país são gritantes e inaceitáveis.

A luta pela dignificação de quem trabalha, pelo trabalho com direitos, pelo aumento dos salários e portanto pela melhoria da distribuição do Rendimento Nacional tem que estar na ordem do dia.

Por isso, o PCP decidiu lançar esta campanha estando certo que ela vai ao encontro do sentir dos trabalhadores, das suas Comissões e das suas "estruturas sindicais".

Mas esta nossa acção de dimensão nacional, pelos seus objectivos, tendo em conta os seus destinatários, sublinha também um estilo e uma forma de estar do PCP.

É uma campanha de contacto, diálogo e de debate com os trabalhadores que visa essencialmente:

1º A valorização e a divulgação das propostas e projectos com que nos comprometemos na campanha eleitoral das legislativas;
2º A dinamização da luta e o estímulo para que os trabalhadores exerçam e façam valer os seus direitos;
3º Um apelo para que os trabalhadores reforcem este Partido que está com eles mas cuja força será tanto maior quanto mais estes o sentirem como seu.

Esta campanha realiza-se num quadro de crescente desencanto com a política do Governo e descontentamento social onde, para além de outras classes e camadas sociais, os trabalhadores se sentem injustiçados nos seus salários, nos seus direitos e na política fiscal.
Revelador deste sentimento foi a luta travada pelos trabalhadores da Administração Pública e dos transportes, a quem o Governo e as administrações das empresas por si tuteladas tentam impor, não a contenção dos salários, mas a sua desvalorização face aos aumentos que são propostos.

Será esta a aproximação dos salários dos trabalhadores portugueses à média dos salários da União Europeia que o Engenheiro Guterres recentemente anunciava?

Não deixa de ter um grande significado social a profunda compreensão dos utentes dos transportes públicos e da população de Lisboa para com a luta dos trabalhadores da Carris e do Metro, facto que também se verificou, recentemente, no Porto, com a greve dos trabalhadores dos STCP.

Mas a estes sectores devemos juntar as centenas de milhar de trabalhadores, em particular os milhares de jovens e mulheres que auferem o salário mínimo nacional, que continuam no fundo da tabela e bem longe da média da União Europeia.

Esta injusta distribuição do "Rendimento Nacional" é tanto mais inaceitável quando, por exemplo, no Orçamento do Estado para este ano, o Governo PS insiste nos benefícios e isenções para o grande capital, enquanto para os trabalhadores e as famílias de menores rendimentos continuarão a ser penalizados, designadamente a nível de IRS.

Permitam-me aqui um parêntesis e uma lembrança. Se este ano se estão a verificar ganhos como estão, e alguns com significado para os trabalhadores ao nível do IRS, isso deve-se à proposta feita pelo PCP durante a aprovação do Orçamento do Estado do ano passado.

A uma situação salarial e fiscal injusta e discriminatória há que considerar a situação do emprego e da precariedade que atinge crescentemente centenas de milhar de trabalhadores.

As próprias estatísticas do Instituto Nacional de Estatística, mesmo com critérios discutíveis e sem considerar o alastramento do sistema de trabalho clandestino, revelam que entre 1998 e 1999 a precariedade passou de 17,5 para 19%, com os contratos a prazo a terem a parte de leão.

Não deixa de ter significado, nas vésperas da Cimeira Europeia sobre o Emprego, e sob a égide da presidência portuguesa, que no documento apresentado pelo Governo PS não haja uma medida, uma palavra sequer, sobre o necessário combate à precariedade, resumindo tudo a um conjunto de floreados verbais e a uma vasta e inócua lista de declarações de intenções.

Mesmo naquilo que o Governo refere como uma medida estratégica, ou seja, o combate à saída precoce do mercado de trabalho, só pode ser entendida por aquelas dezenas de milhar de trabalhadores da PT, da CP e da TAP, da energia, da indústria naval ou da metalomecânica, forçados à rescisão ou à reforma antecipada, como um exercício de humor negro.

Inevitavelmente, estas opções do Governo conduzem a que hoje, em muitas empresas e locais de trabalho, exista um sentimento generalizado de impunidade face às violações e à falta efectivação dos direitos do trabalho. Por exemplo, a falta de regulamentação das normas das Comissões de Higiene e Segurança nos Locais de Trabalho torna-se um factor para o aumento da sinistralidade.

Sempre considerámos que os direitos dos trabalhadores são inseparáveis do progresso e do avanço civilizacional do ser humano.

Não nos limitamos a caracterizar e a denunciar.

Aquilo com que nos comprometemos na campanha eleitoral, cumprimos agora. Logo no início desta legislatura, os primeiros projectos-lei que apresentámos tinham um carácter de urgência social.

Propusemos um aumento mais justo do salário mínimo nacional, a redução da idade de reforma das mulheres e, ao contrário do que o Governo e o PP quiseram fazer crer sobre o aumento das reformas para os rurais, foi o PCP quem tomou a iniciativa em Novembro do ano passado, visando o aumento das pensões e reformas para todos, incluindo os rurais.

Mas a essas três medidas mais urgentes, anunciamos agora que o Grupo Parlamentar vai apresentar um outro conjunto de importantes projectos-lei de que enfatizo desde já o da redução progressiva do horário semanal de trabalho para as 35 horas.

Com sentido de responsabilidade, diferenciando as pequenas das grandes empresas, e tendo em conta os níveis de produtividade dos diversos países da União Europeia, considerando o desenvolvimento económico e valorizando a contratação colectiva, o PCP propõe esta medida de grande alcance social e civilizacional e que potencia a criação de mais emprego.

Uma outra proposta de grande actualidade será um projecto-lei sobre contratos a prazo. Partimos de uma ideia de fundo: a uma função permanente deve corresponder um posto de trabalho efectivo, salvaguardando as situações de excepcionalidade ocasional ou sazonal e eliminando a discriminação existente que se reflecte nos jovens à procura do 1º emprego e desempregados de longa duração. A precaridade é uma praga no nosso mundo do trabalho. Ainda hoje, trabalhadores com vínculo precário na Administração Pública, isto é, trabalhadores do Hospital de Vila Nova de Gaia, manifestaram-se contra esta situação.

Um outro projecto que, atingindo um universo menor de trabalhadores, visa repor a justiça nas situações gritantes de falência das empresas em que os trabalhadores estão anos e anos à espera dos créditos que lhes são devidos. Se os Tribunais se atrasam nos processos, então o fundo de garantia que permita aos trabalhadores a devida e atempada reparação e que deve sair dos cofres do Estado e, no caso concreto, da Justiça.

Apresentamos ainda outro projecto-lei, que atenda às situações de transferência e cedência de trabalhadores para empresas desmembradas, garantindo efectivamente a esses trabalhadores os direitos que detinham na empresa de origem.

Tomaremos uma outra iniciativa legislativa, que permita a actualização das pensões degradadas dos 40 mil reformados da Função Pública lesados quer pelo facto das pensões em vigor, antes do Novo Sistema Retributivo, estarem anexadas à da actualização dos vencimentos no activo, quer pelo facto de não terem sido consideradas ao nível das aposentações medidas de equiparação às próprias novas estruturas de carreira.

Considerámos, por último, o agendamento de uma interpelação ao Governo centrada nas questões da precariedade e da falta de aplicação e da efectivação das leis do trabalho, visando a intervenção da Assembleia da República e das instituições, no combate destas situações.

São estas as propostas que levamos aos trabalhadores. Propostas que terão tanto mais força e mais êxito quanto mais força e êxito tiver o seu envolvimento, a sua acção e a sua luta, já que serão elas que poderão influenciar a decisão do legislador.

Num quadro de justas inquietações e muitas incertezas e inseguranças nós, comunistas, temos uma profunda confiança nos trabalhadores, nas suas organizações, com tão bem o demonstraram quando se tratou de lutar pela defesa das pausas no horário de trabalho, na luta contra o pacote laboral, luta que teve resultados. Na altura, foi este Partido que se solidarizou, que teve iniciativa, quem correspondeu às suas aspirações e reivindicações. Fizemo-lo no passado recente e fazemo-lo hoje e no futuro, com a convicção que este Partido ganha mais força com a força e a consciência dos trabalhadores.

Nós não aceitamos esta situação. Não há nenhuma fatalidade em relação a esta política neoliberal.

Nós não nos resignaremos a que à beira do terceiro milénio sejam os mercados (leia-se a Bolsa e a Banca) a tutelarem a democracia, a política, os direitos dos trabalhadores e os direitos de cidadania.

Nós não aceitamos que o lucro e as actividades especulativas e parasitárias estejam antes do Homem.

Nós não aceitamos nem nos resignaremos a entrar no terceiro milénio com muitos dos direitos dos trabalhadores e dos direitos sociais em geral reconduzidos ao nível do início do século XX.

E por isso esta nossa iniciativa e reafirmamos que a luta continua com determinação e com confiança.

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